STJ Jul25 - Prisão Preventiva Revogada - Lei de Drogas - Réu Condenado a 7anos em Regime Semiaberto sem o Direito de Responder em Liberdade - Preventiva é Incompatível com a Condenação ao Regime Semiaberto

 Carlos Guilherme Pagiola

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em benefício de HENRIQUE XXXXXXXXXXXX, contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL proferido no julgamento do HC n. 1407015-54.2025.8.12.0000.

Extrai-se dos autos que o Juízo de Primeiro Grau condenou os pacientes por infração ao art. 33, caput, c/c art. 40, III, da Lei 11.343/2006 (tráfico de entorpecentes), sendo imposta ao paciente Henrique a pena de 6 anos e 5 meses de reclusão, e à paciente Juliana, a reprimenda de 7 anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, ocasião em que manteve a prisão preventiva e não permitiu o recurso em liberdade. Impetrado habeas corpus contra a sentença, o Tribunal de origem denegou a ordem, em aresto assim sintetizado:

"HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS MAJORADO – ARTIGO 33, CAPUT, C/C ARTIGO 40, INCISO III, DA LEI N. 11.343/06 – PRISÃO PREVENTIVA – SENTENÇA CONDENATÓRIA – NEGATIVA DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – PACIENTES PRESOS DURANTE TODO O TRÂMITE PROCESSUAL – GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA – PERICULOSIDADE EVIDENCIADA – AUSÊNCIA DE ALTERAÇÃO FÁTICA – MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA – INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE A CUSTÓDIA PREVENTIVA E O REGIME SEMIABERTO – ADEQUAÇÃO REALIZADA PELO SENTENCIANTE – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO – ORDEM DENEGADA. Inexiste constrangimento ilegal na manutenção da prisão preventiva, pois a medida encontra-se devidamente justificada na necessidade imperiosa de garantia da ordem pública, diante da gravidade acentuada da conduta imputada aos pacientes e dos elementos que sugerem periculosidade social, notadamente se considerado que permaneceram presos durante todo o trâmite processual, não se justificando que, após a prolação da sentença que os condenou por tráfico, sejam postos em liberdade. É pacífica a orientação jurisprudencial do STJ no sentido de que 'tendo o paciente permanecido preso durante toda a instrução processual, não deve ser permitido recorrer em liberdade, especialmente porque, inalteradas as circunstâncias que justificaram a custódia, não se mostra adequada a soltura dele depois da condenação em Juízo de primeiro grau.' (HC 547.478/SP, Rel. Ministro JOEL ILANPACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 23/03/2020). Não há incompatibilidade entre a manutenção da prisão preventiva e o regime imposto na sentença condenatória, especialmente porque o Juiz singular determinou a expedição da guia de recolhimento provisória e a adequação da custódia da paciente ao regime semiaberto. Com o parecer, ordem denegada." (fl. 554).

Daí o presente writ, no qual a defesa argumenta a configuração de constrangimento ilegal imposto aos pacientes uma vez que, embora fixado o regime inicial semiaberto, foi mantida a prisão preventiva. Enfatiza que a prisão cautelar foi mantida sem fundamentação idônea, violando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Busca, assim, liminarmente e no mérito, a revogação da custódia cautelar.

É o relatório. Decido.

Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ.

Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.

Com efeito, a Suprema Corte firmou entendimento no sentido de que a "fixação do regime de cumprimento semiaberto afasta a prisão preventiva" (AgRg no HC 197797, Rel. Ministro Roberto Barroso, Rel. p/ acórdão Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 15/6/2021), esclarecendo que "a tentativa de compatibilizar a prisão cautelar com o regime de cumprimento da pena imposta na condenação, além de não estar prevista em lei, implica chancelar o cumprimento antecipado da pena, em desrespeito ao que decidido pelo Supremo Tribunal Federal. Precedentes" (AgRg no HC 221936, Rel. Ministro Nunes Marques, Rel. p/ Acórdão Ministro André Mendonça, Segunda Turma, DJe 20/4/2023).

Nessa linha de entendimento, o Pretório Excelso ponderou, ainda, que, não obstante haja incompatibilidade da prisão preventiva com o modo prisional semiaberto, em casos de situações excepcionalíssimas, há de se realizar a compatibilização da segregação com o regime fixado na sentença condenatória, desde que devidamente justificado o acautelamento provisório. Assim, admitiu-se que "tal regra comporta exceções, como situações de reiteração delitiva ou violência de gênero" (AgRg no HC 223529, Rel. Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, DJE 19/4/2023).

