STJ Ago24 - Ausência do MP em Audiência - Protagonismo do Juiz - Inquirição de Testemunha Fazendo as Vezes da Acusação ":Nulidade Absoluta - Ferimento ao Art. 212 do CPP"

 Publicado por Carlos Guilherme Pagiola


EMENTAAGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RAZÕES QUE NÃO INFIRMARAM O FUNDAMENTO DO DECISUM ATACADO. INOBSERVÂNCIA DO COMANDO LEGAL INSERTO NO ART. 932, III, DO CPC. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 182/STJ. ILEGALIDADE FLAGRANTE. AUSÊN CIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. INQUIRIÇÃO DIRETA (PELO MAGISTRADO) DA VÍTIMA E TESTEMUNHAS, ALÉM DO INTERROGATÓRIO DO AGRAVANTE. ALEGAÇÃO OPORTUNA E PREJUÍZO DEMONSTRADO. NULIDADE DOS ATOS JUDICIAIS PRATICADOS COM DETERMINAÇÃO DE DESENTRANHAMENTO DAS PROVAS OBTIDASNO ATO E RENOVAÇÃO DA AUDIÊNCIA. PARECER ACOLHIDO. Agravo regimental não conhecido. Habeas corpus concedido de ofício, a fim de declarar a nulidade dos atos judiciais praticados a partir da audiência de instrução com determinação de desentranhamento das provas colhidas na referida audiência e de todas as peças processuais que a elas façam referência, além da renovação do ato (art. 573 do CPP) com a presença do órgão acusatório e observância da ordem prevista na norma processual (art. 212 do CPP).

(STJ - AgRg no AREsp: 2405205 PA 2023/0233750-2, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 06/08/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/08/2024)

👉👉👉👉 Meu Whatsaap de Jurisprudências, Formulação de HC eREsp - https://chat.whatsapp.com/FlHlXjhZPVP30cY0elYa10

👉👉👉👉 ME SIGA INSTAGRAM @carlosguilhermepagiola.adv

NO VOTO:

RELATÓRIO Trata-se de agravo regimental interposto por J A F contra a decisão monocrática da Presidência desta Corte Superior que não conheceu do agravo em recurso especial ante a ausência de impugnação dos fundamentos da decisão de inadmissão na origem, quais sejam, Súmula 284/STF, Súmula 7/STJ e Súmula 83/STJ (fls. 255/256). Nas razões do agravo regimental, a defesa do agravante reproduziu trechos das razões do recurso especial (fls. 261/269).

O Ministério Público Federal se manifestou pelo não conhecimento do agravo regimental, porém com concessão de habeas corpus de ofício para anulação do feito (fls. 288/289). É o relatório.

VOTO O agravo regimental não comporta conhecimento. Em obediência ao princípio da dialeticidade, cabe ao agravante o ônus de demonstrar o desacerto da decisão agravada, mediante impugnação clara e específica dos fundamentos do decisum combatido. No caso, o agravo em recurso especial foi inadmitido em razão da ausência de impugnação dos fundamentos da decisão de inadmissão na origem, quais sejam, Súmula 284/STF, Súmula 7/STJ e Súmula 83/STJ (fls. 255/256). Caberia, então, ao agravante, nas razões do regimental, demonstrar que, no agravo em recurso especial, haveria ocorrido a efetiva impugnação dos fundamentos tidos por inatacados, o que não se verifica à luz da argumentação expendida no recurso. Com efeito, limitou-se a defesa do agravante a reproduzir trechos da petição de recurso especial, sem nada mencionar a cerca do fundamento utilizado na decisão ora agravada, que não conheceu do agravo por ausência de impugnação de seus termos. Assim, tenho que o agravante inobservou o disposto no art. 932, III, do CPC/2015, atraindo, ainda, o óbice da Súmula 182/STJ:

É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. MERA TRANSCRIÇÃO DAS MESMAS RAZÕES DO APELO NOBRE. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 182/STJ. RECURSO IMPROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. ATIPICIDADE FORMAL DA Documento eletrônico VDA42640103 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): SEBASTIÃO REIS JUNIOR Assinado em: 07/08/2024 16:47:11 Código de Controle do Documento: 78cc2d7f-eabb-45f1-b0c9-6b5c06a411f1 CONDUTA IMPUTADA. GESTÃO TEMERÁRIA. AUSÊNCIA DE DOLO. ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO TIPO PENAL PRÓPRIO. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. EFEITO EXTENSIVO. CORRÉUS NA MESMA SITUAÇÃO. INTIMAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO DO NÚCLEO DE PRATICA JURÍDICA. NULIDADE ABSOLUTA. 1. Ao agravante incumbe demonstrar o equívoco da decisão contra a qual se insurge, não bastando sua impugnação genérica, ou a simples repetição das mesmas razões do recurso especial. É indispensável, no recurso de agravo, que todos os óbices apontados sejam rebatidos, de maneira específica e suficientemente demonstrada. Incidência do art. 932, III, do CPC e, por analogia, da Súmula 182 do STJ. Precedentes. [...] (AgRg no AREsp n. 1.627.490/DF, Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, DJe 18/6/2021 - grifo nosso).

