STJ Abr24 - Quebras de Sigilos - Nulidade da Fundamentação - Nulidade das Provas :"necessidade de aprofundar as investigações e buscar elementos sobre os envolvidos são argumentos que podem ser aplicado a decisão, portanto, fundamentação genérica!"

 Publicado por Carlos Guilherme Pagiola


HABEAS CORPUS Nº 870254 - MG (2023/0418703-8)

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em favor de XXXXXXXXXS em que se aponta como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS (Apelação Criminal 1.0123.21.001305-8/001).

A paciente teve as medidas assecuratórias de quebra de sigilo e busca e apreensão deferidas em seu desfavor.

A apelação interposta pela defesa foi desprovida, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 21):

APELAÇÃO CRIMINAL - LAVAGEM DE CAPITAIS, CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E USO DE DOCUMENTO FALSO -RECURSO DEFENSIVO EM FACE DE DECISÃO QUE DETERMINOU MEDIDAS ASSECURATÓRIAS DIRECIONADAS À CONSTRIÇÃO DE ATIVOS FINANCEIROS -PEDIDO DE REVOGAÇÃO - NÃO CABIMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO. A prova da materialidade delitiva e dos indícios suficientes de sua respectiva autoria, quando evidenciada em contexto norteado pela 'necessidade' e pela 'adequação' de provimentos constritivos, basta para autorizar a concessão, inaudita altera pars, das medidas assecuratórias, sobretudo em sede de crimes contra a ordem tributária, os quais determinam a adoção de providências suficientes à recomposição de eventual dano sofrido pelo erário.

A defesa alega: a) que a paciente não é sócia ou funcionária da empresa Hit Distribuidora; b) que o fato de ser proprietária e locadora do endereço indicado pela empresa como sendo sua sede e, ainda, a existência de nota fiscal emitida por empresa de vestuário no qual constou endereço residencial atribuído à paciente não são elementos aptos a justificar as graves medidas; c) fragilidade das provas da autoria delitiva; d) ausência de fundamentação e individualização suficiente para deferir as medidas assecuratórias.

Requer liminar para suspender o PIC 0123.20.000940-5 (0013058.23.2021.8.13.0123) até o julgamento de mérito do presente habeas corpus o e, definitivamente, deferimento da ordem para declarar "nula a decisão da quebra de sigilo bancário e fiscal, bem como de busca e apreensão, decretadas em face da Paciente, determinando-se o desentranhamento das provas contaminadas pela ilicitude, bem como as delas derivadas, nos termos do art. 157 do CPP" (e-STJ fl. 19).

A liminar foi negada (e-STJ, fls. 829-831).

Informações prestadas pelo TJMG (e-STJ, fls. 837-893 e 903-1741).

O Ministério Público manifestou-se pela extinção do writ sem resolução de mérito ou pela denegação da ordem de habeas corpus (e-STJ fls. 1743-1748).

É o relatório.

Decido.

Após análise das razões do requerimento do Parquet e da decisão que deferiu as medidas cautelares impostas - que são objeto de requerimento no presente habeas corpus, quais sejam, quebra de sigilo bancário e fiscal e busca e apreensão-, verifico ausente a justa causa necessária para a decretação de tais medidas, pelas razões que passo a expor.

Inicialmente, importante ressaltar que a investigação criminal, na qual se originam as razões do writ, busca, originariamente, a apuração de cometimento de crimes contra a ordem tributária que teriam sido cometidos pela empresa HITXXXXXX, que tem como sóciosXXXXXXXXXXs. Da documentação dos autos, verifica-se que a paciente não é sócia daquela pessoa jurídica (e-STJ, fls.) Apesar do louvável esforço argumentativo do Ministério Público de Minas Gerais, a alegada correlação da paciente com as pessoas físicas mencionadas acima são demonstradas apenas nos fatos de que a paciente fora locadora do imóvel situado na XXXXXXXXXXXXXXXM, para MariaXXXXXXXXXXXes, no ano de 2017 (e-STJ, fls. 90-92) e a existência de nota fiscal de loja de vestuário com o CPF de Leonardo, nome e endereço de Josiane (e-STJ, fls. 93-100).