Diante de tal contexto, buscando a unificação jurisprudencial, a Quinta Turma deste Superior Tribunal de Justiça, em sessão realizada no dia 13/6/2023, acolheu, no julgamento do AgRg no RHC 180.151/MG, o posicionamento da Corte Suprema, passando, então, a aderir ao entendimento de que a fixação do modo prisional semiaberto inviabiliza a negativa do direito do recurso em liberdade, salvo quando constatada circunstância excepcional que demonstre a imprescindibilidade da prisão preventiva, ocasião em que deverá ser realizada a compatibilização da segregação com o regime intermediário. É esta a ementa do julgado:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CONDENAÇÃO EM REGIME SEMIABERTO E PRISÃO PREVENTIVA. ADEQUAÇÃO AO ENTENDIMENTO FIRMADO PELA SUPREMA CORTE. EXCEPCIONALIDADE NÃO DEMONSTRADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Esta Corte possui entendimento consolidado em ambas as suas turmas criminais no sentido de que não há incompatibilidade entre a negativa do direito de recorrer em liberdade e a fixação do regime semiaberto, caso preenchidos os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal e desde que o acusado seja mantido em local compatível com o regime fixado na sentença. 2. Todavia, a Suprema Corte firmou posição em sentido diverso, ou seja, de que "[a] fixação do regime de cumprimento semiaberto afasta a prisão preventiva" (AgRg no HC 197797, Rel. Ministro Roberto Barroso, Rel. p/ acórdão Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 15/6/2021), uma vez que "[a] tentativa de compatibilizar a prisão cautelar com o regime de cumprimento da pena imposta na condenação, além de não estar prevista em lei, implica chancelar o cumprimento antecipado da pena, em desrespeito ao que decidido pelo Supremo Tribunal Federal. Precedentes". (AgRg no HC 221936, Rel. Ministro Nunes Marques, Rel. p/ Acórdão Min. André Mendonça, Segunda Turma, DJe 20/4/2023). 3. Isso não impede que a prisão seja mantida em casos excepcionais e desde que apresentada fundamentação demonstrando a imprescindibilidade da medida. Ou seja, "[e]mbora o Supremo Tribunal Federal tenha firmado o entendimento de que a prisão preventiva é incompatível com a fixação do regime inicial semiaberto, tal regra comporta exceções, como situações de reiteração delitiva ou violência de gênero. Precedentes". (AgRg no HC 223529, Rel. Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, DJE 19/4/2023). 4. Com finalidade de harmonização da jurisprudência nacional e em homenagem ao princípio da segurança jurídica, compete a este Tribunal acolher o entendimento da Suprema Corte Constitucional, adequando-se às disposições contidas nos referidos julgados. 5. Na hipótese, não se verifica excepcionalidade que justifique a manutenção da prisão. O agravante foi condenado pela prática do crime de tráfico de drogas, sendo que apenas uma circunstância foi sopesada de forma desfavorável. Ademais, ele é primário, ostentando um único antecedente criminal, registro este que, embora referente ao mesmo delito, é relativamente distante - 15/10/2019 -, e sem condenação. 6. De outro lado, a quantidade de drogas apreendida, conquanto não seja irrisória, não é expressiva, tampouco de natureza especialmente reprovável. Além disso, ele confessou a prática do delito, contribuindo com a instrução criminal. 7. Portanto, em acolhimento ao entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, e não se verificando excepcionalidade que autorize a manutenção da custódia, deve a prisão ser revogada. 8. Agravo regimental provido. (AgRg no RHC n. 180.151/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 16/6/2023).

Na hipótese em debate, conforme leitura dos trechos do acórdão recorrido, não há excepcionalidade configurada que justifique a manutenção da custódia cautelar, sendo recomendável, por ora, a revogação da prisão preventiva. Ante o exposto, com fundamento no art. 34, inciso XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do habeas corpus. Todavia, concedo a ordem, de ofício, para revogar a prisão preventiva dos pacientes, concedendo-lhes o direito de recorrer em liberdade. Publique-se. Intimem-se.

Relator

JOEL ILAN PACIORNIK

(STJ - HABEAS CORPUS Nº 1015487 - MS (2025/0238018-0) RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK, Publicação no DJEN/CNJ de 03/07/2025)

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