STJ Jun24 - Quebra de Sigilo Bancário Irregular - MP não Pode Impulsionar Diretamente a Receita Federal - Crimes Tributários : "Necessidade de Ordem Judicial - Divergência com o TEMA 990 do STF" - Provas Ilícitas
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
EMENTA PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. SOLICITAÇÃO DE DADOS FISCAIS PELO MP AO SEFAZ/RJ. MATÉRIA NÃO ABRANGIDA PELO TEMA 990/STF. PRECEDENTES DA 3ª SEÇÃO. 2. REQUISIÇÃO DE DADOS SIGILOSOS. AUSÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. CRÉDITO TRIBUTÁRIO NÃO CONSTITUÍDO. PROVAS ILÍCITAS. 3. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos em Habeas Corpus n. 83.233/SP e 83.447/SP, ambos de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, assentou que "a possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados sem autorização judicial ", em especial porque referida questão não foi tratada no Tema 990/STF. 2. No caso dos autos, o Ministério Público determinou à autoridade policial que instaurasse inquérito em 2013, momento em que o crédito tributário ainda estava sendo apurado em procedimento administrativo. A constituição definitiva do crédito tributário, segundo o acórdão recorrido, ocorreu apenas em 26/6/2018 e a representação fiscal para fins penais foi lavrada apenas em 2019, no entanto, as informações fiscais do recorrente já haviam sido encaminhadas ao órgão ministerial em momento anterior, em 2015, e por requisição. - Dessa forma, a solicitação de dados sigilosos pelo Ministério Público diretamente à Secretaria de Fazenda, antes mesmo da constituição definitiva do crédito tributário e da existência de representação fiscal para fins penais, revela ilegalidade que torna nulos referidos elementos de informação, os quais devem ser desentranhados dos autos. Devem ser igualmente desentranhadas as provas derivadas, determinando-se ao Magistrado de origem a aferição a respeito da existência de outras provas que autorizem a manutenção da ação penal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ - AgRg no RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 187765 - RJ (2023/0348535-1) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, Publicação no DJe/STJ nº 3887 de 17/06/2024)
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NO VOTO:
VOTO A insurgência não merece prosperar. Com efeito, conforme explicitado na decisão monocrática, o Supremo Tribunal Federal, em 4/12/2019, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP (Tema n. 990), fixou, em repercussão geral, as seguintes diretrizes:
1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil (RFB), que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional. 2. O compartilhamento pela UIF e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos em Habeas Corpus n. 83.233/SP e 83.447/SP, ambos de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, assentou que "a possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados sem autorização judicial", em especial porque referida questão não foi tratada no Tema n. 990/STF. A propósito, transcrevo as ementas dos referidos julgados:
PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. ESTELIONATO MAJORADO, FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO. OBTENÇÃO DE DADOS FISCAIS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. QUESTÃO NÃO COMPREENDIDA NO JULGAMENTO DO TEMA 990 PELO STF. ACESSO DIRETO PELO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO, QUE NÃO SE CONFUNDE COM A REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS, PREVISTA LEGALMENTE E RECONHECIDAMENTE POSSÍVEL PELA CORTE SUPREMA. COMPARTILHAMENTO QUE OCORRE, DE OFÍCIO, PELA RECEITA FEDERAL, APÓS DEVIDO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM QUE, POSTERIORMENTE AO LANÇAMENTO DO TRIBUTO, VERIFICA-SE A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DA PRÁTICA DE CRIME. ILEGALIDADE CONFIGURADA. RECONHECIMENTO DA ILICITUDE DOS DADOS OBTIDOS PELO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO E OS DELES DECORRENTES. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, em sede de repercussão geral, firmou a orientação de que é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (Tema 990). 2. Da leitura desatenta da ementa do julgado, poder-se-ia chegar à conclusão de que o entendimento consolidado autorizaria a requisição direta de dados pelo Ministério Público à Receita Federal, para fins criminais. No entanto, a análise acurada do acórdão demonstra que tal conclusão não foi compreendida no julgado, que trata da Representação Fiscal para fins penais, instituto legal que autoriza o compartilhamento, de ofício, pela Receita Federal, de dados relacionados a supostos ilícitos tributários ou previdenciários após devido procedimento administrativo fiscal. 