STJ Jul25 - Execução Penal - Remissão de Pena pelo Enem - Caso Hilário Frasson (interno que já tinha diploma superior) - Remissão de 100 dias da Pena Deferida - Ferimento ao do art. 126 da LEP e Recomendação n. 44/2013 do CNJ

 Carlos Guilherme Pagiola



DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, sem pedido de liminar, impetrado em benefício de HILARIO ANTONIO FIOROT FRASSON, impugnando acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, em julgamento do HC n. 5003848-37.2025.8.08.0000.

Consta dos autos que o Juiz das Execuções Criminais indeferiu o pedido de remição da pena por aprovação no Enem/2019, sob o fundamento de que o executado já possui curso superior (e-STJ, fls. 22/26).

Contra a decisão, a defesa impetrou habeas corpus, perante a Corte de origem, o qual não conheceu da ordem. Assim, impetrado writ perante este C. Tribunal, determinei a realização de novo julgamento, a fim de que a Primeira Câmara Criminal apreciasse a existência de eventual constrangimento ilegal perpetrado em desfavor do paciente.

E desse modo foi feito, conforme seguinte ementa (e-STJ, fl. 16):

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. SUBSTITUTIVO DE AGRAVO DE EXECUÇÃO. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. PEDIDO NÃO CONHECIDO.1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em recentes decisões, não admitem mais a utilização do habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, como o agravo de execução neste caso, salvo em situações excepcionais, o que aqui não se constata, eis que inexiste manifesta ilegalidade na decisão proferida, uma vez que não se verifica a aquisição de novos conhecimentos quando o reeducando já ingressou no sistema prisional com diploma de ensino superior e obtém aprovação no ENEM. 2. Pedido não conhecido.

Nesta‎ ‎impetração, ‎ ‎a‎ ‎defesa‎ ‎aduz que o paciente foi erroneamente talhado da fruição de direito consagrado, qual seja, o direito à remição de penal, por aprovação no ENEM, mesmo já possuindo curso superior.

Sustenta que inúmeras são as decisões colegiadas deste STJ no sentido da concessão da benesse da remição aos reeducados aprovados no ENEM, mesmo eles já possuindo curso superior à época.

Alega, no mais, que o reeducando, ao utilizar-se de Habeas Corpus no momento da impetração junto ao TJES, não busca burlar o sistema recursal, mas, sim, vale-se do instrumento constitucional como última alternativa possível, para afastar ilegalidade sofrida por força de r. Decisão Judicial que lhe causa indevido prejuízo. E. Colegiado do TJES sequer analisou os argumento do reeducando apresentado via Habeas Corpus, privilegiando a forma.

Diante‎ ‎disso,‎ ‎requer seja garantido ao paciente o período de remição de pena, correspondente à aprovação no ENEM/2019.

É‎ ‎o‎ ‎relatório. Decido.

As disposições previstas nos arts. 64, III, e 202 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça não afastam do Relator a faculdade de decidir liminarmente, em sede de habeas corpus e de recurso em habeas corpus, a pretensão que se conforma com súmula ou a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores, ou a contraria (AgRg no HC n. 513.993/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/7/2019; AgRg no HC n. 475.293/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 27/11/2018, DJe 3/12/2018; AgRg no HC n. 499.838/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 11/4/2019, DJe 22/4/2019; AgRg no HC n. 426.703/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 18/10/2018, DJe 23/10/2018; e AgRg no RHC n. 37.622/RN, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 6/6/2013, DJe 14/6/2013).

Nesse diapasão, uma vez verificado que as matérias trazidas a debate por meio do habeas corpus constituem objeto de jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal, não há nenhum óbice a que o Relator conceda a ordem liminarmente, sobretudo ante a evidência de manifesto e grave constrangimento ilegal a que estava sendo submetido o paciente, pois a concessão liminar da ordem de habeas corpus apenas consagra a exigência de racionalização do processo decisório e de efetivação do próprio princípio constitucional da razoável duração do processo previsto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, o qual foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela EC n. 45/2004 com status de princípio fundamental (AgRg no HC n. 268.099/SP, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 2/5/2013, DJe 13/5/2013).

