STJ Ago24 - Nulidade da Decisão de Ratificação de Recebimento da Denúncia - Ausência Total de Fundamentação - Não Abordou Nenhum Ponto Impugnado Defesa na R.A. ":Nulidade de Todos Atos para Proferir Nova Decisão"
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
Inteiro Teor
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 71994 - SC (2023/0277141-9)
DECISÃO
SXXXXXXXXA. alega sofrer coação ilegal em seu direito de locomoção, em decorrência de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina no MS n. 5028512-59.2023.8.24.0000.
Em suas razões, a defesa sustenta, em síntese, a nulidade da decisão que confirmou o recebimento da denúncia, ante a total ausência de análise das teses defensivas apresentadas na resposta à acusação.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso.
Decido.
A defesa sustenta a nulidade da decisão que ratificou o recebimento da denúncia, dada a falta de motivação para rechaçar as teses apresentadas na resposta à acusação.
O Magistrado de origem assim ratificou o recebimento da denúncia:
1. Da alegação de inépcia da denúncia Procedendo à análise dos autos, verifica-se que a defesa de Juliana sustenta a inépcia da peça acusatória, alegando, em síntese, não estarem presentes os requisitos constantes no art. 41 do Código de Processo Penal, segundo o qual "A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas."
No caso concreto, observa-se que a denúncia preencheu todos os requisitos elencados no mencionado artigo de lei, tanto que foi devidamente recebida por este Juízo, de forma que a peça acusatória descreve detalhadamente a conduta praticada pela acusada, individualizando-a, possibilitando, deste modo, sua ampla defesa.
De acordo com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
[...]
Sendo assim, não há que se falar em inépcia da exordial acusatória, restando afastada tal alegação defensiva.
2 Da alegada ausência de justa causa Procedendo à análise dos autos, verifica-se que a defesa da acusada sustentou a ausência de justa causa alegando, em síntese, que não há materialidade e indícios da autoria delitiva da ré atinente aos fatos narrados na denúncia.
Sobre o assunto, é sabido que "para o oferecimento da denúncia, exige-se apenas a descrição da conduta delitiva e a existência de elementos probatórios mínimos que corroborem a acusação. Provas conclusivas da materialidade e da autoria do crime são necessárias apenas para a formação deum eventual juízo condenatório. Embora não se admita a instauração de processos temerários e levianos ou despidos de qualquer sustentáculo probatório, nessa fase processual deve ser privilegiado o princípio do in dubio pro societate. (...)
(STJ, RHC 104.478/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTATURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 19/12/2018) Ademais, ressalta-se que a conduta descrita na peça acusatória se amolda perfeitamente ao tipo penal denunciado. Além disso, foi possível constatar que a conduta praticada foi descrita de forma detalhada, de maneira individualizada, fato este que possibilitou o exercício da ampla defesa do denunciado.
De todo o exposto, não se configura no caso concreto a existência manifesta de causas (legais ousupralegais) excludentes de tipicidade (formal ou material), de ilicitude ou de culpabilidade, tampouco se vislumbra a presença de alguma das hipóteses de extinção da punibilidade do agente (art. 397, CPP), o que significa que descabe o decreto de absolvição sumária.
Logo, afasto a preliminar suscitada.
3) Remeto, pois, o feito à instrução processual, porquanto o substrato probatório coligido aos autosnão permite a formação da convicção judicial definitiva quanto à efetiva ocorrência do delito ou àpresença de causas de absolvição sumária (art. 397, CPP).
Esta Corte Superior de Justiça adota o entendimento de que, na ratificação do recebimento da denúncia, deve haver motivação acerca das teses apresentadas na defesa preliminar, ainda que de forma sucinta, pois, nessa fase, o juiz limita-se à admissibilidade da acusação e deve evitar o prejulgamento da controvérsia.
Assim,"não sendo a hipótese de absolvição sumária do acusado, a decisão do Juízo processante que recebe a denúncia não demanda fundamentação complexa, sob pena de antecipação prematura de um juízo meritório que deve ser naturalmente realizado ao término da instrução criminal, em estrita observância aos princípios da ampla defesa e do contraditório"(AgRg no AREsp n. 440.087/SC, Rel. Ministra Laurita Vaz, 5ª T, DJe de 17/6/2014).
Na hipótese, contudo, a decisão que ratificou o recebimento da denúncia em desfavor do paciente não atende ao comando constitucional previsto no art. 93, IX, da Constituição Federal, pois não fez a mínima referência aos argumentos apresentados pela defesa na resposta à acusação.
Trata-se, em verdade, de decisão genérica, sem nenhuma menção ao caso concreto - o nome da ré, inclusive, consiste em pessoa estranha aos autos - razão pela qual deve ser anulada.
No mesmo sentido:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. ARTIGO 54, § 2º, V, DA LEI Nº 9.605/98. POLUIÇÃO. DENEGAÇÃO DA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO MÍNIMA. NULIDADE. RECONHECIMENTO.
RECURSO PROVIDO.
1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a denegação da absolvição sumária é decisão que exige fundamentação quanto às teses relevantes e urgentes apresentadas na resposta à acusação, o que efetivamente não ocorreu na hipótese.