3. Assim, a requisição ou o requerimento, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal, com o fim de coletar indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, além de não ter sido satisfatoriamente enfrentada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, não se encontra abarcada pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em questão. Ainda, as poucas referências que o acórdão faz ao acesso direto pelo Ministério Público aos dados, sem intervenção judicial, é no sentido de sua ilegalidade. 4. Hipótese dos autos que consiste no fato de que o Ministério Público Federal solicitou, diretamente ao Superintendente da Receita Federal, as Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e declarações de imposto de renda da recorrente, de seus familiares e de diversas pessoas jurídicas, ou seja, obteve-se diretamente do referido órgão documentação fiscal sem que tenha havido qualquer espécie de ordem judicial. 5. A possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados sem autorização judicial. 6. Recurso provido para reconhecer a ilicitude dos dados (fiscais) obtidos pelo Ministério Público por meio da Receita Federal na Ação Penal n. 0003084-80.2016.4.03.6126, sem autorização judicial, devendo todos os elementos de informação e os deles decorrentes ser desentranhados da ação penal, cabendo ao Juízo de Direito da 3ª Vara Federal de Santo André/SP identificá-los, verificar em quais ações penais foram utilizados e analisar, pormenorizadamente, se as ações penais se sustentariam sem esses indícios. (RHC n. 83.233/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 9/2/2022, DJe de 15/3/2022.) PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. ESTELIONATO MAJORADO, FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO. OBTENÇÃO DE DADOS FISCAIS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. QUESTÃO NÃO COMPREENDIDA NO JULGAMENTO DO TEMA 990 PELO STF. ACESSO DIRETO PELO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO, QUE NÃO SE CONFUNDE COM A REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS, PREVISTA LEGALMENTE E RECONHECIDAMENTE POSSÍVEL PELO STF. COMPARTILHAMENTO QUE OCORRE, DE OFÍCIO, PELA RECEITA FEDERAL APÓS DEVIDO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM QUE, POSTERIORMENTE AO LANÇAMENTO DO TRIBUTO, VERIFICA-SE A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DA PRÁTICA DE CRIME. ILEGALIDADE CONFIGURADA. RECONHECIMENTO DA ILICITUDE DOS DADOS OBTIDOS PELO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO E OS DELES DECORRENTES. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, em sede de repercussão geral, firmou a orientação de que é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (Tema 990). 2. Da leitura desatenta da ementa do julgado, poder-se-ia chegar à conclusão de que o entendimento consolidado autorizaria a requisição direta de dados pelo Ministério Público à Receita Federal, para fins criminais. No entanto, a análise acurada do acórdão demonstra que tal conclusão não foi compreendida no julgado, que trata da Representação Fiscal para fins penais, instituto legal que autoriza o compartilhamento, de ofício, pela Receita Federal, de dados relacionados a supostos ilícitos tributários ou previdenciários, após devido procedimento administrativo fiscal. 3. Assim, a requisição ou o requerimento, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal, com o fim de coletar indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, além de não ter sido satisfatoriamente enfrentada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, não se encontra abarcada pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e questão. Ainda, as poucas referências que o acórdão faz ao acesso direto pelo Ministério Público aos dados, sem intervenção judicial, é no sentido de sua ilegalidade. 4. Hipótese dos autos que consiste exatamente no fato de que o Ministério Público Federal solicitou, diretamente ao Superintendente da Receita Federal, as declarações de imposto de renda do recorrente, de seus familiares e de diversas pessoas jurídicas, ou seja, obteve diretamente do referido órgão documentação fiscal, sem que tenha havido qualquer espécie de ordem judicial. 5. A possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados, sem autorização judicial. 6. Recurso provido para reconhecer a ilicitude dos dados (fiscais) obtidos pelo Ministério Público por meio da Receita Federal na Ação Penal n. 0003084-80.2016.4.03.6126, sem autorização judicial, devendo todos os elementos de informação e os deles decorrentes ser desentranhados da ação penal, cabendo ao Juízo de Direito da 3ª Vara Federal de Santo André/SP identificá-los, verificar em quais ações judiciais foram utilizados e analisar, pormenorizadamente, se as ações penais se sustentariam sem esses indícios. (RHC n. 83.447/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 9/2/2022, DJe de 15/3/2022.)