Na verdade, a ciência posterior do Parquet, longe de suplantar sua prerrogativa institucional, homenageia o princípio da celeridade processual e inviabiliza a tramitação de ações cujo desfecho, em princípio, já é conhecido ( EDcl no AgRg no HC n. 324.401/SP, Relator Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, julgado em 2/2/2016, DJe 23/2/2016).

Em suma, para conferir maior celeridade aos habeas corpus e garantir a efetividade das decisões judiciais que versam sobre o direito de locomoção, bem como por se tratar de medida necessária para assegurar a viabilidade dos trabalhos das Turmas que compõem a Terceira Seção, a jurisprudência desta Corte admite o julgamento monocrático do writ antes da ouvida do Parquet em casos de jurisprudência pacífica (AgRg no HC n. 514.048/RS, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 6/8/2019, DJe 13/8/2019).

No que concerne ao conhecimento da impetração, o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.

Esse entendimento objetivou preservar a utilidade e a eficácia do mandamus, que é o instrumento constitucional mais importante de proteção à liberdade individual do cidadão ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantindo a celeridade que o seu julgamento requer. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados, exemplificativos dessa nova orientação das Cortes Superiores do País: HC n. 320.818/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 21/5/2015, DJe 27/5/2015; e STF, HC n. 113.890/SC, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, julg. em 3/12/2013, DJ 28/2/2014.

Assim, de início, incabível o presente habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Todavia, em homenagem ao princípio da ampla defesa, passa-se ao exame da insurgência para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.

Remição da pena por aprovação no Enem/2019, para executado que já possuía diploma de nível superior antes de iniciar o cumprimento da pena. O Tribunal manteve o indeferimento do benefício, sob os seguintes fundamentos (e-STJ, fls. 19/20):

A presente controvérsia diz respeito à possibilidade de remição da pena, com fundamento na aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, em favor de apenado que já possuía diploma de curso superior, antes de seu ingresso no sistema prisional. A finalidade da remição pelo estudo transcende a mera redução do tempo de reclusão, tendo por objetivo principal fomentar a disciplina, o esforço pessoal e a ressocialização do sentenciado. O Conselho Nacional de Justiça, inicialmente por meio da Recomendação n. 44/2013, posteriormente substituída pela Resolução n. 391/2021, previu a possibilidade de reconhecimento da remição de pena a pessoas privadas de liberdade que, mediante estudo autodidata, obtiverem aprovação em exames destinados à certificação dos ensinos fundamental ou médio, como o ENCCEJA e o ENEM. O Superior Tribunal de Justiça, em julgado recente, entendeu pela impossibilidade da concessão do benefício, por não observar a aquisição de conhecimento educacional que justifique o reconhecimento da remição, sob pena de desvirtuamento da finalidade normativa que orienta a concessão do benefício. Vejamos: [...] Esse também o entendimento já exarado por esta Corte: [...] Assim, não verifico a existência de flagrante ilegalidade, ou violação ao ordenamento jurídico, que justifique a concessão da ordem de ofício, haja vista os fundamentos acima externados. Ante o exposto e na esteira do parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, não conheço do habeas corpus, haja vista a inadequação da via eleita.

O respeitável voto está divergente do entendimento desta corte. A norma inserta no art. 126 da Lei de Execução Penal visa, essencialmente, à ressocialização do sentenciado, por meio do incentivo ao estudo e ao trabalho, atividades que agregam valores necessários à sua melhor reintegração na sociedade.

Nesse contexto, entendo que deve ser dada uma interpretação mais ampla do art. 126 da Lei de Execução Penal, com a adoção da Recomendação n. 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça, atendendo aos princípios que norteiam a Lei de Execução Penal.

O art. 188 da respectiva Exposição de Motivos assevera que os trabalhos realizados "sintetizam a esperança e os esforços voltados para a causa universal do aprimoramento da pessoa humana e do progresso espiritual da comunidade".

