STJ Jun25 - Crime Contra a Relação de Consumo - Venda de Suplementos Impróprios para o Uso - Ausência de Perícias - Violação ao Art. 158 do CPP - Ausência de Materialidade
EMENTA AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. ART. 7º, INCISO IX, DA LEI N. 8.137/1990. NECESSIDADE DE PERÍCIA. AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A materialidade do crime do art. 7º, inciso IX, da Lei n. 8.137/1190 demanda a realização de exame pericial, a fim de atestar se as mercadorias são impróprias para o consumo, inclusive em relação aos produtos com prazo de validade vencido. Precedentes. 2. No caso dos autos, não foi realizada perícia nos produtos apreendidos, assim sendo a inadequação para o consumo não pode ser presumida em razão da violação às datas de vencimento dos produtos. 3. Agravo regimental desprovido.
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RESUMO DO VOTO:
(...)
O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO (Relator): A despeito dos argumentos apresentados, o recurso não apresenta elementos capazes de desconstituir as premissas que embasaram a decisão agravada, que merece ser mantida por seus próprios fundamentos.
O recurso merece prosperar, razão pela qual reconsidero a decisão agravada para conhecer do recurso especial. Passo à sua análise. A questão jurídica deduzida no recurso especial diz respeito à imprescindibilidade do exame pericial para a configuração do delito descrito no art. 7°, IX, da Lei n. 8.137/1990. O acórdão atacado assim julgou a controvérsia (e-STJ fls. 469-470):
Extrai-se da prova documental e testemunhal trazida aos autos, regularmente submetida ao contraditório, de que os fiscais da Vigilância Sanitária do Estado se dirigiram a empresa identificada na denúncia, de propriedade do réu, para apurar denúncia anônima de existência de fraude/adulteração nas informações de data de validade de produtos de suplementos alimentares. Chegando ao local e após as averiguações de praxe, os fiscais constaram a veracidade da fraude e lograram localizar: etiquetas com datas de validade rasgadas, retiradas de uma caixa; produtos com a adulteração das informações das datas de validade; etiquetas com impressão de novas datas; produtos com datas próximas do vencimento; potes ou embalagens de produtos com raspagem com rasura das informações de validade dos suplementos alimentares e com inserção data de validade até 31/08/2015 e; uma máquina de impressão funcionando, sem a presença de operador e produtos para datação, com registro de etiqueta para 31/08/2015 e nas proximidades havia alguns produtos com data de vencimento próximo (fls. 14 /15, 16/18, 114/115 93/96, 247, 248/248v). A prova revelou que durante a fiscalização, os responsáveis ou prepostos da empresa não apresentaram os documentos necessários para que os fiscais pudessem examinar os dados de lotes, validade e rastreabilidade dos produtos (16/18/ 93/95, 247 e 248/248v). Os depoimentos dos fiscais da Secretaria de Vigilância Sanitária, foram enfáticos em elucidar que no interior da empresa transcontinental ocorriam adulterações nas datas de validades das mercadorias. ( fls. 247 e 248). O acusado Deidson Hermann da Silveira, ao ser ouvido em juízo (fls. 249/249 v), negou a prática do crime, afirmando que atua no comércio de suplementos há aproximadamente 20 anos e que nunca teve problemas com fiscalização da Vigilância Sanitária e nem com clientes, porém sua versão se encontra isolada e não há ressonância no feito. Documento eletrônico VDA48137142 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 12/06/2025 12:03:57 Código de Controle do Documento: 98a3c955-b7de-4148-98ff-167791524233 Destarte, estando comprovadas autoria e materialidade delitiva, além do dolo em realizar as adulterações dos prazos de validade, posto que, conforme consta no depoimento prestado às (Is. 93/96 pelo Fiscal Frederico Felipe Costa Tebas de Freitas - ratificadas em Juízo -, ao indagar a funcionária Waléria sobre a origens das informações, a mesma informou que era o apelante quem passava as informações de validade e lote contidas na folha encontrada sobre a máquina, inviáveis a absolvição ou a desclassificação requeridas. A sentença de origem assim restou fundamentada (e-STJ fls. 352-355): Realmente a jurisprudência do STJ citada nas alegações finais, se aplica ao artigo 272 do Código Penal, em razão de tratar-se de delito que deixa vestígios e a necessidade da demonstração de que os alimentos foram falsificados, corrompidos, adulterados ou alteradas as substâncias, tornandoos nocivos à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo. Contudo, em decorrência das particularidades do caso, a forma como a questão preliminar foi abordada pela defesa confunde-se com o mérito e como se verá, não há a necessidade da prova técnica pericial para atestar se o produto alimentício se prestava ou não ao consumo. Portanto, há prova da materialidade da conduta imputada ao réu e indícios da autoria a justificar a ação penal, não sendo o caso de se cogitar de ausência de justa causa (fls. 14/15, 20, 78/79, 130/144). No mais, a prova pericial foi realizada e o laudo pericial foi contestado pela defesa" e será examinado no mérito. (...) Chama a atenção o fato dos fiscais terem interditado e lacrado algumas dependências da empresa e agendado data