O entendimento firmado no último precedente foi, inclusive, ratificado, após os autos terem sido devolvidos pela Presidência desta Corte Superior, em juízo de admissibilidade de recurso extraordinário. Ao ensejo:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. ADMISSIBILIDADE DA PRESIDÊNCIA DO STJ. ENCAMINHAMENTO DOS AUTOS PARA JUÍZO DE RETRATAÇÃO A RESPEITO DA TESE FIRMADA NO ÂMBITO DA TERCEIRA SEÇÃO. RECONSIDERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO QUE SE COADUNA COM AS TESES FIRMADAS PELA SUPREMA CORTE NO TEMA 990 DA REPERCUSSÃO GERAL. REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS QUE NÃO SE CONFUNDE COM O AFASTAMENTO DA RESERVA DE JURISDIÇÃO NO TOCANTE À QUEBRA DO SIGILO FISCAL MEDIANTE INICIATIVA DO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO. RATIFICAÇÃO DA TESE FIRMADA NO ÂMBITO DO STJ QUE SE IMPÕE. 1. Em sessão de julgamento da Terceira Seção deste Superior Tribunal, decidiu-se, por maioria, que, apesar de o Supremo Tribunal Federal ter fixado orientação no sentido da legalidade da denominada "representação fiscal para fins penais", hipótese em que o próprio órgão da Receita Federal, de ofício, diante da suspeita da ocorrência de crime, encaminha os autos ao Ministério Público para eventual apuração, não autoriza o caminho inverso: a requisição de dados fiscais diretamente, partindo do órgão da acusação, para fins de investigação ou ação penal. 2. Ao realizar o juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto pelo Ministério Federal, a Presidência deste Superior Tribunal, verificando que o entendimento firmado aqui poderia estar dissonante daquele do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 990 de repercussão geral, encaminhou os autos para juízo de retratação. 3. Necessidade de ratificação da tese firmada, uma vez que seus fundamentos se coadunam com os do acórdão decorrente do julgamento do Tema n. 990, Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e pela Corte Suprema, pois ali não se autorizou, em nenhum momento, a requisição direta de dados fiscais pelo órgão da acusação, para fins de investigação ou ação penal, sem autorização judicial. 4. Ratificados o voto e a tese firmada no julgamento do Recurso em Habeas Corpus n. 83.477/SP. (RE no RHC n. 83.447/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 8/6/2022, DJe de 13/6/2022.) No mesmo sentido, foram proferidos, ainda, os seguintes precedentes: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ALEGADA OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. EXISTÊNCIA. DIVERSAS FRAUDES PERPETRADAS, EM TESE, CONTRA O DETRAN/RS. ALEGAÇÃO DE ILICITUDE DOS DOCUMENTOS FISCAIS SIGILOSOS REQUISITADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DIRETAMENTE AO FISCO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ART. 1.040, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NECESSIDADE DE DISTINÇÃO NO PRESENTE DO DECIDIDO AO JULGAMENTO DO TEMA 990 COM REPERCUSSÃO GERAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. COMPARTILHAMENTO DE DADOS OBTIDOS PELA RECEITA FEDERAL EM QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL PARA FINS DE PERSECUÇÃO PENAL. DESCABIMENTO NO CASO OS AUTOS. NECESSÁRIA REALIZAÇÃO DE DISTINÇÃO DOS CASOS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TESE 990 A CASOS EM NÃO HÁ INVESTIGAÇÃO DE CRIME TRIBUTÁRIOS E ANÁLOGOS. I - Nos termos do art. 619 do CPP, serão cabíveis embargos declaratórios quando houver ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão no julgado. Podem também ser admitidos para a correção de eventual erro material, consoante entendimento preconizado pela doutrina e jurisprudência. Não constituem, portanto, recurso de revisão. II - Inviável a análise originária de tese não submetida ao crivo da Corte de origem, sob pena de indevida supressão de instância. In casu, não há falar em omissão em relação à análise da tese subsidiária da impetração, quanto à suposta ilegalidade da requisição do Parquet, na medida em que lastreada unicamente em denúncia anônima e depoimento apócrifo, porquanto não foi objeto de deliberação no acórdão da Correição Parcial. III - Ademais, ainda que assim não fosse, cediço o entendimento de que o Ministério Público, diante do recebimento de denúncia anônima, possui legitimidade para diligenciar