2. Recurso em habeas corpus provido para anular a decisão de denegação da absolvição sumária.
(RHC n. 79.216/RJ, Rel. Ministro Rogerio Schietti, Rel. p/ acórdão Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 31/10/2018, grifei) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME DE LICITAÇÃO (ART. 90 DA LEI 8.666/93). DECISÃO QUE REJEITOU A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO.
1. Embora permaneça a jurisprudência considerando prescindível maior fundamentação na decisão de recebimento inicial da peça acusatória, exigida é especificada motivação para a denegação das teses de absolvição sumária.
2. Compreende esta Turma que o constitucional dever de motivação exige que seja a denegação da absolvição sumária fundamentada, ainda que concisamente, apreciando as teses relevantes e urgentes apresentadas na resposta à acusação, consignando mesmo aquelas dependentes de instrução.
3. É nula a decisão denegatória da absolvição sumária em que o magistrado de piso sequer menciona qualquer dos pontos aventados na peça defensiva de resposta à acusação, devendo a decisão enfrentar as teses de defesa relevantes e urgentes, que prescindam de dilação probatória, ou mesmo consignado aquelas dependentes de instrução.
4. Agravo regimental provido para anular a ação penal a partir da decisão que ratificou o recebimento da denúncia, devendo outra ser proferida, apreciando-se as teses relevantes e urgentes, como entender de direito.
(AgRg no RHC n. 84.944/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 14/5/2019, destaquei).
RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIMES AMBIENTAIS. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DA AÇÃO PENAL. DECISÃO DENEGATÓRIA DA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. AUSÊNCIA DE ANÁLISE DAS TESES LEVANTADAS EM RESPOSTA À ACUSAÇÃO. NULIDADE.
OCORRÊNCIA.
1. Conquanto este Superior Tribunal admita fundamentação concisa a respeito das teses formuladas na resposta à acusação, em relação às alegações preliminares, urgentes e impeditivas do prosseguimento da ação penal, deve haver o mínimo de fundamentação a respeito da sua procedência ou improcedência.
2. No caso, a defesa alegou, em resposta à acusação, as preliminares de atipicidade da conduta prevista no art. 48 da Lei n. 9.605/1998, a ausência de condição de procedibilidade para o exercício da ação penal, a falta de interesse de agir da Justiça Pública em relação ao crime previsto no art. 40, caput, da Lei n. 9.605/1998 e a inépcia da denúncia, tendo o magistrado singular se limitado a manter a ação penal sob o argumento de que não verificou nenhuma causa de absolvição sumária.
3. Recurso provido para anular a ação penal proposta contra o recorrente, a partir da decisão denegatória da absolvição sumária, devendo outra ser proferida, apreciando-se os termos da resposta à acusação.
(RHC n. 66.732/RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior, 6ª T., DJe 30/6/2016, grifei).
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. DENÚNCIA. RECEBIMENTO.
RESPOSTA À ACUSAÇÃO. RATIFICAÇÃO. DECISÃO NÃO FUNDAMENTADA.
PRELIMINARES NÃO EXAMINADAS ADEQUADAMENTE PELO JUIZ. QUESTÕES PROCESSUAIS RELEVANTES E URGENTES. NULIDADE. PROVIMENTO.
1. Realizada após a resposta à acusação, a ratificação do recebimento da denúncia dispensa a expensão de fundamentos exaurientes e plenos, até para que não seja prejulgada a causa, mas mostra-se imprescindível a mínima referência aos argumentos naquela peça apresentados, sob pena de nulidade.
2. Hipótese em que o magistrado limitou-se a afirmar que" o aduzido pela defesa confunde-se com o mérito "e que" para verificar tais preliminares seria exigido deste Juízo uma análise perfunctória, o que não pode ocorrer nesta fase, já que seria adentrar em sede meritória ". Aduziu, genericamente, a ausência dos requisitos do art. 397 do Código de Processo Penal. Não se verifica, contudo, qualquer explanação concreta a demonstrar a razão de se entender que as questões confundem-se com o mérito do processo. Na verdade, a fundamentação adotada serviria para inúmeros processos criminais. A alegação de inépcia da denúncia, em especial, deve ser analisada nesse momento processual, já que inclusive fica superada com a prolação de sentença.
3. Incumbe ao magistrado enfrentar questões processuais relevantes e urgentes ao confirmar o aceite da exordial acusatória, o que não ocorreu na espécie.
4. As teses defensivas ventiladas na defesa preliminar - falta de justa causa em relação à acusação de homicídio e à qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima, bem como a inépcia quanto às qualificadoras do motivo fútil e meio cruel - devem ser ponderadas devidamente pelo magistrado singular, ao proferir novo decisum relativo ao recebimento da exordial acusatória.
5. Recurso ordinário provido a fim de anular o processo, a partir da segunda decisão de recebimento da denúncia, devendo outra ser proferida, apreciando-se os termos da resposta escrita à acusação.
(RHC n. 81.906/MG, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T.
, DJe 4/10/2017, destaquei).
À vista do exposto, dou provimento ao recurso para anular o processo originário a partir da decisão que ratificou o recebimento da denúncia, para que outra seja proferida.
Publique-se e intimem-se.
Brasília (DF), 15 de agosto de 2024.
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ
Relator
(STJ - RMS: 71994, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 19/08/2024)
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