STJ Ago25 - Dosimetria Irregular - Lei de Drogas - Art.33 - Vetorial do Art. 42 é incindível - Quantidade e Natureza Análises conjuntas

 Carlos Guilherme Pagiola


DECISÃO

 Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de VINICIUS XXXXXXXXXXX contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (Apelação Criminal n. 5000529-52.2025.8.24.0538). 

Consta da impetração que o paciente foi condenado a 7 anos, 11 meses e 8 dias de reclusão em regime fechado e ao pagamento de 793 dias-multa, como incurso no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. 

Alega a impetrante que houve indevida exasperação da pena-base em razão da variedade e natureza dos entorpecentes, especificamente 1,7 g de maconha e 25 g de crack, sem fundamentação idônea. 

Sustenta que a quantidade de drogas apreendidas é pequena e não autoriza o aumento da pena pela quantidade, ainda que fosse admitido de forma autônoma, desgarrada da natureza da droga.

 Aduz que, no caso vertente, se verifica patente constrangimento ilegal, razão pela qual é necessária a concessão da ordem liminarmente para, de plano, reconhecendo-se a ilegalidade da decisão, suspender os efeitos da condenação em relação ao excesso impugnado, até julgamento final do Habeas Corpus. 

No mérito, requer a concessão da ordem para afastar o aumento da pena-base com fulcro no art. 42 da Lei n. 11.343/2006 em virtude da natureza/quantidade da droga.

 Subsidiariamente, caso não seja conhecido o Habeas Corpus, postula a concessão da ordem de ofício, diante da manifesta ilegalidade. 

O pedido liminar foi indeferido às e-STJ fls. 242/243. 

O Ministério Público Federal opinou, às e-STJ fls. 293/299, pelo não conhecimento do writ. 

É o relatório. Decido. 

Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, como forma de racionalizar o emprego do habeas corpus e prestigiar o sistema recursal, não admite a sua impetração em substituição ao recurso próprio. 

Cumpre analisar, contudo, em cada caso, a existência de ameaça ou coação à liberdade de locomoção do paciente, em razão de manifesta ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão impugnada, a ensejar a concessão da ordem de ofício. 

Na espécie, embora a impetrante não tenha adotado a via processual adequada, para que não haja prejuízo à defesa do paciente, passo à análise da pretensão formulada na inicial, a fim de verificar a existência de eventual constrangimento ilegal. 

Busca-se, no presente caso, o redimensionamento da pena-base. 

Com efeito, a dosimetria da pena insere-se dentro de um juízo de discricionariedade do julgador, atrelado às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, somente passível de revisão por esta Corte no caso de inobservância dos parâmetros legais ou de flagrante desproporcionalidade.

 Em se tratando de crime de tráfico de drogas, como ocorre in casu, o juiz deve considerar, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Estatuto 

Repressivo, a natureza e a quantidade da substância entorpecente, a personalidade e a conduta social do agente, consoante o disposto no artigo 42 da Lei 11.343/2006, in verbis:

 Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

 No caso, a Corte local manteve o aumento da pena-base do paciente em observância à previsão contida no art. 42 da Lei n. 11.343/2006, considerando a quantidade e a natureza dos entorpecentes apreendidos (e-STJ, fl. 68).

 Examinando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, em conjunto com o art. 42 da Lei n. 11.343/06, constato que:
 1) a culpabilidade, fundada em um juízo de reprovabilidade, não se afasta do que considero normal à espécie; 2) não há antecedentes, assim entendidos como sentença condenatória que não surta efeitos de reincidência (Súmula 444 do STJ); 3) não há elementos para aferir a conduta social; 4) não há dados sobre a personalidade; 5) o motivo do crime não foi esclarecido; 6) as circunstâncias são normais ao tipo, conforme análise a seguir; 7) as consequências do crime são normais ao tipo; 8) o comportamento da vítima em nada influenciou no crime; 9) A variedade de droga apreendida é expressiva (maconha e crack), além de que o crack possuí alto poder deletério, o que justifica a elevação da pena-base. Assim, exaspero a pena base em 1/6 e fixo a pena base em 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa. 

Entretanto, embora o desvalor conferido à diversidade e à natureza dos entorpecentes seja critério idôneo para dosar as penas nos crimes de tráfico de drogas, a quantidade das drogas apreendidas não é expressiva – 1,7 g de maconha e 25g de crack –, revelando-se desproporcional o incremento com base nessa motivação. 

Em hipóteses análogas, decidiu esta Corte:

 PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. EXISTÊNCIA, ENTRETANTO, DE COAÇÃO ILEGAL MANIFESTA. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. AFASTAMENTO DA EXASPERAÇÃO BASEADA NA QUANTIDADE E NATUREZA DO ENTORPECENTE. QUANTIDADE INEXPRESSIVA. FUNDAMENTO INIDÔNEO. PENA REDIMENSIONADA. CRITÉRIO PARA ELEIÇÃO DO PERCENTUAL DE AUMENTO COM BASE NA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL NEGATIVA. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR. MAJORAÇÃO PROPORCIONAL À GRAVIDADE DO INJUSTO. SEGUNDA FASE DA DOSIMETRIA. MULTIRREINCIDÊNCIA. FRAÇÃO SUPERIOR A 1/6. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DO REGIME FECHADO. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO OU DE CONCESSÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. Ordem parcialmente concedida, a fim de afastar a valoração negativa da circunstância judicial referente à natureza e quantidade da droga apreendida e, por consequência, redimensionar a reprimenda imposta ao paciente, a qual fica estabelecida em 7 anos de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 699 dias-multa, mantidos os demais termos do acórdão. (HC n. 929.208/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 14/4/2025, DJEN de 25/4/2025.) 

Passo, portanto, ao ajuste da reprimenda, apenas para afastar o aumento da pena-base, que retorna ao mínimo legal - 5 anos de reclusão e 500 dias-multa. Na segunda fase, presente a agravante da reincidência, aumenta-se a pena em 1/6, ficando em 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa. Na terceira fase, mantida a fração de 1/6 pela causa de aumento da pena, esta fica definitivamente arbitrada em 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, e 680 dias-multa. Ante o exposto, com base no art. 34, inciso XX, do RISTJ, não conheço o presente habeas corpus. Contudo, concedo a ordem, de ofício, para redimensionar a pena para 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão e 680 dias-multa, mantidos os demais termos da condenação. Intimem-se.

Relator

REYNALDO SOARES DA FONSECA

(STJ -  HABEAS CORPUS Nº 1020427 - SC (2025/0265852-5) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA,  Publicação no DJEN/CNJ de 13/08/2025.)

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