investigações preliminares para aferição da plausibilidade da denúncia, como ocorreu no caso destes autos de forma antecedente à requisição de quebra do sigilo fiscal, por meio da instauração de procedimento administrativo. Precedentes. IV - Por outro lado, pertinente a alegação de necessária realização de distinção entre o presente caso e o versado no Tema n. 990/STF, na medida em que a possibilidade de compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da Receita Federal Brasileira com o titular da ação penal ocorreu em virtude do cometimento de crimes tributários, além de lavagem de dinheiro, apropriação indébita ou sonegação de contribuição previdenciária, bem como contrabando ou descaminho, o que não é o caso dos autos, em que a embargante e corréus foram processados por crimes outros (formação de quadrilha, dispensa indevida de licitação e peculato-desvio) não versando, por conseguinte, de caso no qual se possa aplicar o entendimento firmado no tema supracitado, ainda mais porque os documentos foram objeto de requisição pelo Ministério Público Federal e não, como o caso tratado pela Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e Corte Suprema, de representação para fins penais da Receita Federal Brasileira. V - Com efeito, colhe-se do voto condutor do acórdão que resultou na edição do tema 990 da repercussão geral a seguinte determinação à Receita Federal Brasileira, verbis: "Nessa conformidade, proponho o seguinte no tocante à Receita Federal: i) É constitucional o compartilhamento pela Receita Federal com órgãos de persecução penal, via representação fiscal para fins penais, de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de crimes a) de descaminho ou contrabando (DL 2.848/40, arts. 334 e 334-A), ou b) contra a ordem tributária ou a Previdência Social (art. 83 da Lei 9.430/96)", delitos peolos quais não foi a ora embagrante denunciada. VI - A 3ª Seção deste Sodalício, apreciando dois recursos em habeas corpus da mesma temática (RHC n. 83.233/SP e 83.447/SP), da relatoria do eminente Ministro Sebastião Reis Júnior, entendeu pela ilegalidade da requisição pelo Ministério Público de dados fiscais protegidos por sigilo, sem a imprescindível autorização judicial, na medida em que se tratava de ação penal nos quais os acusados foram denunciados pelos crimes de estelionato majorado, falsidade ideológica e uso de documento falso, hipótese similar ao caso destes autos. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para restabelecer a decisão concessiva de habeas corpus. (EDcl no AgRg no HC n. 234.857/RS, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 22/2/2022, DJe de 25/2/2022.) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. COMPARTILHAMENTO DE DADOS FISCAIS PELA RECEITA FEDERAL DIRETAMENTE AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. HIPÓTESE NÃO COMPREENDIDA NA TESE FIRMADA NO JULGAMENTO DO TEMA 990 PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -STF. PROCEDIMENTO METAMÓRFICO QUE NÃO SE CONFUNDE COM A REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS PREVISTA LEGALMENTE E RECONHECIDA PELO STF. ILEGALIDADE CONFIGURADA. DECLARAÇÃO DE ILICITUDE DOS DADOS OBTIDOS PELO ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO E DOS DEMAIS ATOS SUBSEQUENTES. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS. 1. Verifica-se omissão da decisão quanto à pretendida delimitação do âmbito e dos pressupostos de legalidade parametrizados na tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 990. Realmente, não mereceu a atenção devida o fato de ter havido compartilhamento das informações entre a Receita Federal e o Ministério Público Federal em Santa Catarina, efetuado em 3/10/2016, em fase embrionária da investigação tributária, sem a precedência do lançamento tributário justificador da referida prática. 2. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, em sede de repercussão geral, firmou a orientação de que é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (Tema 990). 