Não há qualquer outro elemento foi apto a demonstrar o envolvimento da paciente com as atividades supostamente criminosas perpetradas pela empresa XXXXXXXXXa e que trouxesse convicção necessária a permitir tão invasivas medidas que restringem, inequivocamente, o direito à intimidade.

Quanto à quebra de sigilo bancário e fiscal, o julgador de primeira instância assim justificou sua decisão (fls. 36-47):

Na hipótese vertente, há fundadas suspeitas de que os representados praticaram crimes contra a ordem tributária que, ate o momento, de acordo com a investigação, representam prejuízo demais de quatro milhões de reais ao fisco estadual pelo não recolhimento do ICMS, além do mais, ao que tudo indica, constituíram empresas de fachada para realização das transações relacionadas à gordura animal para comercialização final a Petrobrás Biocombustíveis S/A de Montes Claros.
Portanto como exaustivamente narrado presente o fumus boni iuris O periculum in mora, resta evidente a partir da necessidade de percorrer o caminho seguido pelo dinheiro envolvido nas transações comerciais em que estão envolvidos os represados, bem como para salvaguardar o patrimônio público e garantir o efetivo ressarcimento dos danos aparentemente causados à Administração Pública e, claro, à coletividade.
A Corte estadual limitou-se a repetir tais argumentos e, trouxe os seguintes argumentos (e-STJ, fls. 21-35):
Com efeito, a finalidade das medidas assecuratórias não é apenas garantir a colheita de provas ou eventual reparação a dano perpetrado, pois se prestam, também, a assegurar o resultado último do processo, consubstanciado na plena eficácia da tutela jurisdicional.
(...)
Com base nessas considerações, a MM. Juíza Singular acolheu a pretensão cautelar delineada pelo Promotor de Justiça oficiante e, em consequência, deferiu as seguintes medidas assecuratórias em desfavor da recorrente J. B. R.:
"(...) 1. Defiro o pedido para determinar a expedição dos mandados de busca e apreensão (com prazo de 30 dias de validade), cujo objetivo é apreender documentos, computadores, celulares, HDs, pen drives, mídias eletrônicas ou outras provas relacionados aos crimes contra a ordem tributária, lavagem de dinheiro e associação criminosa, a ser cumprido em desfavor de J.B.R., no endereço situado a Avenida Dinamarca, nº 270, bairro Jardim Aeroporto, Capelinha/MG (...) 2. Determino o bloqueio via sistema Sisbajud das contas bancárias/investimentos existentes em nome dos representados e o arresto de bens imóveis de titularidade dos representados, cujo escopo é mitigar os prejuízos causados ao erário estadual, em especial os imóveis descritos na peça ministerial à fl.24 (...) 3.
Determino a quebra do sigilo bancário e fiscal dos requeridos, nos exatos termos requeridos pelo Ministério Público, cujo caminho a ser adotado para cumprimento da medida excepcional é aquele orientado nos itens i) a ix) da peça de ingresso (fls.19/22)."(destaque nosso).
