STJ Set24 - Execução Penal - Falta Grave Anulada - Devolução de Livro Danificado
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
Inteiro Teor
HABEAS CORPUS Nº 945957 - SP (2024/0350605-9)
EMENTA
EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE.
ATIPICIDADE DA CONDUTA. PUNIÇÃO DE APENADO QUE DEVOLVEU UM LIVRO DA BIBLIOTECA DANIFICADO, MAS NÃO INUTILIZADO. CONDUTA NÃO COMPREENDIDA NA LEGISLAÇÃO COMO GRAVE. ESFORÇO EM TIPIFICAR COMO FALTA GRAVE QUE DEMONSTRA INTOLERÂNCIA, EXCESSO DE RIGOR E INFLEXIBILIDADE COM O APENADO QUE DEMONSTRA INTERESSE EM SE REEDUCAR. ENTRAVES À RESSOCIALIZAÇÃO QUE DEVEM SER EVITADOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
Ordem liminarmente concedida.
DECISÃO
O presente writ, impetrado em benefício de XXXX - cumprindo pena privativa de liberdade -, em que se aponta como autoridade coatora o Tribunal de Justiça de São Paulo (Habeas Corpus n. 2245366-10.2024.8.26.0000), comporta pronto acolhimento.
Com efeito, busca a impetração a anulação da infração disciplinar de natureza grave atribuída ao paciente pelo Juízo de Direito da Vara de Execuções Criminais da comarca de Araçatuba/SP (PEC n. 0001718-49.2021.8.26.05), consistente em desobediência a servidor da unidade prisional no dia 1º/9/2023, porque teria ele devolvido um livro que pegou do estabelecimento prisional danificado.
Sustenta a impetrante a atipicidade da conduta por ausência de dolo, falta de prova da materialidade da infração e perícia.
Subsidiariamente, pede a desclassificação da conduta para leve ou média, pois o fato ocorrido pelo paciente não se subsume a qualquer das faltas graves previstas nos arts. 50 a 52 da Lei de Execução Penal (fl. 13).
De fato, da atenta análise dos autos, observa-se que a infração disciplinar atribuída ao paciente decorre apenas do fato de ele ter devolvido um livro da biblioteca do estabelecimento prisional danificado, não tendo sido demonstrado se existe um controle da biblioteca a respeito de se ter certeza sobre o estado anterior do livro, já que o objeto não chegou a ficar inutilizado (apenas rasgado e remendado).
Dado o atual estado de coisas dos estabelecimentos prisionais brasileiros, bem como as dificuldades enfrentadas pelo sistema prisional no que tange à ressocialização, tenho que, além de a conduta atribuída ao apenado ser atípica, por não ser compreendida na Lei de Execucoes Penais sobre as infrações graves, é incompreensível tratar o apenado, que busca se reeducar, com excessivo rigor, sob pena de colocar obstáculos à ressocialização.
Vejam-se que as circunstâncias do caso, consistente em detento que manifestou interesse em exercer a leitura de livros no estabelecimento prisional, revelam que considerar como grave a conduta de rasgar, ao que parece, acidentalmente, um livro, e aplicar os consectários legais dessa falta, incorre em estabelecer obstáculos à ressocialização. Não significa que quem exerce o hábito da leitura não tem o dever de preservar os livros, mas que punir gravemente um ato isolado de danificar sem inutilizar um livro, mostra excesso de rigor e intolerância e, por consequência, entrave ao principal objetivo do cumprimento da pena.
Em face do exposto, concedo liminarmente a ordem impetrada para considerar atípica a infração grave atribuída ao paciente (1º/9/2023), sem prejuízo de a conduta ser classificada como leve ou média, se houver previsão local para tanto.
Comunique-se com urgência.
Intime-se o Ministério Público estadual.
Publique-se.
Brasília, 17 de setembro de 2024.
Ministro Sebastião Reis Júnior
Relator
(STJ - HC: 945957, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 18/09/2024)
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