3. Esse entendimento consolidado não autorizaria o compartilhamento indiscriminado, açodado e plenamente discricionário de dados sigilosos pela Receita Federal ao Ministério Público. Seguramente, a análise acurada do Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e acórdão demonstra que tal conclusão não foi compreendida no julgado, que trata da Representação Fiscal para fins penais, instituto legal que autoriza o compartilhamento, de ofício, pela Receita Federal, de dados relacionados a supostos ilícitos tributários ou previdenciários após devido procedimento administrativo fiscal. 4. Assim, a requisição ou o compartilhamento ativo, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal e, reversamente, com o fim de coletar/fornecer indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, não se encontram abarcados pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em questão. Distinguishing. 5. Inconsistentes as referências que o acórdão faz ao teor de "dados globais" das informações compartilhadas, a permitirem o acesso direto pelo Ministério Público, sem intervenção judicial. Dados detalhados e críticos da atividade empresarial que extravasam, em muito, os limites objetivos da tutela de urgência vigente à época. Minúcias que não se contêm nas estremaduras do conceito de "montantes globais". Tutela antecipatória, ademais, explicitamente revogada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do caso paradigmático. 6 . O procedimento objurgado se encontra inquinado de nulidade ab ovo, a caracterizar constrangimento ilegal sanável pelo habeas corpus. Portanto, apesar dessas premissas terem passado despercebidas no julgamento anterior, a concessão da ordem se impõe, nos termos do pedido inicial. 7. Solução adotada que, por sua maior abrangência, acarreta a superveniente perda de interesse recursal em relação aos demais pontos impugnados pelos embargos de declaração, tornando prejudicado o exame dessas matérias. 8. Embargos de declaração acolhidos em parte, com excepcionais efeitos infringentes, para conceder a ordem de habeas corpus e declarar a nulidade da prova matriz, consistente no compartilhamento de informações entre a Receita Federal e Ministério Público Federal, que motivaram a instauração do Inquérito Policial n. 5002024-02.2017.4.04.7200 (IPL n. 0073/2017- SR/DPF/SC), sem autorização judicial, e, por consequência, de todos os atos e provas subsequentes. (EDcl no AgRg nos EDcl no RHC n. 119.297/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022.)
Na presente hipótese, a Corte local, ao analisar a alegação defensiva, considerou não haver ilegalidade, destacando, em um primeiro momento, que, à época dos fatos, o Superior Tribunal de Justiça possuía entendimento no sentido da possibilidade de compartilhamento de dados, nos moldes em que verificado nos autos. Registrou, no mais, que (e-STJ fls. 168-171):
Do compulsar dos autos originários, verifica-se que a ação penal instaurada pelo Parquet advém de auto de infração tributária decorrente de inconsistência na apuração de créditos referentes ao ICMS por substituição tributária em operações de aquisição de álcool etílico hidratado combustível. O auto de infração teve o número 03-221050-2, lavrado em 03/11/2010, dando ensejo por impugnação administrativa ao PAF de número E04/000/058016/2011. Após a lavratura de outros autos de infração da mesma ordem por diversas outras empresas, o Ministério Público determinou que a autoridade policial abrisse um inquérito policial, cujo número é 12/2013, decorrente do procedimento da própria acusação de número 2011.00732664. O inquérito policial foi juntado integralmente pela Defesa no atual momento Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e processual. Em que pese a autoridade policial ter requisitado dados à SEFAZ, verificase que esta não forneceu as informações solicitadas e afirmou que só as remeteria ao Ministério Público em razão do sigilo fiscal. Destarte, o Parquet assumiu a investigação e solicitou, inicialmente, que fosse reportado se foram lavrados autos de infração, incluindo o paciente e a empresa de que foi administrador, obtendo-se a resposta de que havia sido lavrado o auto de infração 03-221050-2, que deu azo à denúncia, porém dizendo que houve impugnação ou recurso, não tendo sido juntado o próprio auto de infração. Posteriormente, a acusação requereu os espelhos e históricos dos autos de infração, em 10/08/2017, mas eles não foram enviados, o que somente ocorreu após a segunda reiteração. A SEFAZ então encaminhou um CD com esses dados e o Ministério Público, em decorrência