STJ Fev25 - Execução Penal - A Data Base para a Progressão do Regime Deve ser a Data da Última Prisão Ininterrupta :"Tema 1.006 do STJ"
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
DECISÃO
Trata-se de Habeas Corpus com pedido de liminar impetrado em favor de VITXXXXXXX contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO no julgamento do Agravo de Execução Penal n. 8000954-10.2024.8.24.0038/SC.
Consta dos autos que o paciente cumpre pena de 21 (vinte e um) anos e 12 (doze) dias de reclusão e de 1 ano de detenção. O Juízo da Execução decidiu por manter a data-base de 16.12.2021 para a progressão de regime por considerar que o apenado permanece em cumprimento contínuo de suas penas desde 9.7.2020, sem interrupção, e que a data-base de 9.7.2020 já havia sido utilizada para uma progressão anterior.
O Tribunal local, contudo, deu provimento ao Agravo em Execução Penal interposto pelo Ministério Público para estabelecer como marco legal para a data-base o efetivo último ingresso do apenado no sistema prisional, em 15.8.2023 (sem ementa).
Em suas razões, sustenta a impetrante a ocorrência de constrangimento ilegal, porquanto a decisão do TJSC contraria o Tema 1.006 do STJ, segundo o qual a data-base deve coincidir com o marco anterior à primeira progressão, por ser a última prisão e por inexistir falta grave ou novo crime no curso do cumprimento da pena.
Argumenta que o paciente tem cumprido pena de forma ininterrupta desde 8.7.2020 e que a regressão de regime prisional em virtude da unificação de penas não pode alterar a data-base. Requer, assim, liminarmente e no mérito, a retificação da data-base para 8.7.2020, data da última prisão do paciente. Liminar indeferida (fls. 92/93). Informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau (fls. 98/99).
Parecer do Ministério Público Federal pela concessão da ordem de ofício (fls. 103/107).
É o relatório. Decido.
Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal - STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça - STJ.
Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável verificar a existência de flagrante constrangimento ilegal a justificar a concessão da ordem de ofício. O cerne da controvérsia reside na definição da data-base para a concessão de novos benefícios ao paciente, após a unificação das penas e a regressão ao regime fechado.
Sobre os dados concretos da execução, infere-se que o paciente progrediu ao regime semiaberto em 16/12/2021, tendo sido considerada a data-base de 09/07/2020 para a declaração da benesse. Posteriormente, obteve livramento condicional em 23/01/2022.
Em razão de condenação definitiva superveniente por crime praticado antes do livramento, em 08/07/2020, foi preso e recolhido ao regime fechado em 15/08/2023 (e-STJ fl. 8).
O Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Joinville/SC, ao realizar a soma das penas, fixou a data-base em 15/08/2023 (e-STJ fl. 41), mas, posteriormente, em nova decisão, alterou a data-base para 16/12/2021 (e-STJ fl. 4).
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ao julgar o Agravo em Execução Penal interposto pelo Ministério Público, reformou a decisão do Juízo da Vara de Execuções Penais para fixar a data-base em 15/08/2023, data em que o paciente foi preso, no regime fechado, para começar a cumprir a pena mais recente por condenação definitiva oriunda da Ação Penal 5024867-14.2020.8.24.0038. (e-STJ fl. 16).