Ainda que o recurso seja inadmissível, diviso ilegalidade flagrante apta a justificar a concessão de habeas de ofício (art. 654, § 2º, do CPP), tal como sugerido pelo ilustre parecerista. Colhe-se dos autos que toda a instrução foi realizada numa única audiência, tendo o órgão acusatório deixado de comparecer ao ato, ocasião em que o Magistrado inquiriu diretamente a vítima, todas testemunhas arroladas e procedido ao interrogatório do agravante (fl. 46). Embora a defesa não tenha se insurgido, no ato da audiência, com a prática do ato sem a presença do órgão acusatório, verifica-se que suscitou a questão em sede de alegações finais, ou seja, no prazo preconizado no art. 571, II, do CPP, de modo que não há falar em preclusão. O prejuízo também é evidente, pois toda a prova coligida em sede judicial, inclusive a condenatória, foi produzida no ato, de modo que a inquirição direta pelo Magistrado, sem participação do órgão acusatório, acarretou violação do sistema acusatório vigente e da previsão contida no art. 212 do Código de Processo Penal. Nesse sentido, esta Corte já decidiu:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. AUSÊNCIA DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE. OCORRÊNCIA. PRECLUSÃO. AUSÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "A ausência do Ministério Público no ato judicial, com a consequente produção de provas pelo Magistrado, gera um desequilíbrio na estrutura paritária do processo e viola, em última análise, a sua formatação acusatória" (AgRg no HC n. 839.191/RS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 11/12/2023, DJe de 14/12/2023). 2. Conforme constou da decisão agravada, a defesa se insurgiu contra a sobredita eiva, a tempo e a modo (e-STJ fl. 585), o que afastou, por conseguinte, a Documento eletrônico VDA42640103 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): SEBASTIÃO REIS JUNIOR Assinado em: 07/08/2024 16:47:11 Código de Controle do Documento: 78cc2d7f-eabb-45f1-b0c9-6b5c06a411f1 incidência da preclusão à hipótese vertente, por se tratar de nulidade relativa. Com efeito, "o caso em análise revela contornos peculiares, pois, consoante os documentos ora juntados aos autos, toda a instrução processual foi conduzida pela Juíza de Direito, que ouviu a vítima, inquiriu as testemunhas da acusação e as arroladas pela defesa, sendo forçoso concluir que a Juíza de Direito fez as vezes do Promotor de Justiça e, mais do que permitir que as pessoas ouvidas contassem o que ocorreu, formulou perguntas, para além daquilo que pode ser admitido a título de esclarecimento ou complementação " (AgRg nos EDcl no HC n. 806.955/RS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 23/6/2023). 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.486.310/RS, Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 2/4/2024, DJe de 10/4/2024 - grifo nosso). PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. INCÊNDIO (ART. 250, § 1º, II, C/C O ART. 14, II, AMBOS DO CP). AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO REALIZADA SEM A PRESENÇA DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE DIFERENCIAÇÃO ENTRE O JULGADOR E O ÓRGÃO DE ACUSAÇÃO. PARECER MINISTERIAL FAVORÁVEL. 1. A ausência do Ministério Público no ato judicial, com a consequente produção de provas pelo Magistrado, gera um desequilíbrio na estrutura paritária do processo e viola, em última análise, a sua formatação acusatória. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 839.191/RS, de minha relatoria, Sexta Turma, DJe de 14/12/2023 - grifo nosso). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO CONSUMADO E TENTADO. FALSA IDENTIDADE. AUSÊNCIA DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. OITIVA DAS TESTEMUNHAS PELO MAGISTRADO. ATUAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO ÀS PARTES. VIOLAÇÃO DO ART. 212 DO CPP. PREJUÍZO CONCRETO DEMONSTRADO. NULIDADE DECLARADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O atual entendimento do STJ é de que a atuação do magistrado na produção probatória é de natureza complementar e não de substituição aos sujeitos processuais. Precedentes. 2. Na hipótese, o Magistrado, consignada a ausência do representante do Ministério Público, prosseguiu com a audiência e promoveu a oitiva de testemunhas e das vítimas, em substituição ao mister do Parquet, o que é contrário à orientação jurisprudencial predominante nesta Corte Superior. 3. A defesa se insurgiu contra a atuação judicial na própria audiência e a prova produzida embasou o édito condenatório, circunstâncias que justificam a declaração de nulidade do ato praticado. 4. Os precedentes do Supremo Tribunal Federal, trazidos à colação pelo Parquet nas razões deste regimental não se referem à hipótese de ausência do representante do Ministério Público à audiência de instrução, o que caracteriza a falta de similitude fática entre os julgados. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.348.111/RS, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/9/2023, DJe de 13/9/2023).

Assim, é o caso de declarar a nulidade dos atos judiciais praticados a partir da audiência de instrução e determinar ao Juízo processante que desentranhe dos autos as provas colhidas na referida audiência e todas as peças processuais que a elas façam referência, bem como que renove o ato (art. 573 do CPP) com a presença do órgão acusatório e observância da ordem prevista na norma processual (art. 212 do CPP) - Processo n. 0002424-40.2018.8.14.0124, da Vara Única de São Domingos do Araguaia/PA. Ante o exposto, não conheço do agravo regimental, mas, acolhendo o parecer, concedo habeas corpus de ofício, nos moldes acima explanados.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ Jun24 - Consunção Aplicada entre Receptação e Adulteração de Sinal de Identificador de Veículos - Exclusão da Condenação da Receptação

STJ Fev25 - Execução Penal - Prisão Domiciliar para Mãe Com Filho Menor de 12 Anos se Aplica para Presas Definitivas

STJ Set24 - Júri - MP Proibido de Usar Documentos da Vida Pregressa do Réu em Plenário - Uso Como Argumento de Autoridade :"Direito Penal do Autor - Ilegalidade Absoluta"