das obrigações legais que assumiu, determinou o sigilo do inquérito e requisitou novamente à SEFAZ acerca do possível encaminhamento das RFFPs e da constituição definitiva dos créditos tributários, o que ocorreu em 26/06/2018. Portanto, o compartilhamento de tais dados fiscais sigilosos permaneceu em sigilo e obedecia à jurisprudência do STJ da época, que permitia que eles fossem requisitados sem autorização judicial, como já visto. Prosseguindo-se, a SEFAZ respondeu em 16/01/2019, afirmando que, quanto ao auto de infração 03-221050-2, ainda não havia a lavratura da RFFP. Reiterado o ofício para saber se já houve o encaminhamento, a SEFAZ responde, em 16/08/2019, que a RFFP já foi encaminhada. Como se verifica dos documentos acostados com a denúncia, o inquérito policial foi aberto para fins de investigação da conduta de desvios tributários em andamento de apuração de crimes relativos ou com estreita vinculação à operação Lava Jato (ind. 291-298 dos autos originários), cujo nome do denunciado foi apontado como participante do esquema criminoso. E, ao que se observa, ainda que pela via oblíqua do habeas corpus, o Ministério Público e a Secretaria de Fazenda a princípio, obedeceram estritamente aos deveres legais de sigilo fiscal quando da transferência de dados, seja pela instauração do procedimento administrativo adequado para sua obtenção, seja pela forma como foi efetuada a transmissão, seja pela decretação do sigilo no inquérito policial informado, seja pela obediência à jurisprudência do STJ que admitia tal compartilhamento à época. Registre-se que a mudança da jurisprudência do STJ somente ocorreu em 2022, sendo a denúncia datada de 25/10/2019. Não é possível, outrossim, de antemão, sem a análise pormenorizada exigida pela instrução probatória, observar ilegalidade na colheita das provas. Isso porque os impetrantes não provaram de modo cabal que a RFFP foi elaborada por requisição do Ministério Público. Essa verificação é subjetiva e competirá ao juízo de primeiro grau quando da apreciação do conjunto probatório, sob pena de supressão de instância ou de se fazer um juízo de valor sobre provas no caminho estreito do habeas corpus. Frise-se que a requisição de informações acerca da RFFP pelo Ministério Público à SEFAZ foi realizada em observância à condição de procedibilidade da ação penal em crimes tributários. Ou seja, o Parquet somente poderia ofertar a denúncia se houvesse a remessa da RFFP. Por este motivo, embora já tivesse inaugurado a investigação criminal, teria que restar no aguardo da confecção da RFFP e da constituição do crédito tributário, de modo a poder ofertar a denúncia e instaurar a ação penal. Em que pese o PAF ter finalizado em março de 2016, conforme se extrai dos autos, e a RFFP datar de 14/05/2019, não é possível correlacionar de imediato que sua emissão tenha ocorrido por pressão do órgão acusatório, a ensejar sua ilegalidade, o que, repita-se, passa pela análise subjetiva das provas a ser realizada pelo julgador de primeira instância. Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e Outrossim, neste exame inicial, observa-se que o compartilhamento dos dados sigilosos fiscais ocorreu em observância às condições impostas pelo Tema 990 da Repercussão Geral do STF, havendo a distribuição da denúncia somente após a confecção da RFFP e remessa à autoridade investigativa competente. Portanto, neste momento processual, não é possível conceber constrangimento ilegal ou ausência de justa causa para a ação penal, consoante os documentos juntados pelos impetrantes nos autos, devendo ser mantida a decisão que recebeu a denúncia. Importante destacar que o feito se encontra em fase de encerramento da instrução criminal, faltando a oitiva de uma testemunha e o interrogatório do réu. Somente após, será possível ter elementos suficientes para formar uma convicção definitiva. Assim, por cautela, e se entender desta forma, sugiro ao Juízo a quo, durante a realização da audiência de instrução e julgamento, colher o depoimento do subscritor do ofício emitido pela SEFAZ (ind. 109 dos presentes autos – novas informações da autoridade coatora) para explicar por qual motivo foram remetidos os documentos sigilosos ou a RFFP sem que houvesse ordem judicial, o que é a matéria da controvérsia informada pela Defesa.