para a realização posterior de perícia. Para impedir a realização da perícia agendada, o réu criou toda ordem de dificuldades/resistência para o desenvolvimento dos trabalhos dos policiais, peritos e fiscais. O denunciado concedeu férias coletivas para os funcionários da empresa e, não compareceu ao estabelecimento na data combinada com os agentes públicos para a realização da perícia. Estas circunstâncias de dificuldades criadas pelo denunciado, levou a autoridade policial a solicitar ordem judicial para ingresso no local, sendo deferida o mandado de busca e apreensão (fls. 14/15, 16/18, 93/96, 76/77, 247 e autos n° 00144559-84.20145.8.08.0012 - em apenso). Com a ordem judicial em mãos, os policias, peritos e fiscais ingressaram no local e apreenderam os materiais, os quais foram levados a exame pericial e este atestou a existência de vestígios de impressão anterior de data de validade que havia sido apagada ou parcialmente apagada, onde se podia observar resquícios de números diversos, o que levou a mudança da data de validade dos produtos apreendidos (fls. 130/144). Observo que a conclusão do laudo técnico foi positiva para adulteração das datas de vencimentos dos produtos levados a exame (fls. 130/144) Portanto, não há dúvida a respeito da adulteração das datas de validades dos produtos e a defesa não se insurge a respeito do evento, apenas desenvolveu a tese de transferência de responsabilidade a terceiros e alega Documento eletrônico VDA48137142 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 12/06/2025 12:03:57 Código de Controle do Documento: 98a3c955-b7de-4148-98ff-167791524233 que os suplementos alimentares com datas de validade alteradas não oferecia risco ao consumo e bate na tecla de ausência de materialidade.
Verifica-se que não há dúvidas acerca da adulteração do prazo de validade dos produtos apreendidos, posto que a pericia realizada constatou a violação das etiquetas, entretanto, não restou periciado os produtos em sim, não tendo nenhuma constatação acerca da sua impropriedade para o consumo. Isso porque a inadequação para o consumo não pode ser presumida em razão da violação às datas de vencimento dos produtos. Assim, constata-se que a jurisprudência mais atual deste Superior Tribunal de Justiça segue em sentido diverso do que restou decidido pela origem, inclusive nas hipóteses de produto com prazo de validade vencido: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. ALIMENTOS IMPRÓPRIOS PARA O CONSUMO. PRAZO DE VALIDADE VENCIDO. PERÍCIA TÉCNICA PARA AFERIR O ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO. NECESSIDADE. ART. 158 DO CPP. AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. [...] 2. "Da leitura do artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990, percebe-se que se trata de delito contra as relações de consumo não transeunte, que deixa vestígios materiais, sendo indispensável, portanto, a realização de perícia para a sua comprovação, nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal" (RHC 49.221/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJe 28/4/2015). 3. "Inexistente prova pericial, produzida diretamente sobre os produtos alimentícios apreendidos, falta justa causa para a persecução penal, sendo insuficiente concluir pela impropriedade para o consumo exclusivamente em virtude da ausência de informações obrigatórias na rotulagem do produto e /ou em decorrência do prazo de sua validade estar vencido" (RHC 69.692/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, DJe 13/6/2017). 4. No caso em exame, verifica-se, conforme descrito na denúncia, que os ora pacientes "tinham em depósito para venda aditivos e matérias-primas para fabricação de linguiças com prazo de validade vencido". 5. Na hipótese de delito em que deixa vestígios, revela-se indispensável a realização de exame pericial para atestar a impropriedade da mercadoria para o consumo, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal. Precedentes. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para determinar o trancamento da Ação Penal n. 0004177-04.2015.8.24.0045. (HC 412.180/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 19/12/2017; grifou-se.) Documento eletrônico VDA48137142 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 12/06/2025 12:03:57 Código de Controle do Documento: 98a3c955-b7de-4148-98ff-167791524233 RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. ART. 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO IX DA LEI N. 8.137/90. ALIMENTOS IMPRÓPRIOS PARA O CONSUMO. MERCADORIA COM PRAZO DE VALIDADE VENCIDA. AUSÊNCIA DE PERÍCIA TÉCNICA. MATERIALIDADE DELITIVA NÃO DEMONSTRADA. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. RECURSO PROVIDO. [...] 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que a conduta tipificada no art. 7º, parágrafo único, inciso IX, da Lei 8.137/90 - expor à venda produtos impróprios para o consumo - deixa vestígios, razão pela qual a perícia é indispensável para a demonstração da materialidade delitiva, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal. Precedentes. 3. A realização de mero laudo de constatação não é suficiente para atestar que a mercadoria é efetivamente imprópria para o consumo, sendo imprescindível a realização de perícia técnica. Precedente. 