Com efeito, como bem asseverou o Parquet Federal em sua bem elaborada peça opinativa, o julgamento pelo Tribunal de Justiça está em evidente confronto o Tema Repetitivo n. 1006, decidido, pela Terceira Seção no REsp 1753512/PR, cuja ementa é a seguinte:
RECURSO ESPECIAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. EXECUÇÃO PENAL. UNIFICAÇÃO DE PENAS. SUPERVENIÊNCIA DO TRÂNSITO EM JULGADO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. TERMO A QUO PARA CONCESSÃO DE NOVOS BENEFÍCIOS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA ALTERAÇÃO DA DATA-BASE. ACÓRDÃO MANTIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A superveniência de nova condenação no curso da execução penal enseja a unificação das reprimendas impostas ao reeducando. Caso o quantum obtido após o somatório torne incabível o regime atual, está o condenado sujeito a regressão a regime de cumprimento de pena mais gravoso, consoante inteligência dos arts. 111, parágrafo único, e 118, II, da Lei de Execução Penal. 2. A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal. Portanto, a desconsideração do período de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração disciplinar, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta disciplinar grave, configura excesso de execução. 3. Caso o crime cometido no curso da execução tenha sido registrado como infração disciplinar, seus efeitos já repercutiram no bojo do cumprimento da pena, pois, segundo a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, a prática de falta grave interrompe a data-base para concessão de novos benefícios executórios, à exceção do livramento condicional, da comutação de penas e do indulto. Portanto, a superveniência do trânsito em julgado da sentença condenatória não poderia servir de parâmetro para análise do mérito do apenado, sob pena de flagrante bis in idem. 4. O delito praticado antes do início da execução da pena não constitui parâmetro idôneo de avaliação do mérito do apenado, porquanto evento anterior ao início do resgate das reprimendas impostas não desmerece hodiernamente o comportamento do sentenciado. As condenações por fatos pretéritos não se prestam a macular a avaliação do comportamento do sentenciado, visto que estranhas ao processo de resgate da pena. 5. Recurso especial representativo da controvérsia não provido, assentando-se a seguinte tese: a unificação de penas não enseja a alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios. (ProAfR no REsp n. 1.753.512/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 18/12/2018, DJe de 11/3/2019.) grifo nosso
Na hipótese dos autos, infere-se que a alteração da data-base para 15/08/2023 decorreu da unificação das penas e da regressão do paciente ao regime fechado em virtude de condenação por crime praticado anteriormente ao início da execução da pena, e não da prática de novo crime ou falta grave.
Ademais, o próprio acórdão do TJSC, ora impugnado, reconhece que o tempo em que o apenado esteve solto em livramento condicional deve ser computado como pena cumprida (e-STJ fl. 16).
Segundo entendimento firmado nesta Corte no julgamento do referido Tema Repetitivo n. 1.006, tratando-se de unificação de penas ou de crime único, deve ser considerada como data-base para obtenção de novos benefícios no curso da execução a data da última prisão ininterrupta, ou da última infração disciplinar, não podendo haver a alteração da contagem do prazo para concessão do benefício por ter sobrevindo condenação definitiva do apenado por fato anterior ou posterior ao início da execução penal.
Nesse sentido:
[...] 1. A Terceira Seção desta Corte Superior, ao apreciar o REsp n. 1.557.461/SC, Rel. Ministro ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, julgado em 02/02/2018, concluiu que "a desconsideração do período de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração disciplinar, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta disciplinar grave, configura excesso de execução". 2. O entendimento exposto no aresto impugnado não diverge da orientação desta Corte Superior consolidada no sentido de que a data da última prisão ou da última infração disciplinar grave é o marco interruptivo para a concessão de benefícios. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 760.156/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe de 20/4/2023) [...] 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, "o entendimento exposto no aresto impugnado não diverge da orientação desta Corte Superior consolidada no sentido de que a data da última prisão ou da última infração disciplinar grave é o marco interruptivo para a concessão de benefícios" (AgRg no HC n. 760.156/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 20/4/2023). 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp n. 2.004.660/GO, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, DJe de 17/8/2023) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. DATA-BASE. DATA DA ÚLTIMA PRISÃO . AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Segundo entendimento desta Corte Superior, firmado no julgamento do Tema Repetitivo n. 1 .006, tratando-se de unificação de penas ou de crime único, deve ser considerada como data-base para obtenção de novos benefícios no curso da execução a data da última prisão ininterrupta. 