STJ 2023 - Estelionato - Regime Inicial mais Gravoso por haver outras Ações Penais em Curso - Fundamento Inidôneo - Pena Alternativa Aplicada - HC de Ofício em Recurso Especial
Inteiro Teor
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2026506 - SP (2021/0384718-0)
RELATOR : MINISTRO MESSOD AZULAY NETO
EMENTA
PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL PREJUDICADO EM RAZÃO DA DECISÃO AGRAVADA TORNADA SEM EFEITO. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE NA ORIGEM. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DE PARTE DO RECURSO ESPECIAL. DESISTÊNCIA PARCIAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. CONCEDIDA ORDEM DE HABEAS CORPUS , DE OFÍCIO, PARA CONCEDER A SUBSTITUIR A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS.
DECISÃO
Trata-se de agravo interposto por LUCIANO XXXXXXXXcontra decisão que inadmitiu recurso especial manejado em face de acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO que, por unanimidade, negou provimento ao recurso de apelação da defesa, mantendo a condenação do agravante pela prática do crime previsto no art. 171, caput , do CP, à pena de 1 (um) ano de reclusão, e a 10 (dez) dias-multa, no regime aberto (fls. 281-287).
Opostos embargos de declaração pela defesa, o Tribunal de origem, por unanimidade, rejeitou o recurso (fls. 322-327).
No recurso especial, interposto com fulcro no artigo 105, inciso III, alínea a , da Constituição Federal, a defesa alegou violação/contrariedade/negativa de vigência aos seguintes dispositivos de lei:
i) aos arts. 619 do CPP, 59 e 44, inc. III, ambos do CP, fundamentando que houve contradição, pois "a conduta social e a personalidade do recorrente, tidas positivas na fixação da pena-base no mínimo, foram, repita-se, sopesadas negativamente
para negar-lhe a substituição da sanção corporal por restritiva de direitos" (fl. 300).
Aduz que "inexistem, neste embate penal, elementos objetivos, concretos e analíticos de valia à personalidade e à conduta social do peticionário" (fl. 302);
ii) aos arts. 2º e 79, ambos do CPP, e 171, 5º, do CP, argumentando que "a uma, porque tanto neste feito como naqueles de folha 246 há a apuração de delitos patrimoniais a autorizar a conexão. 37. A duas, porque estando todos os feitos descritos na fase de conhecimento, não há de se falar em distinção de momentos (em fases distintas) como predicado ou motivo a rechaçar a imperiosa reunião de todos os processos. 38. Aliás, não exige o CPP sequer estejam os feitos na mesma fase para reunião ao julgamento uno e conjunto" (fl. 305).
Salienta que "que a Lei n. 13.694/2019 (Pacote Anticrime) convolou a ação penal ao processamento do delito de estelionato em"condicionada à representação"(art. 171, parágrafo 5º, do CP), tal regra haveria de incidir à hipótese. 41. Trata-se, afinal, de lei nova in mellius cuja incidência cabia e cabe na presente pretensão penal, ainda sem trânsito em julgado" (fls. 305-306).
Acrescenta que "a decisão condenatória recorrida negou-se a aplicar a lei nova benigna a pretexto de ser o"recebimento da denúncia"o marco temporal para a definição da subsunção normativa. 44. Equivocou-se. 45. A lei benigna sempre retroage.
46. Retroage a qualquer tempo, sobretudo enquanto não transitada em julgado a condenação" (fl. 308).
Por fim, a defesa pleiteou a reforma do acórdão recorrido, a fim de que "a) seja reconhecida a incidência da norma do artigo 171, parágrafo 5º, do CP, fins de se exigir das supostas vítimas a representação ou sua confirmação, bem como a conexão desta lide com os feitos de folha 246; b) seja deferida ao peticionário a substituição da sanção privativa de liberdade por restritiva de direitos" (fl. 309).
Apresentadas as contrarrazões (fls. 337-345), o Tribunal de origem inadmitiu o apelo raro, no que se refere i) à alegada afronta ao artigo 619 do CPP, considerando deficiência de fundamentação, hipótese prevista no art. 1.029 do CPC/2015, por deixar de indicar precisamente as razões da vulneração - incidência da Súmula n.º 284/STF; ii) ante o óbice da Súmula n.º 7/STJ; e iii) pela incidência da Súmula n.º 83/STJ - quanto à retroatividade da norma que previu a ação penal pública condicionada, como regra, no crime de estelionato (fls. 348-350).
Nas razões do agravo, postula-se o processamento do recurso especial, haja vista o cumprimento dos requisitos necessários à sua admissão (fls. 353-363).
Decisão da Presidência não conhecendo o agravo em recurso especial (fls. 383-384).
Petição da defesa postulando anulação dos atos processuais em razão de ausência de intimação da defesa (fls. 391-396), o qual foi deferido (fls. 399-400).
Foi interposto agravo regimental pela defesa (fls. 408-412).
Decisão da Presidência que tornou sem efeito a decisão agravada, restando assim prejudicado o objeto do o agravo regimental (fl. 420).
