STJ Jul25 - Execução Penal - Crime Cometido Durante o Livramento Condicional e Consecutiva Aplicação de Falta Grave - Ordem para Anular a falta grave e seus efeitos, e apenas revogar o livramento pela prática de novo crime : "consequências da prática de novo crime no curso do livramento já estabelecidas na lei não se compatibilizam com o reconhecimento de falta grave"

 Carlos Guilherme Pagiola


DECISÃO

Trata-se de habeas corpus impetrado em benefício de XXXXXXXXXXXX PINTO, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO no julgamento do Agravo de Execução Penal n. 0000571-25.2025.8.26.0509.

Extrai-se dos autos que o Juízo da Vara de Execução Penal revogou o livramento condicional do paciente e reconheceu a prática de falta grave nos termos da decisão de fls. 19/21. O Tribunal de origem negou provimento ao agravo de execução penal interposto pelo paciente, nos termos do acórdão que restou assim ementado (fl. 7):

"EMENTA: DIREITO PENAL. AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. FALTA DISCIPLINAR GRAVE. REVOGAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em Exame: 1 Agravo interposto por Aparecido Félix Pinto contra decisão que revogou o livramento condicional devido à condenação por crime cometido durante o benefício, reconhecendo falta disciplinar grave e declarando a perda de 1/3 dos dias remidos. II. Questão em Discussão: 2. A questão em discussão consiste em determinar se a condenação por novo crime durante o livramento condicional configura falta disciplinar grave, justificando a perda de dias remidos. III. Razões de Decidir: 3. A prática de crime doloso durante o livramento condicional configura falta disciplinar grave, conforme artigos 50 e 52 da LEP. 4. As consequências legais incluem a revogação do benefício e a perda de até 1/3 dos dias remidos, conforme artigo 127 da LEP. IV. Dispositivo e Tese: 5. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A prática de crime doloso durante o livramento condicional configura falta disciplinar grave. 2. A perda de dias remidos é consequência legal da falta grave. Legislação Citada: - Código Penal, art. 86, inciso I; Lei de Execução Penal, arts. 50, 52, 57, 127. Jurisprudência Citada: - TJSP, Agravo em Execução Penal nº 0008851-79.2020.8.26.0502, Rel. Des. Sérgio Coelho, j. 28.10.2020. - TJSP, Ag. Exec. nº 0054476-03.2014.8.26.0000, Rel. Des. Souza Nery, j. 28/01/2016."

No presente writ, a defesa sustenta que o reconhecimento de falta disciplinar grave implica em flagrante violação ao princípio da legalidade, pois, segundo os arts. 83 a 90 do Código Penal e 131 a 146 da Lei de Execução Penal, a prática de novo crime durante o livramento condicional deve resultar apenas na suspensão ou revogação do benefício, sem o reconhecimento de infração disciplinar.

No mérito, a defesa requer a concessão da ordem para afastar o reconhecimento de falta disciplinar grave por fato ocorrido em 8/5/2022 e, consequentemente, seus efeitos legais. Parecer do Ministério Público Federal pela concessão da ordem (fls. 29/35).

É o relatório. Decido.

Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça. Todavia, considerando as alegações expostas na inicial, razoável o processamento do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal que justifique a concessão da ordem de ofício.

Com efeito, os arts. 142 da Lei de Execuções Penais e 88 do Código Penal estabelecem que, no caso de revogação do livramento condicional em razão da prática novo crime no curso do benefício, não se computará na pena o tempo em que recuperando esteve solto e não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento.

Esta Corte Superior possui entendimento firme no sentido de que as consequências da prática de novo crime no curso do livramento já estabelecidas na lei não se compatibilizam com o reconhecimento de falta grave, que tem regramento próprio. Logo, não é possível, no caso em análise, a perda dos dias remidos e a anotação de falta grave.

Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. NOVO DELITO PRATICADO DURANTE O PERÍODO DE PROVA. FALTA GRAVE. NÃO RECONHECIMENTO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, "a prática de fato definido como crime durante o livramento condicional tem consequências próprias previstas no Código Penal e na Lei de Execuções Penais, as quais não se confundem com os consectários legais da falta grave praticada por aquele que está inserto no sistema progressivo de cumprimento de pena" (REsp n. 1.101.461/RS, relatora a Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe de 19/2/2013). 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 700.729/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 22/3/2022, DJe de 25/3/2022.) HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. FALTA GRAVE (NOVO CRIME) DURANTE PERÍODO DE PROVA DE LIVRAMENTO CONDICIONAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS PRÓPRIOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que implica o não-conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício. II - Assente nesta eg. Corte que "A prática de crime no curso do período de prova do livramento condicional não tem o condão de gerar os efeitos próprios da prática de falta grave (...) mas tão somente, após a efetiva revogação, a perda do tempo cumprido em livramento condicional e a impossibilidade de nova concessão do benefício no tocante à mesma pena" (HC n. 271.907/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe de 14/4/2014). III - Acerca da suspensão do período de prova diante da notícia da prática de fato relevante, "Firmou-se nesta Superior Corte de Justiça diretriz jurisprudencial no sentido de que cabe ao juízo da Vara de Execuções Penais, nos termos do art. 145 da Lei n. 7.210/1984, quando da notícia do cometimento de novo delito no período do livramento condicional, suspender cautelarmente a benesse, durante o período de prova, para, posteriormente, revogá-la, em caso de condenação com trânsito em julgado" (HC n. 381.230/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 17/2/2017). IV - Cumpre observar, ademais, que a suspensão do livramento condicional e a consequente expedição de mandado de prisão para recolhimento do apenado não dependem do trânsito em julgado da ação penal instaurada para apuração do novo fato. Habeas corpus não conhecido. (HC n. 689.048/MG, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 5/10/2021, DJe de 8/10/2021.)

De rigor, portanto o reconhecimento do constrangimento ilegal. Ante o exposto, com fundamento no art. 34, inciso XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do presente habeas corpus. Contudo, concedo a ordem de habeas corpus, de ofício, para cassar a decisão de fls. 19/21 e determinar, ao Juízo das execuções que elabore novo cálculo da pena sem aplicar os consectários próprios da falta disciplinar de natureza grave ao crime praticado no curso do livramento condicional. Publique-se. Intimem-se.

Relator

JOEL ILAN PACIORNIK

(STJ - HABEAS CORPUS Nº 1005208 - SP (2025/0180989-0) RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK, Publicação no DJEN/CNJ de 09/07/2025)

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