Reitero que o precedente indicado pelo Tribunal de origem, para considerar que a atuação do Ministério Público estaria amparada na jurisprudência desta Corte Superior, se refere a situação excepcional, na qual se "apurava exatamente a suposta violação de dever funcional por parte dos auditores fiscais, que não estariam remetendo ao Parquet as representações em situações configuradoras de sonegação e fraude" (HC n. 500.470/ES, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 23/3/2021, DJe de 5/4/2021). Contudo, a hipótese dos autos não trata de violação de dever funcional. Ademais, excepcionado referido precedente, o qual trata de situação que apresenta particularidades não verificadas no caso dos autos, reafirmo que os precedentes desta Corte Superior que prevaleciam à época dos fatos autorizavam o compartilhamento de dados fiscais apenas por iniciativa do órgão fazendário e não por requisição do Ministério Público. A propósito:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PRETENSÃO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE ILICITUDE DA PROVA QUE ENSEJOU A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO PENAL. COMPARTILHAMENTO DOS DADOS FISCAIS E BANCÁRIOS, DE OFÍCIO, PELA RECEITA FEDERAL COM O ÓRGÃO DA ACUSAÇÃO. REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF (RE n. 1.055.941/SP). CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA. 1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (RE n. Documento eletrônico VDA41967608 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): REYNALDO SOARES DA FONSECA Assinado em: 13/06/2024 16:29:21 Código de Controle do Documento: 980f9610-2c3f-40e9-8cd5-7dd7d3b2028e 1.055.941/SP, Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe 6/10/2020). 2. No caso, os dados fiscais e bancários do paciente aportaram ao órgão da acusação a partir da iniciativa da autoridade fiscal, que, após concluir o procedimento administrativo fiscal e verificar o indício da prática de crime, comunicou o fato e encaminhou os autos ao Ministério Público para a promoção da persecução criminal. 3. Além de tal modo de proceder encontrar-se previsto nos arts. 198 do CTN, 83 da Lei n. 9.430/1996 e § 3º do art. 1º da LC n. 105/2001, o Supremo Tribunal Federal entendeu constitucional o compartilhamento do procedimento fiscalizatório, de ofício, pela Receita Federal com o órgão da acusação, para fins de instrução criminal. 4. Ordem denegada. (HC n. 495.341/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 10/8/2021, DJe de 16/8/2021.)
Verifica-se, portanto, que a requisição de informações acobertadas por sigilo fiscal feita diretamente pelo Ministério Público à Secretaria de Fazenda estadual, sem prévia autorização judicial, não encontrava amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, estando, em verdade, na contramão dos precedentes desta Corte.
Reafirmo que "a possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados, sem autorização judicial " (RHC n. 83.447/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 9/2/2022, DJe de 15/3/2022).
No caso dos autos, verifica-se que o Ministério Público determinou à autoridade policial que instaurasse inquérito em 2013, momento em que o crédito tributário ainda estava sendo apurado em procedimento administrativo.
A constituição definitiva do crédito tributário, segundo o acórdão recorrido, ocorreu apenas em 26/6/2018 e a representação fiscal para fins penais foi lavrada apenas em 2019, no entanto, as informações fiscais do recorrente já haviam sido encaminhadas ao órgão ministerial em momento anterior, em 2015, e por requisição.
Dessa forma, reitero que a solicitação de dados sigilosos pelo Ministério Público diretamente à Secretaria de Fazenda, antes mesmo da constituição definitiva do crédito tributário e da existência de representação fiscal para fins penais, revela ilegalidade que torna nulos referidos elementos de informação, os quais devem ser desentranhados dos autos. Devem ser igualmente desentranhadas as provas derivadas, determinando-se ao Magistrado de origem a aferição a respeito da existência de outras provas que autorizem a manutenção da ação penal. Assim, em que pese o esforço argumentativo do combativo órgão ministerial, não foram apresentados argumentos aptos a reverter as conclusões trazidas na decisão agravada, motivo pelo qual esta se mantém por seus próprios e jurídicos fundamentos. Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental. É como voto.
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