STJ Jun24 - Júri - Pronúncia Anulada - (i) Quebrada Cadeia de Custódia: Qualificadora do Homicídio Baseada em Prints do Whatsapp Web - (ii) Baseada em Elementos de Informação e Testemunho Indireto - Ferimento ao Art. 155 do CPP
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADES. ILICITUDE DA PROVA. VIOLAÇÃO DO ART. 155 DO CPP. PRONÚNCIA BASEADA EM TESTEMUNHOS INDIRETOS. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não constato elementos suficientes para reconsiderar a decisão proferida, cuja conclusão mantenho pelos seus próprios fundamentos. 2. A gravantes foram pronunciados com base em prints de conversa de whatsapp web, sem que a defesa tivesse acesso ao inteiro teor das mensagens ou relatório pericial da polícia judiciária sobre a veracidade das mensagens. 3. A utilização de "prints" de mensagens, mesmo que realizados pela autoridade policial, viola a cadeia de custódia prevista nos artigos 158 e ss.do CPP e é prova ilícita de acordo com os precedentes desta Corte.4. Por fim, assiste razão à defesa quando aduz a existência de violação do artigo 155 do CPP no v. acórdão quanto ao exame da inadmissibilidade dos elementos informativos da etapa policial e dos depoimentos indiretos como base para manter a decisão de pronúncia.5. Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no AREsp: 2441511 PR 2023/0309396-4, Relator: Ministra DANIELA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 11/06/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/06/2024)
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NO VOTO
RELATÓRIO
O presente Agravo Regimental é interposto em face da r. decisão de fls.
1.286/1.299 (e-STJ).
Conforme se extrai da decisão, foi acolhida a preliminar de nulidade e, "consequentemente, anulo[u] o processo desde a decisão de pronúncia, com o desentranhamento dos prints das conversas de whatsapp, devendo o juízo de primeiro grau franquear acesso às provas a defesa de ambos os acusados e proferir nova decisão de acordo com a legislação pertinente e os precedentes desta Corte de Justiça." (e-STJ fls. 1.298).
O Ministério Público Federal agravou requerendo o provimento do presente recurso (com pedido de reconsideração), para que seja desprovido o recurso especial, mantendo-se inalterada a pronúncia.
A nobre defesa apresentou impugnação no sentido de que seja negado seguimento ao agravo regimental em recurso especial, conforme fundamentação acima delineada.
VOTO
O agravo regimental é tempestivo e indicou os fundamentos da decisão recorrida.
No entanto, não constato elementos suficientes para reconsiderar a decisão proferida ou prover o presente agravo regimental, uma vez que a decisão assim dispôs:
"[...]
Desse modo, o juízo de primeiro grau utilizou prova ilícita (print de conversa de whatsapp) e não permitiu que a defesa verifica-se a cadeia de custódia e, com isso, a veracidade desse elemento de informação. Aliado a isso, verifico que o juízo e o Tribunal local afastaram a nulidade, pois entenderam que não haveria prejuízo diante das demais provas produzidas nos autos e aptas a pronunciar os agravantes. Contudo, do excerto transcrito, verifica-se que assiste razão ao agravante quando aduz a existência de violação do artigo 155 do CPP no v. acórdão quanto ao exame da inadmissibilidade dos elementos informativos da etapa policial e dos depoimentos indiretos como base exclusiva para manter a decisão de pronúncia.(...) Há de se reconhecer, portanto, que o princípio in dubio pro societate não pode ser utilizado para suprir lacunas probatórias, ainda que o standard exigido para a pronúncia seja menos rigoroso do que aquele para a condenação.
Acrescento ao debate o entendimento desta Corte sobre a alegação defensiva, de acordo com o qual"o testemunho de 'ouvir dizer' ou hearsay testimony não é suficiente para fundamentar a pronúncia, não podendo esta, também, encontrar-se baseada exclusivamente em elementos colhidos durante o inquérito policial, nos termos do art. 155 do CPP"(AgRg no AgRg no AR Esp n. 2.142.384/RS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 24/10/2023, D Je de 27/10/2023 e AgRg no R Esp n. 2.017.497/RS, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 16/10/2023, D Je de 19/10/2023).
Extrai-se das transcrições que os agentes que investigaram foram as testemunhas indiretas utilizadas para fundamentar a pronúncia, bem como a acusação dispensou as duas testemunhas que presenciaram o fato e que foram ouvidas apenas em sede policial.(...)
Após detida análise dos autos, bem como dos pedidos da defesa, reconheço a nulidade suscitada e determino o desentranhamento dos prints das mensagens de celular, pois há informação nos autos que o celular do adolescente foi apreendido por determinação judicial e enviado para ser periciado, podendo trazer, ainda, elementos relevantes para o processo criminal que não sejam por print screen da tela do whatsapp.
Ante o exposto, acolho a preliminar de nulidade e, consequentemente, anulo o processo desde a decisão de pronúncia, com o desentranhamento dos prints das conversas de whatsapp, devendo o juízo de primeiro grau franquear acesso às provas a defesa de ambos os acusados e proferir nova decisão de acordo com a legislação pertinente e os precedentes desta Corte de Justiça.[...]"
No entanto, nas razões do regimental, o agravante não impugna o fundamento exposto na decisão recorrida, limitando-se a alegar que a defesa teve acesso a prova e não impugnou.
Contudo, a própria defesa sustenta que: "Equivoca-se o MPF ao afirmar que o conteúdo do aparelho celular estava acautelado em cartório, disponível para a defesa. A prova maior desta situação está materializada na decisão tomada pelo juízo da 2a Vara Criminal de Paranaguá, após ter tomado ciência da r. decisão aqui agravada. Consta: (...) A decisão evidencia que o material nunca esteve disponível às partes, sendo que meros prints de partes de conversas de whatsapp selecionadas pela autoridade policial foram usadas como elementos indicadores de potencial autoria."
Assim, verifico que os agravantes foram pronunciados com base em prints de conversa de whatsapp web , sem que a defesa tivesse acesso ao inteiro teor das mensagens ou relatório pericial da polícia judiciária sobre a veracidade das mensagens.
Ademais, a utilização de "prints" de mensagens, mesmo que realizados pela autoridade policial, viola a cadeia de custódia prevista nos artigos 158 e ss. do CPP e é prova ilícita de acordo com os precedentes desta Corte.
Desse modo, o juízo de primeiro grau utilizou prova ilícita (print de conversa de whatsapp ) e não permitiu que a defesa verifica-se a cadeia de custódia e, com isso, a veracidade desse elemento de informação.
Aliado a isso, verifico que o juízo e o Tribunal local afastaram a nulidade, pois entenderam que não haveria prejuízo diante das demais provas produzidas nos autos e aptas a pronunciar os agravantes. Contudo, do excerto transcrito, verifica-se que assiste razão ao agravado quando aduz a existência de violação do artigo 155 do CPP no v. acórdão quanto ao exame da inadmissibilidade dos elementos informativos da etapa policial e dos depoimentos indiretos como base exclusiva para manter a decisão de pronúncia.
Extrai-se das transcrições que os agentes que investigaram foram as testemunhas indiretas utilizadas para fundamentar a pronúncia, bem como a acusação dispensou as duas testemunhas que presenciaram o fato e que foram ouvidas apenas em sede policial.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É o voto.
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