Feitas essas considerações, é importante esclarecer que, nos autos originários, cuida-se da apuração de esquema delinquencial engendrado, em tese, por uma associação criminosa que constituiu a empresa HIT DISTRIBUIDORA LTDA, no Município de Capelinha/MG, com o objetivo específico de ter acesso a notas fiscais ideologicamente falsas e, mediante "ações triangulares" que envolveram empresas paulistas fizeram chegar à PETROBRÁS BIOCOMBUSTÍVEL S/A, em Montes Claros/MG, trezentos e trinta e nove (339) cargas de gordura animal sem o devido recolhimento de ICMS.
E, em que pese a tese suscitada pela Defesa de insuficiência de fundamentos da decisão que deferiu as medidas cautelares preparatórias da ação penal, verifica-se que há nos autos elementos indiciários suficientes a embasar as constrições.
Após minucioso exame da decisão que deferiu as medidas cautelares preparatórias da ação penal, verifica-se que está devidamente fundamentada, adequando-se aos ditames dos arts. 134 e 240, ambos do Código de Processo Penal e do art. 93, inc. IX, da Constituição Federal, porque aponta, suficientemente, os motivos que levaram a MMª. Juíza Singular a determinar as constrições, conforme destacado acima.
Com efeito, a ínclita Magistrada não se olvidou de motivar o seu posicionamento, sendo certo que os fundamentos por ela expendidos durante a decretação das medidas assecuratórias, estão longe de serem considerados insuficientes para embasar as constrições.
Deveras, a r. decisão não padece de qualquer vício que tenha o condão de acarretar a sua anulação, sendo certo que os argumentos esposados pelo recorrente para justificar a sua irresignação constituem-se em verdadeiro inconformismo com o mérito do decisum.
E, nesse sentido, em relação à materialidade do crime, observa-se que os elementos indiciários evidenciam a materialidade dos crimes contra a ordem tributária, lavagem de dinheiro, falsificação e uso de documentos falsos, notadamente porque, em tese, a empresa Hit Distribuidora LTDA emitiu trezentas e trinta e nove (339) notas fiscais falsas, gerando uma compensação de crédito em favor das empresas às quais se destinavam tais documentos.
Em relação à autoria, verifica-se que os elementos indiciários também apontam, a princípio, que a apelante J. B. R. participou do esquema fraudulento de sonegação de impostos. Explico:
Os diversos e numerosos documentos constantes neste processo evidenciam, ao menos aprioristicamente, que a recorrente locou um imóvel de sua propriedade para as supostas atividades comerciais da empresa HIT DISTRIBUIDORA LTDA, no Município de Capelinha/MG, situado à Rua Bouganville, nº 203. Entretanto, as investigações empreendidas por auditores fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais dão conta de que jamais existiram quaisquer atividades empresariais no referido imóvel, até mesmo porque estava sem energia elétrica e não havia alvará municipal de funcionamento.
(...)
As investigações apontaram que a apelante possuía estreita ligação com L.G.S., até mesmo porque a recorrente J. B. R. veio a adquirir mercadoria para a sua própria residência, na Avenida Major Alvim, nº 400, apt. 14, Bairro Alvinópolis, Atibaia/SP, utilizando o CPF 22.976.416-05, de titularidade de L.G.S., este último vinculado ao corpo societário das empresas alhures indicadas, supostamente envolvidas no esquema delinquencial em exame.