4. Recurso em habeas corpus ao qual se dá provimento para determinar o trancamento da ação penal por falta de justa causa. (RHC 91.502/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 01/02/2018; grifou-se.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 7º, INCISO IX, DA LEI 8.137/1990. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PRODUTOS IMPRÓPRIOS PARA CONSUMO. EXPIRAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE. PROVA PERICIAL. INEXISTÊNCIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 158 DO CPP. ORDEM CONCEDIDA. [...] 2. A jurisprudência da Sexta Turma é assente em considerar que a caracterização do crime previsto no art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/1990 depende de realização de laudo pericial atestando a impropriedade dos produtos em questão, no intuito de comprovar a inequívoca nocividade para o consumo, mesmo se expirado o prazo de validade do produto. 3. "Conquanto parte da doutrina e da jurisprudência entendam que o delito previsto no art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/1990, crime formal, de perigo abstrato, seja norma penal em branco, cujo elemento normativo do tipo "impróprio para consumo" deve ser complementado pelo disposto no art. 18, § 6º, do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que há necessidade de realização de exame pericial nos produtos pretensamente impróprios, a fim de que seja comprovada a sua real nocividade para consumo humano, sob pena de inaceitável responsabilidade penal objetiva" (RHC 69.692/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 6/6/2017, DJe 13/6/2017). 4. Ordem concedida para restabelecer a decisão de primeiro grau que rejeitou a denúncia. (HC 388.374/SC, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 01/12/2017; grifou-se.) Documento eletrônico VDA48137142 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 12/06/2025 12:03:57 Código de Controle do Documento: 98a3c955-b7de-4148-98ff-167791524233 RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIMES CONTRA RELAÇÃO DE CONSUMO. ABATEDOURO CLANDESTINO. ART. 7°, IX, DA LEI N. 8.137 /1990. PRODUTO NOCIVO À SAÚDE. IMPRESCINDIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA IMPROPRIEDADE POR EXAME PERICIAL. INÉRCIA ESTATAL. RECURSO PROVIDO. 1. Para a configuração do tipo penal descrito no art. 7°, IX, da Lei n. 8.137 /1990, é imprescindível a demonstração inequívoca da impropriedade do produto. 2. A realização do exame pericial somente é obrigatória nas infrações que deixam vestígios ou quando, sendo possível sua realização, esta não ocorreu por inércia dos órgãos de persecução penal. 3. Era viável, à época, por ocasião da vistoria realizada por agente do Conselho Regional de Medicina Veterinária, a apreensão das codornas abatidas destinadas à comercialização e sua submissão à perícia, a fim de comprovar a inadequação da mercadoria ao consumo. Não bastava a mera presunção de que a impropriedade do produto decorria do abate clandestino e da ausência de identificação do produto e do serviço de inspeção federal. 4. Recurso especial provido. (REsp 1575406/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 31/08/2017; grifou-se.)
Portanto, em razão de se tratar de delito que deixa vestígios, é indispensável a realização de perícia para a sua comprovação, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal, in verbis: Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Sobre a matéria posta em discussão, Guilherme de Souza Nucci assevera que, "se o crime deixa vestígios, é indispensável o exame de corpo de delito (art. 158, CPP), não podendo supri-lo a prova testemunhal. Esta somente será admitida, em lugar do exame, caso os vestígios tenham desaparecido, conforme preceitua o art. 167 do Código de Processo Penal." (Código Penal comentado. 9. ed., RT, 2009, p. 729). Assim, considero que só pode ser reconhecida a prática do crime em comento mediante a realização de exame pericial, tendo em vista que, por ser infração que deixa vestígio, é imprescindível a realização de exame de corpo de delito direto, por expressa imposição legal. Somente poderá ser substituído o laudo pericial por outros meios de prova se o delito não deixar vestígios, se estes tiverem desaparecido ou, ainda, se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo. No caso dos autos os produtos foram apreendidos e a perícia realizada não analisou os produtos em si, mas sim as violações às etiquetas com as datas de validade. Documento eletrônico VDA48137142 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 12/06/2025 12:03:57 Código de Controle do Documento: 98a3c955-b7de-4148-98ff-167791524233 Dessa forma, ausente a justa causa para o processo criminal em tela, porquanto inexistente a prova da materialidade delitiva, impõe-se a absolvição do recorrente. À vista do exposto, conheço do agravo para conhecer do recurso especial e, por reconhecer a violação do art. 158 do Código de Processo Penal, dou-lhe provimento para absolver o recorrente.
Acrescento que, ao contrário do defendido pelo recorrente, a inadequação para o consumo não pode ser presumida em razão da violação às datas de vencimento dos produtos. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental. É como voto. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Relator
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