O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo não provimento do agravo (fls. 431-433).
É o relatório. Decido.
Inicialmente, verifica-se que a Presidência, por meio da decisão de fl. 420, tornou sem efeito a decisão agravada de fls. 383-384, razão pela qual restou prejudicado o agravo regimental de fls. 408-412.
A despeito das alegações da parte agravante, o recurso não comporta conhecimento.
Com efeito, nota-se, das razões do agravo em recurso especial, que o agravante desiste parcialmente de alguns tópicos do recurso especial (fls. 356-357), notadamente naquilo que se refere à retroatividade da norma que passou a exigir representação para o desencadeamento da ação penal nos crimes de estelionato, bem como na apontada violação ao artigo 79, do CPP (conexão), insistindo apenas quanto ao afronta aos artigos 619 do CPP, 59 e 44 do CP.
A título de esclarecimento, quanto ao ponto atinente à desistência parcial do recurso especial, convém consignar que o ordenamento jurídico admite que a parte inconformada recorra, parcialmente, de uma decisão, ainda que o órgão julgador conheça, em parte, do recurso interposto. Não há, entretanto, nenhuma previsão que autorize a desistência parcial, tácita ou expressa, do recurso especial após sua interposição .
Destarte, a controvérsia a ser dirimida pelo STJ é delimitada pela parte recorrente no ato de interposição do recurso especial e não pode ser por ela restringida antes do respectivo julgamento por esta Corte, ressalvada a hipótese de expressa desistência integral do direito de recorrer.
Uma vez interposto o recurso especial, o STJ está autorizado a analisar todas as teses presentes nas razões da insurgência contra o acórdão da origem. A preclusão consumativa impede que o recorrente, em agravo em recurso especial, selecione, por desistência parcial, expressa ou tácita, as matérias que serão julgadas por esta instância superior.
Nesse sentido:
"PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ART. 302, § 1º, INCISO IV, DO CTB. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. DESISTÊNCIA PARCIAL. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVA DA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - O ordenamento jurídico admite que a parte inconformada recorra, parcialmente, de uma decisão, ainda que o órgão julgador conheça, em parte, do recurso interposto. Não há, entretanto, nenhuma previsão que autorize a desistência parcial, tácita ou expressa, do recurso especial após sua interposição, ressalvada a hipótese de expressa desistência integral do direito de recorrer .
II - A preclusão consumativa impede que o recorrente, em agravo em recurso especial, selecione, por desistência parcial, expressa ou tácita, as matérias que serão julgadas por esta instância superior. Precedentes .
III - Registre-se que o momento adequado para impugnação dos fundamentos da decisão que nega seguimento ao recurso especial, com base no artigo 1.030, I, b, do CPC, é o da interposição do agravo interno, consoante expressamente preconiza o art. 1.030, § 2º, do novel CPC, sob pena de preclusão.
Agravo regimental desprovido" ( AgRg no AREsp n. 1.925.335/CE, Quinta Turma, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), DJe de 17/11/2021, grifei).
Ainda nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.691.944/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), DJe de 14/10/2021; e AREsp n. 1.566.739/SC, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 19/05/2020.
Noutro giro, observo que a jurisprudência desta Corte Superior entende que a existência de ação penal em curso não se revela fundamento idôneo para obstar o deferimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. No caso, preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do art. 44 do CP, é possível a substituição da reprimenda por restritiva de direitos, a ser fixada pelo Juízo das Execuções.
Nesse sentido:
"AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. NEGADA PELA EXISTÊNCIA DE AÇÃO PENAL EM CURSO. FUNDAMENTO INIDÔNEO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
A jurisprudência desta Corte Superior entende que a existência de ação penal em curso não se revela fundamento idôneo para obstar o deferimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
No caso, preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do art. 44 do CP, é possível a substituição da reprimenda por restritiva de direitos, a ser fixada pelo Juízo das Execuções.
Agravo regimental não provido" ( AgRg no HC n. 656.656/GO, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 1/6/2021).
Ainda nesse sentido: AgRg no HC n. 473.479/RS, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de 18/3/2019; RHC n. 33.713/ES, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe de 29/10/2013; HC n. 166.510/RJ, relatora Ministra Assusete Magalhães, Sexta Turma, DJe de 13/9/2013; HC n. 143.074/RS, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe de 22/3/2010 e HC n. 281.193/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe de 17/2/2014.
Diante do exposto, nos termos do art. 253, parágrafo único, inc. I, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, julgo prejudicado o agravo regimental, não conheço do agravo em recurso especial e, de ofício, concedo a ordem de habeas corpus, para determinar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos , motivo pelo qual remeto os autos ao Juízo das Execuções, a fim de serem implementadas as condições a serem cumpridas, nos termos da fundamentação retro.
Publique-se. Intime-se.
Brasília, 27 de setembro de 2023.
Ministro Messod Azulay Neto
Relator
(STJ - AREsp: 2026506, Relator: MESSOD AZULAY NETO, Data de Publicação: 29/09/2023)
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