Da análise dos trechos transcritos, não verifiquei a existência de fundamentação capaz de justificar o afastamento das garantias constitucionais da paciente.

Primeiramente, em relação à quebra dos sigilos fiscal, bancário, telemático e telefônico, observa-se que a Corte estadual se limitou a repetir os fundamentos trazidos pelo juízo de primeira instância e a indicar dispositivos legais e afirmar que há necessidade de aprofundamento das investigações e a real participação dos envolvidos, elementos que autorizariam a concessão da quebra dos sigilos bancário, fiscal e da medida de busca e apreensão, sem demonstrar, por meio da indicação de elementos concretos, a indispensabilidade da medida para o êxito das investigações, nem que esta seria a única saída adequada para a coleta de indícios da prática do crime objeto de apuração (e-STJ, fls. 21-35).

Ora, a alegação de que há necessidade de aprofundamento das investigações com o fim de buscar elementos sobre a participação dos envolvidos é argumento que pode ser aplicado a qualquer fato e sob quaisquer circunstâncias, tratando-se de fundamentação genérica, uma vez que não se particularizaram situações concretas, capazes de demonstrar a indispensabilidade das medidas extremas para o sucesso das investigações.

Nesse sentido:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ATIVA (POR DOZE VEZES).

QUEBRA DOS SIGILOS BANCÁRIO, FISCAL, TELEFÔNICO E TELEMÁTICO E MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO. ALEGAÇÃO DA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NA DECISÃO QUE DECRETOU AS PROVIDÊNCIAS CITADAS. PROCEDÊNCIA.

DECISÃO QUE SE LIMITA A AFIRMAR QUE TAIS MEDIDAS SERIAM NECESSÁRIAS PARA O ÊXITO DAS INVESTIGAÇÕES, SEM INDICAÇÃO DE ELEMENTO CONCRETO QUE DEMONSTRASSE A INDISPENSABILIDADE DELAS, NEM QUE SERIAM AS ÚNICAS PROVIDÊNCIAS CAPAZES DE ELUCIDAR OS CRIMES EM APURAÇÃO.

INEXISTÊNCIA, ATÉ, DE INDICAÇÃO DO OBJETO DA MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO, A EVIDENCIAR O CARÁTER GENÉRICO DA DECISÃO. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. IMPOSSIBILIDADE. SIMPLES MENÇÃO AO FATO DE QUE O PEDIDO ESTARIA INSTRUÍDO COM MATERIAL ATINENTE ÀS INVESTIGAÇÕES PRELIMINARES REALIZADAS PELA CORREGEDORIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.

1. É entendimento pacificado deste Superior Tribunal que decisão que determina a quebra de sigilo fiscal e bancário deve conter fundamentação concreta, justificando a razão pela qual a medida deva recair sobre a pessoa a quem é dirigida, bem como que para o afastamento do sigilo das comunicações telefônicas, é imprescindível ordem judicial, devidamente fundamentada, segundo o comando constitucional estabelecido no art. 93, IX, da Carta Magna.

Precedentes.

2. Hipótese em que, em relação à quebra dos sigilos fiscal, bancário, telemático e telefônico, a Corte estadual se limitou a indicar dispositivos legais e afirmar que há necessidade de aprofundamento das investigações, a fim de se identificar o modus operandi das atividades criminosas e a real participação dos envolvidos no esquema de corrupção que ora se delineia, elementos que autorizam a concessão da quebra dos sigilos bancário, fiscal, telefônico e de telemática, e da medida de busca e apreensão, sem demonstrar, por meio da indicação de elementos concretos, a indispensabilidade da medida para o êxito das investigações, nem que essa seria a única saída adequada para a coleta de indícios da prática do crime objeto de apuração.

3. A alegação de que há necessidade de aprofundamento das investigações com o fim de apurar o modus operandi da empreitada criminosa e a identificação da participação dos envolvidos é argumento que pode ser aplicado a qualquer fato e sob quaisquer circunstâncias, tratando-se de fundamentação genérica, uma vez que não se particularizaram situações concretas, capazes de demonstrar a indispensabilidade das medidas extremas para o sucesso das investigações. Precedente.

4. No tocante à medida de busca e apreensão, observa-se que, além de inexistir fundamentação concreta a respeito da indispensabilidade da medida, não há sequer indicação do objeto da medida, a evidenciar o caráter genérico da decisão. Precedente.

5. Não há que se cogitar de fundamentação per relationem, quando verificado que o pleito estaria instruído com as investigações preliminares procedidas pela Corregedoria do Ministério Público, sem indicar nenhuma alegação do Ministério Público que justificasse a necessidade das medidas.

6. Ordem concedida para reconhecer a ilegalidade de todos os elementos de informação decorrentes da decisão que determinou a quebra dos sigilos fiscal, bancário, telemático e telefônico da paciente, bem como determinou a busca e apreensão, devendo tais elementos e os deles decorrentes ser desentranhados dos Autos n. 1.

0000.16.047816-0/000.

(HC n. 497.699/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator para acórdão Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 13/8/2019, DJe de 26/8/2019.)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. FRAUDE À LICITAÇÃO (ART. 90 DA LEI N. 8.666/1993). NULIDADE. QUEBRA DO SIGILO TELEMÁTICO. (I) DECISÃO.

FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. REFERÊNCIA À EXISTÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS, SEM A MÍNIMA IDENTIFICAÇÃO DO CASO CONCRETO E DA IMPRESCINDIBILIDADE DA MEDIDA EXCEPCIONAL PARA O ÊXITO DAS INVESTIGAÇÕES. ELEMENTOS UTILIZADOS PARA A CONDENAÇÃO. PREJUÍZO IDENTIFICADO. (II) EFETIVAÇÃO DA MEDIDA POR PERÍODO NÃO COMPREENDIDO NA DECISÃO AUTORIZATIVA. ALEGAÇÃO SUPERADA COM O RECONHECIMENTO DA ILEGALIDADE. (III) OITIVA DE AGENTE DE PROMOTORIA QUE ATUOU NA FASE INVESTIGATIVA COMO TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE.

SERVIDOR PÚBLICO QUE ATUA COMO LONGA MANUS DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.

1. A Lei n. 9.296/1996, aplicável à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática (art. 1º, parágrafo único), dispõe que a interceptação dependerá, sob pena de nulidade, de ordem fundamentada do juiz competente da ação principal e exigirá a configuração de indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal punida com reclusão e que a prova não possa ser obtida por outros meios.

2. Hipótese em que a autoridade judicial se limitou a afirmações genéricas de que estariam presentes os requisitos legais para a autorização da medida, sem demonstrar, por meio de elementos concretos, o motivo pelo qual a providência adotada seria imprescindível para o êxito das investigações, tratando-se de decisão que poderia ser adequada a qualquer pedido de quebra dos sigilo. Precedente.

3. Verificado que tais elementos de informação foram consistentemente utilizados para justificar a condenação, denota-se a ocorrência do prejuízo, indispensável ao reconhecimento da nulidade.

4. Evidenciada a ilegalidade decorrente da ausência de fundamentação para a decretação da quebra do sigilo telemático, perde o objeto a alegação de que a medida foi realizada por período não compreendido na decisão autorizativa.

5. É incompatível a oitiva do órgão da acusação que atuou na fase investigativa como testemunha de acusação da ação penal. Precedente.

Tal entendimento deve ser aplicado ao agente de promotoria que atua na fase de investigação, tendo em que vista que se trata de servidor público que labora como longa manus do órgão da acusação.

6. Ordem concedida para: a) anular a sentença em relação ao paciente e o corréu (art. 580 do CPP); b) determinar que o Magistrado singular da Vara Única da comarca de Tambaú/SP desentranhe todos os elementos de informação dos autos relacionados à quebra do sigilo telemático declarado ilegal, bem como os elementos contaminados pelo vício; c) desentranhar dos autos da ação penal o depoimento da testemunha de acusação Juliano Meneghel Gobbet (assistente de promotoria que atuou na fase de investigação); e d) determinar que o Juízo de primeiro grau verifique se, com o desentranhamento dos elementos declarados ilegais, subsistem elementos para a persistência da ação penal, devendo, em caso positivo, abster-se de utilizar tais elementos em eventual prolação de nova sentença.

(HC n. 854.588/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 27/2/2024, DJe de 1/3/2024.)

A decisão da autoridade judiciária que autorizou a busca e a apreensão no domicílio da paciente, no que se refere ao crime envolvendo a empresa Hit Distribuidora LTDA, trouxe a seguinte fundamentação (fls. 36-47):

No que toca a investigada Josiane Barbosa Reis, verifica-se que seu nome surge nas investigações, não só por ser ela a suposta locadora do imóvel em que teria sede a Hit Distribuidora Ltda, mas também pelo fato de seu nome surgir em uma das notas fiscais emitidas para o CPF de Leonardo, a nota fiscal n. 5.161, de 12/0512018 (fl.12), de onde pode se extrair que Josiane realizou uma compra destinada para seu endereço residencial na cidade de Atibaia/SP.

(...)