Conforme entendimento pacífico deste C. Tribunal, o fato de o reeducando já possuir nível fundamental, médio ou superior antes do cumprimento da reprimenda não o impede de remir o quantum de pena por sua aprovação no Encceja / ENEM, pois, conforme o art. 126 da LEP e Recomendação n. 44/2013 do CNJ, tal certificação configura aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena, beneficiando os apenados que estudam por conta própria em ambiente carcerário, o que exige, de certa forma, mais esforço.

A conclusão em ensino médio regular anterior o impede apenas de receber o acréscimo de 1/3, previsto no art. 126, § 5º, da LEP:

RECURSO ESPECIAL MINISTERIAL. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELO ESTUDO POR CONTA PRÓPRIA EM RAZÃO DA APROVAÇÃO NO ENEM. RECLUSO COM PRÉVIO DIPLOMA DE CURSO SUPERIOR. IRRELEVÂNCIA. NORMAS EXECUTÓRIAS RELACIONADAS À REMIÇÃO PELO ESTUDO QUE DEVEM SER INTERPRETADAS FAVORAVELMENTE AO APENADO. INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA IN BONAM PARTEM. AUSÊNCIA DE CRÉDITO PERANTE A JUSTIÇA. EFETIVA APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO LEGAL À CONCESSÃO DO DIREITO EXECUTÓRIO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. Como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma inserta no art. 126 da LEP, segundo jurisprudência desta Corte, é possível hipóteses de abreviação da reprimenda em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal. 2. A Resolução CNJ n. 391/2021 prevê que faz jus à remição o apenado que, embora não esteja vinculado a atividades regulares de ensino, realiza estudos por conta própria e obtém aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental ou médio. Quanto à abrangência dessa hipótese, a Terceira Seção desta Corte Superior de Justiça, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial 1.979.591/SP decidiu, à unanimidade, que é possível a remição da pena por aprovação no ENEM ainda que o reeducando já tenha concluído o ensino médio anteriormente ao início do resgate da reprimenda. 3. No caso, a tese ministerial no sentido de ser incabível a concessão da remição pela aprovação no ENAM em razão de o apenado ser portador de prévio diploma de nível superior não merece acolhimento. De fato, as normas da execução penal, notadamente aquela relacionada à remição pelos estudos, deve ser interpretada de modo mais favorável ao réu, especialmente em razão de inexistir, na regra contida no art. 126 da LEP, restrição à concessão do referido direito àqueles que já tenham concluído o ensino médio ou superior. É esse caminho interpretativo que o Superior Tribunal de Justiça tem adotado nas controvérsias relacionadas ao tema, porquanto vem considerando devidas benesses executórias que, apesar de não terem expressa previsão legal, prestigiam a ressocialização do recluso, como na espécie. Não se trata, ademais, de se conferir crédito contra a justiça, porquanto a remição não é concedida pelo simples fato de o apenado já ter formação superior, mas, sim, por ele ter obtido êxito na aprovação do Exame Nacional do Ensino Médio por meio de conhecimentos por ele adquiridos. 4. Em julgados recentes, a Quinta Turma do STJ tem considerado válida a concessão do mencionado direito executório ao condenado que já concluiu o ensino superior: AgRg no HC n. 790.202/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 4/3/2024, DJe de 11/3/2024; AgRg nos EDcl no HC n. 746.292/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 26/2/2024, DJe de 29/2/2024. 5. Recurso especial ministerial não provido. (REsp n. 2.156.059/MS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 5/11/2024, DJe de 13/11/2024.) PROCESSO PENAL. PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. REMIÇÃO DE PENA. APROVAÇÃO NO ENCCEJA APÓS CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA BENESSE. DIREITO À REMIÇÃO DE 20 DIAS DE PENA POR MATÉRIA EM QUE O EXECUTADO FOI APROVADO. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp n. 1.979.591/SP, fixou o entendimento de que é possível a remição da pena, mesmo nos casos de aprovação parcial no Enem ou em caso de anterior aprovação no grau de ensino. II - No que se refere à base de cálculo a ser utilizada, a Resolução n. 391/2021/CNJ determina que, para a remição decorrente do estudo individual com a aprovação total no Enem ou no Encceja, será considerada como base de cálculo para fins de cômputo das horas visando à remição da pena 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino, fundamental ou médio, o que corresponde o montante de 1.600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1.200 (mil e duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio. III - Firmou-se, ainda, o entendimento de que o total de 1.200 horas, pela aprovação em exame que certifica a conclusão do ensino médio deve incidir na proporção de 1 dia de pena para cada 12 horas de estudo, resultando em 100 dias de remição, o que equivale a 20 dias de remição para cada uma das cinco áreas de conhecimento avaliadas no exame. IV - No caso concreto, o apenado obteve aprovação parcial, ou seja, em 3 (três) das 5 (cinco) áreas de conhecimento no ENCCEJA 2022, o que corresponde a 60 dias de remição. V - O agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a decisão agravada pelos próprios fundamentos. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 872.350/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 16/10/2024, DJe de 29/10/2024.) EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. REMIÇÃO DE PENA. APROVAÇÃO NO ENEM APÓS CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO. POSSIBILIDADE DA BENESSE. VEDADO O ACRÉSCIMO DE 1/3 DO ART. 126, § 5º, DA LEP. BASE DE CÁLCULO. REMIÇÃO DE 20 (VINTE) DIAS DE PENA POR MATÉRIA QUE HOUVE APROVAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - O agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a decisão agravada pelos próprios fundamentos. II - É possível a remição da pena pela aprovação no ENEM, ainda que o sentenciado tenha concluído o ensino médio antes do início do cumprimento da pena, ressalvado o acréscimo de 1/3 (um terço) com fundamento no art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal. III - A Resolução n. 391/2021, CNJ determina que, para a remição decorrente do estudo individual com a aprovação total no Enem ou no Encceja, será considerada como base de cálculo para fins de cômputo das horas visando à remição da pena 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino, fundamental ou médio, o que corresponde o montante de 1.600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1.200 (mil e duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio. IV - O Superior Tribunal de justiça tem entendido de forma reiterada que o total de 1.200 horas, pela aprovação em exame que certifica a conclusão do ensino médio, deve incidir na proporção de 1 dia de pena para cada 12 horas de estudo, resultando em 100 dias de remição, o que equivale a 20 dias de remição para cada uma das cinco áreas de conhecimento avaliadas no exame. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 792.658/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 2/8/2024.) EXECUÇÃO PENAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSO PENAL. REMIÇÃO DE PENA. APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO, APÓS CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA BENESSE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. O Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos - ENCCEJA é a avaliação de âmbito nacional própria para a certificação do aproveitamento do conteúdo programático do ensino médio e do ensino fundamental àqueles que atingiram a idade de quinze anos (para o nível fundamental) ou dezoito anos (para o nível médio). Diferentemente do ENEM, o ENCCEJA não se presta, por si só, ao ingresso no ensino superior. 2. No caso dos autos, minha posição externada no julgamento do HC n. ° 786.844, foi no sentido de que o paciente não faria jus à remição pelo estudo individual, uma vez que, conforme ressaltado pelo agravante, ao iniciar o cumprimento da pena, o agravado já havia concluído o ensino médio. Naquela oportunidade, o fundamento adotado era o de que a finalidade da remição pelo estudo não é simplesmente diminuir o tempo de encarceramento da pessoa presa, mas, facilitar a sua reintegração social por meio do aprendizado de novos conhecimentos. 3. Contudo, no julgamento do precitado HC n.° 786.844, realizado em agosto desta ano de 2023, restou consignado pela Quinta Turma deste STJ, por maioria de votos, a possibilidade de remição da pena na hipótese em exame, ou seja, mesmo após a conclusão do ensino médio e ainda que o sentenciado tenha obtido o diploma de curso superior antes do início do cumprimento da pena, como é o caso dos autos. 