2. A data da prisão preventiva não pode ser considerada como data-base para obtenção de benefícios durante a execução da reprimenda, caso o reeducando haja sido favorecido com a liberdade provisória no curso da ação penal, sob pena de ser tido como pena efetivamente cumprida o período em que ele permaneceu solto. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC: 869034 MS 2023/0412028-8, Relator.: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 19/08/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/08/2024) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 111, PARÁGRAFO ÚNICO, E 118, II, AMBOS DA LEP. SUPERVENIÊNCIA DE NOVA CONDENAÇÃO. PLEITO DE RECONHECIMENTO DE NOVA DATA-BASE PARA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS ATINENTES À EXECUÇÃO. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL A QUO EM CONSONÂNCIA COM ENTENDIMENTO DA TERCEIRA SEÇÃO DESTA CORTE. DATA DA ÚLTIMA PRISÃO. 1. O Tribunal de origem dispôs que, no que se refere à data do reinício da contagem do prazo para a concessão de novos benefícios, o Supremo Tribunal Federal vem decidindo que a data-base para a contagem do novo período aquisitivo do direito à progressão do regime prisional ou à concessão de outros benefícios, é a data da última prisão. [...] Desta forma, não há que se falar em alteração da data-base, visto que a decisão da autoridade judiciária determinou como marco inicial para progressão de regime ou concessão de novos benefícios a data da última prisão do reeducando, conforme entendimento dos Tribunais Superiores. 2. Conforme delineado pelo Ministério Público Federal no Parecer de fls. 850/851, o atual entendimento dessa Colenda Corte Superior é que: Na linha da orientação jurisprudencial desta Corte, sobrevindo nova condenação no curso da execução, deverá o Juízo da execução realizar a unificação das penas impostas ao sentenciado, no entanto, não poderá, diante da ausência de previsão legal, considerar o trânsito em julgado dessa nova condenação - ou como no caso dos presentes autos, a data da última sentença penal condenatória - como marco inicial para novos benefícios, devendo, em casos como o presente, observar, como estabelecido pela Terceira Seção (REsp n. 1.557.461/SC), a data da última prisão ou da última falta disciplinar. 4. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, com efeitos infringentes, para manter a unificação das penas, determinando ao Juízo da execução que promova novo cálculo de pena no qual deve considerar como termo inicial para novos benefícios a data da última prisão ou da última falta disciplinar (EDcl no HC 379.829/ES, Rel. Min. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Sexta Turma, julg.04/08/2020, DJe 12/08/2020); A Terceira Seção desta Corte, por ocasião do julgamento do REsp n. 1.557.461/SC, Rel. Ministro ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, DJe 15/3/2018, alterou seu entendimento para estabelecer como marco inicial para a concessão de benefícios, após a unificação das penas, a data da última prisão do apenado ou a data da última infração disciplinar - (AgInt no REsp 1836028/PR, Rel. Min. JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julg. 17/12/2019, DJe 19/12/2019) 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 1.952.283/MT, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe de 21/3/2022.) EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. NOVA CONDENAÇÃO NO CURSO DA EXECUÇÃO. UNIFICAÇÃO DAS PENAS. DATA-BASE PARA FUTUROS BENEFÍCIOS. NOVA DIRETRIZ JURISPRUDENCIAL. DATA DA ÚLTIMA PRISÃO OU FALTA GRAVE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos moldes da jurisprudência desta Corte, "o julgamento monocrático encontra previsão no art. 253, parágrafo único, inciso II, alínea b, do RISTJ, que permite ao relator negar provimento ao recurso quando a pretensão recursal esbarrar em súmula do STJ ou do STF, ou ainda, em jurisprudência dominante acerca do tema, inexistindo, portanto, ofensa ao princípio da colegialidade" (AgRg no AREsp n. 1.249.385/ES, relator Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 4/2/2019). 2. A jurisprudência sedimentada neste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a prática de falta grave ou crime no curso da execução penal, somente pode ensejar a alteração da data-base para a progressão de regime, não surtindo qualquer efeito no que tange ao requisito objetivo para o livramento condicional, comutação e indulto, nos termos dos enunciados n. 441, 534 e 535 deste STJ. 3. "Quanto à progressão de regime prisional, considera-se data-base o dia da última prisão, desde que não tenha o sentenciado cometido falta de natureza grave, após o encarceramento, que justifique a interrupção do prazo, nos termos do enunciado n. 534 da Súmula/STJ ('A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração')" (AgRg no HC n. 441.553/ES, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 8/4/2019). 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 675.459/RJ, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 8/2/2022, DJe de 14/2/2022.)
Ante o exposto, com fundamento no art. 34, inciso XX, do Regimento Interno do STJ, não conheço da presente impetração. Contudo, de ofício, concedo a ordem de habeas corpus para restabelecer a data-base do paciente para 9.7.2020 (nove de julho de dois mil e vinte). Publique-se. Intimem-se.
Relator
JOEL ILAN PACIORNIK
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