Da leitura, infere-se, pois, da detalhada narrativa, a presença do fumus comissi delícti e do periculum in mora necessários ao deferimento das medidas restritivas/cautelares requeridas pelo Ministério Público Estadual, haja vista as fundadas suspeitas de crimes contra e ordem tributária previstos nos artigos 1º e 2º da Lei n"8.137/90, bem como lavagem de dinheiro praticados pelos ora investigados Leonardo e Josiane.

Nesse contexto, o periculum in mora é evidente em razão do perigo de reiteração delitiva, especialmente consistente na continuidade de lesão ao erário ante o não recolhimento do ICMS e a possibilidade de as empresas de fachada da continuarem operando.

Por conseguinte, a medida de busca e apreensão verifica-se necessária para tentativa de serem arrecadados documentos/materiais relacionados aos crimes que se busca apurar nos endereços residenciais e comerciais de Josiane, já que o paradeiro correto de Leonardo, não 'estou apontado'.

Também não há fundamentação que justifique a medida de busca e apreensão. Além de inexistir motivação calcada na indispensabilidade da medida excepcional, não há sequer indicação do objeto da medida, evidenciando-se o caráter genérico da decisão.

Nesse sentido:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PROCEDIMENTO DE INVESTIGATÓRIO CRIMINAL. DECRETAÇÃO DE MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE SE MOSTRA GENÉRICA, SEM PORMENORIZAR A NECESSIDADE DA MEDIDA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM QUE, APESAR DE ADMITIDA, EXIGE A INDICAÇÃO DE ARGUMENTOS PRÓPRIOS RELACIONADOS AO CASO CONCRETO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.

1. Proceder-se-á busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para: apreender instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso, descobrir objetos necessários à prova de infração e colher qualquer elemento de convicção (Art.

240, § 1º, d, e e h, do CPP).

2. Caso em que, apesar da extensa fundamentação constante da representação apresentada pelo Ministério Público estadual, observa-se que a decisão de primeiro grau não logrou apresentar, ainda que minimamente, a imprescindibilidade da medida, limitando-se à indicação de argumentos genéricos, que podem ser utilizados para a autorizar a efetivação de qualquer medida de busca e apreensão domiciliar.

3. Ainda que se reconheça a adoção da técnica de fundamentação per relationem, não há como subsistir a decisão que, de fato, faz referência aos fundamentos da representação do Ministério Público estadual, mas não apresenta argumentos próprios que demonstrem sua convicção a respeito do caso concreto que lhe é apresentado, providência exigida pela jurisprudência deste Superior Tribunal para o cumprimento do dever de fundamentação das decisões judiciais.

4. Prejudicada a alegação de falta de contemporaneidade da medida.

E, ainda que assim não fosse, segundo a jurisprudência desta Corte Superior, a contemporaneidade de riscos não é requisito para a produção probatória. Mesmo passado o tempo, sempre poderá o magistrado determinar a produção de provas pertinentes aos fatos, mesmo sendo elas invasivas da intimidade - fundamentadamente (HC n. 480.092/DF, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 10/03/2020).

5. Recurso provido para anular a decisão que decretou a medida de busca e apreensão nos Autos n. 1005860-82.2022.8.26.0037, devendo ser anuladas, identificadas e desentranhadas as provas dela decorrentes da citada ação penal pelo Juízo de conhecimento.

(RHC n. 178.384/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 16/5/2023, DJe de 19/5/2023.)

Ante o exposto, concedo a ordem para reconhecer a ilegalidade de todos os elementos de informação decorrentes da decisão que determinou a quebra dos sigilos fiscal, bancário, e que determinou a busca e apreensão, devendo tais elementos e os deles decorrentes ser desentranhados dos Autos n. 0123.20.000940-5 (0013058.23.2021.8.13.0123.

Comunique-se, com urgência, as instâncias ordinárias.

Publique-se. Intime-se.

Brasília, 08 de abril de 2024.

Ministra Daniela Teixeira Relatora

(STJ - HC: 870254, Relator: Ministra DANIELA TEIXEIRA, Data de Publicação: 10/04/2024)

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