STJ Dez23 - Prisão Preventiva Revogada - Lei de Drogas - Réu Primário - não demonstrada a periculosidade, a gravidade, nem o risco de reiteração criminosa

 

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 189476 - ES (2023/0399639-6) RELATOR : MINISTRO MESSOD AZULAY NETO

ADVOGADOS : BRENDA HERINGER COSTA - ES027705

DECISÃO

Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, impetrado em favor de ARGEMIRO XXXXXXXXXXS, contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.

Depreende-se dos autos que o recorrente foi preso em flagrante e teve a prisão convertida em preventiva pela suposta prática do dos crimes previstos no artigo 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006 e artigo 244-B, da Lei n.º 8.069/1990, em razão de ter praticado o fato em comunhão com dois adolescentes- fls. 85-88.

Foram apreendidos: 98 (noventa e oito) pinos da substância similar à cocaína, 17 (dezessete) papelotes da substância similar à cocaína, 94 (noventa e quatro) buchas da substância similar à maconha, 41 (quarenta e uma) pedras da substância similar a crack, 21 (vinte e um) pinos da substância similar a haxixe, 09 (nove) unidades pequenas de substância similar a haxixe- fl. 86. Irresignada, a Defesa impetrou habeas corpus perante a Corte local.

A ordem foi denegada pelo Tribunal de origem, entendendo que a prisão se encontrava justificada, diante da gravidade da conduta imputada ao recorrente, conforme acórdão de fls. 210-219. No presente recurso, a Defesa afirma, em síntese, a ocorrência de constrangimento ilegal diante da decretação de prisão preventiva, sem fundamentação concreta.

Argumenta que as condições pessoais do recorrente são favoráveis, defendendo a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. Requer, a revogação da prisão preventiva ou, subsidiariamente, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. Sem pedido de liminar

O Ministério Público Federal em parecer, às fls. 261-268, manifestou-se em parecer que restou assim ementado: "RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E CORRUPÇÃO DE MENORES. DESNECESSIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA, DADA A POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO POR MEDIDA CAUTELAR DI VERSA. PARECER PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO ORDINÁRIO" - fl. 261.

É o relatório. DECIDO. A custódia prisional, como sabemos, é providência extrema que deve ser determinada quando demonstrados o fumus comissi delicti e o periculum libertatis, na forma do art. 312 do CPP. Em razão de seu caráter excepcional, somente deve ser imposta quando incabível a substituição por outra medida cautelar menos gravosa, conforme disposto no art. 282§ 6º, do CPP ( RHC n. 117.739/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 19/12/2019).

Colhe-se dos autos que o principal fundamento para decretação da prisão preventiva foi a gravidade da conduta, diante da necessidade de garantir a ordem pública (fls. 85-88). Registre-se que, conquanto o Juízo de primeiro grau tenha feito apontamentos quanto à necessidade da prisão para garantir a ordem pública, não demonstrou, suficientemente, em elementos concretos a periculosidade do recorrente, a gravidade da conduta, nem o risco de reiteração criminosa. Tais circunstâncias, embora não garantam eventual direito à soltura, devem ser valoradas, quando não demonstrada a indispensabilidade do decreto prisional.

Com efeito, a prisão não se mostra necessária, em juízo de proporcionalidade, para embasar a segregação corpórea. Logo, sa imposição de medidas cautelares alternativas à prisão preventiva são as mais indicadas ao caso ora em análise.

Em hipóteses como a destes autos, esta Corte Superior tem entendido pela possibilidade de substituição da prisão preventiva por medidas diversas do encarceramento.

Neste aspecto, é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que a custódia prisional:

"somente se justifica na hipótese de impossibilidade que, por instrumento menos gravoso, seja alcançado idêntico resultado acautelatório" ( HC n. 126.815, Relator Ministro MARCO AURÉLIO, Relator p/ acórdão Ministro EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 4/8/2015, publicado em 28/8/2015).”(AgRg no HC n. 653.443/PE, Quinta Turma, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 19/4/2021, grifei.)
Ressalte-se que: “Além disso, de acordo com a microrreforma processual procedida pela Lei n. 12.403/2011 e com os princípios da excepcionalidade (art. 282§ 4.º, parte final, e § 6.º, do CPP), provisionalidade (art. 316 do CPP) e proporcionalidade (arts. 282, incisos I e II, e 310, inciso II, parte final, do CPP), a prisão preventiva há de ser medida necessária e adequada aos propósitos cautelares a que serve, não devendo ser decretada ou mantida caso intervenções estatais menos invasivas à liberdade individual, enumeradas no art. 319 do CPP, mostrem-se, por si sós, suficientes ao acautelamento do processo e/ou da sociedade.” (AgRg no HC n. 803.633/SP, Sexta Turma, relatora Ministra Laurita Vaz, DJe de 28/3/2023, grifei)
Nesse sentido o parecer do Ministério Público Federal: "No particular, a prisão é perfeitamente substituível por alguma ou algumas das medidas cautelares de que trata o art. 319 do Código de Processo Penal, nos termos do art. 282§ 6º, do CPP, com a redação dada pela Lei nº 12.403/2011, visto que: a) ainda não houve sentença condenatória relativa ao delito que deu causa à sua prisão; b) o recorrente é primário; c) não há provas de um eventual risco de fuga ou obstrução da investigação; d) não houve violência ou grave ameaça; e) no caso de descumprimento das restrições impostas, a prisão poderá ser novamente decretada em desfavor do recorrente ( CPP, art. 282§ 6º). Assim, temos que a prisão preventiva pode e deve ser substituída por medidas cautelares diversas da prisão, dada a suficiência e adequação destas para assegurar a ordem pública" - fl. 265.

Por óbvio, não se está a minimizar a gravidade da conduta imputada ao recorrente, porém há que se reconhecer que, uma vez ausentes os requisitos necessários para a prisão preventiva, sua manutenção caracterizaria verdadeira antecipação de pena.

Diante disso, considerando as peculiaridades do caso, entendo possível o resguardo da ordem pública e a garantia da aplicação da lei penal por medidas cautelares diversas, previstas no art. 319 do CPP.

Nesse sentido, por exemplo, a jurisprudência do STJ: HC n. 663.365/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe de 16/8/2021. Ante o exposto, dou provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, para revogar a prisão cautelar do Recorrente, salvo se por outro motivo estiver preso, sem prejuízo da aplicação de das medidas cautelares diversas previstas no art. 319 do CPP, a serem estabelecidas pelo Juízo a quo. Comunique-se ao recorrente que, em caso de injustificado descumprimento de quaisquer das obrigações impostas por força das cautelares, a prisão poderá ser restabelecida.

Publique-se. Intime-se. Brasília, 14 de dezembro de 2023.

Ministro Messod Azulay Neto Relator

(STJ - RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 189476 - ES (2023/0399639-6) RELATOR : MINISTRO MESSOD AZULAY NETO, 5ª Turma, Dje: 18/12/2023)

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