4. Em sendo assim, submeto os presentes embargos de divergência a esta Terceira Seção, para que se defina a posição deste colegiado em relação ao tema e se estabilize a jurisprudência desta Corte, de forma a se atender ao dever cooperativo de coerência enunciado pelo art. 926 do CPC. Embargos de divergência providos. (EREsp n. 1.979.591/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Terceira Seção, julgado em 8/11/2023, DJe de 13/11/2023) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DE PENA POR ESTUDO. APROVAÇÃO EM 4 DAS 5 ÁREAS DE CONHECIMENTO DO EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO - ENEM. POSSIBILIDADE. ART. 126 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL C/C ART. 3º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO N. 391, DE 10/05/2021, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO ANTES DO INÍCIO OU DURANTE O CUMPRIMENTO DA PENA: IRRELEVÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. GRAUS DE DIFICULDADE DIFERENTES DO EXAME QUE CERTIFICA A CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO (ENCCEJA) E DO ENEM. DIREITO À REMIÇÃO DE 20 (VINTE) DIAS DE PENA POR MATÉRIA EM QUE O EXECUTADO FOI APROVADO. VEDADO O ACRÉSCIMO DE 1/3 PREVISTO NO ART. 126, § 5º, DA LEP. 1. "É cabível a remição pela aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM ainda que o Apenado já tenha concluído o ensino médio anteriormente, pois a aprovação no exame demanda estudos por conta própria mesmo para aqueles que, fora do ambiente carcerário, já possuem o referido grau de ensino" (REsp n. 1854391/DF, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/9/2020, DJe 6/10/2020), ressalvado o acréscimo de 1/3 (um terço) com fundamento no art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal. (AgRg no HC n. 768.530/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 9/3/2023) Precedentes: AgRg no REsp n. 1.863.149/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/3/2023, DJe de 22/3/2023; AREsp 1.741.138/DF, Rel. Min. MESSOD AZULAY NETO, DJe de 15/06/2023; HC 828.572/SP, Rel. Min. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, DJe de 12/06/2023; REsp 2.069.804/MG, Rel. Min. RIBEIRO DANTAS, DJe de 06/06/2023; HC 799.103/SP, Rel. Min. RIBEIRO DANTAS, DJe de 19/04/2023. 2. O objetivo do conjunto de regras acerca da remição da pena por aproveitamento dos estudos é o de incentivar os apenados aos estudos, bem como sua readaptação ao convívio social. [...] 5. Transposto esse raciocínio para a situação da conclusão do ensino médio antes do ingresso do apenado no sistema prisional, é forçoso concluir, também, que sua superveniente aprovação no ENEM durante o cumprimento da pena não corresponde ao mesmo nível de esforço e ao mesmo "fato gerador" correspondente à obtenção do grau do ensino médio, não havendo que falar em concessão do benefício (remição de pena) em duplicidade pelo mesmo fato. 6. De se pontuar, ademais, que essa particular forma de interpretar a lei e as normas que tratam da remição de pena por estudo é a que mais se aproxima da Constituição Federal, que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos, bem como tem por objetivos fundamentais erradicar a marginalização e construir uma sociedade livre, justa e solidária (incisos I, II e III do art. 3º). Tudo na perspectiva da construção do tipo ideal de sociedade que o preâmbulo da respectiva Carta Magna caracteriza como "fraterna" (HC n. 94163, Relator Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma do STF, julgado em 2/12/2008, DJe-200 DIVULG 22/10/2009 PUBLIC 23/10/2009 EMENT VOL-02379-04 PP-00851). 7. A jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal é assente no sentido de que as 1.200 horas, correspondentes ao ensino médio, divididas por 12 (1 dia de pena a cada 12 horas de estudo) resultam em 100 dias remidos. Idêntica forma de parametrar a contagem do tempo a ser remido é aplicável ao ENEM, com a exceção de que o apenado aprovado em todas as áreas do ENEM, a partir de 2017, não faz jus ao acréscimo de 1/3 (um terço) previsto no art. 126, § 5º, da LEP. 8. No caso concreto, a defesa comprovou que o apenado obteve aprovação em 4 (quatro) das 5 (cinco) áreas de conhecimento no ENEM 2019, somente não atingiu a nota mínima na área de conhecimento "Matemática e suas tecnologias". Portanto, não merece reparos a decisão agravada que concedeu a ordem de ofício, para deferir ao paciente o total de 80 (oitenta) dias de remição de pena, em virtude de sua aprovação parcial no ENEM/2019. 9. Agravo regimental do Ministério Público estadual desprovido. (AgRg no HC n. 786.844/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, relator para acórdão Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 13/9/2023)

Portanto, o fato de o executado ter concluído ensino superior em data anterior ao cumprimento da pena, conforme mencionou o Tribunal, não afasta o direito à remição de pena pelo estudo.

Para a aprovação no ENEM é necessário atingir o mínimo de 450 (quatrocentos e cinquenta) pontos em cada área de conhecimento e 500 (quinhentos) pontos na prova de redação, consoante a Portaria MEC-INEP n. 179, de 28/4/2014 (DOU de 29/4/2014, n. 80, Seção 1, pág. 40).

Confira-se, a propósito, o exato teor na norma: Art. 1º - O participante do ENEM interessado em obter o certificado de conclusão do Ensino Médio ou a declaração parcial de proficiência deverá atender aos seguintes requisitos: I - indicar a pretensão de utilizar os resultados de desempenho no exame para fins de certificação de conclusão do Ensino Médio, no ato da inscrição, bem como a Instituição Certificadora; II - possuir no mínimo 18 (dezoito) anos completos na data da primeira prova de cada edição do exame; III - atingir o mínimo de 450 (quatrocentos e cinquenta) pontos em cada uma das áreas de conhecimento do exame; IV - atingir o mínimo de 500 (quinhentos) pontos na redação.

No caso, o apenado foi aprovado em todas as 5 disciplinas no Enem/2019 (e-STJ, fl. 21). A jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal é assente no sentido de que as 1.200 horas, correspondentes ao ensino médio, divididas por 12 (1 dia de pena a cada 12 horas de estudo) resultam em 100 dias remidos.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELA APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO (ENEM). ART. 126 DA LEP. RECOMENDAÇÃO N. 44/2013 DO CNJ. BASE DE CÁLCULO. ARTS. 24, I, E 35 DA LEI 9.394/1996. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O art. 126 da Lei de Execução Penal determina que o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. 2. Esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento e tem admitido a possibilidade de abreviação da reprimenda em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal, como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma inserta no art. 126 da LEP. De outro lado, a Recomendação n. 44/2013 do CNJ indica aos Tribunais a possibilidade de remição por aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Verifica-se, portanto, que o objetivo deste conjunto de regras acerca da remição da pena por aproveitamento dos estudos é o de incentivar os apenados aos estudos, bem como sua readaptação ao convívio social. 3. Considerando como base de cálculo 50% da carga horária definida legalmente para o ensino médio, ou seja, 1.200 horas, deve-se dividir esse total por doze, encontrando-se o resultado de 100 dias de remição em caso de aprovação em todos os campos de conhecimento do ENEM. Serão devidos, portanto, 20 dias de remição para cada uma das cinco áreas de conhecimento. 4. In casu, como o agravado obteve aprovação integral, ou seja, nas cinco áreas de conhecimento, a remição deve corresponder a 100 dias com os acréscimos legalmente permitidos. Interpretação dos arts. 24, I, e 35 da Lei n. 9.394/1996. Precedentes. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 447.375/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 4/4/2019, DJe de 10/4/2019.)

Assim, ficou configurada flagrante ilegalidade, hábil a ocasionar o deferimento, de ofício, da ordem postulada. Ante o exposto, com amparo no art. 34, XX, do Regimento Interno do STJ, não conheço do habeas corpus, mas concedo a ordem de ofício, a fim de determinar que o juiz das execuções criminais reconheça o direito do executado a 100 dias de remição da pena em razão de aprovação total no Enem 2019. Comunique-se a presente decisão, com urgência, ao juiz das execuções criminais e ao tribunal de justiça. Intimem-se.

Relator

REYNALDO SOARES DA FONSECA

(STJ - HABEAS CORPUS Nº 1015983 - ES (2025/0240962-5) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA, Publicação no DJEN/CNJ de 07/07/2025.)

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