STJ Fev 25 - Execução Penal - Livramento Condicional :"art. 90 CP - não é possível suspender, prorrogar ou revogar o livramento condicional após o escoamento do período de prova, mesmo que em razão da prática de novo delito naquele período, uma vez que, terminado o referido prazo, considera-se extinta a pena privativa de liberdade"

 Publicado por Carlos Guilherme Pagiola


DECISÃO Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar, impetrado em favor de CXXXXX, em que se aponta como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (Agravo de Execução Penal nº 0023986-27.2023.8.26.0050).

 O Juízo da 3ª Vara das Execuções Criminais da Capital declarou extinta a punibilidade imposta ao sentenciado, em razão de ter expirado o período de prova sem a suspensão ou revogação do livramento condicional, ainda que constatado o cometimento de nova infração penal durante o curso do período de prova (e-STJ fl. 31-34). 

Declarou extinta, ainda, a pena de multa, ante a hipossuficiência do apenado. Irresignado, o Ministério Público interpôs agravo em execução penal perante o Tribunal de origem, o qual deu provimento ao recurso nos termos do acórdão assim ementado (e-STJ fl. 9): 

AGRAVO EM EXECUÇÃO INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA DO LIVRAMENTO CONDICIONAL - DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E DA PENA DE MULTA IMPOSTA INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO PLEITEANDO A CASSAÇÃO DO DECISUM - ACOLHIMENTO - PRÁTICA DE NOVO DELITO DOLOSO DURANTE O PERÍODO DE PROVA HIPÓTESE DE PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA DO BENEFÍCIO CAUSA OBSTATIVA DE DECLARAÇÃO DA EXTINÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE CABIMENTO DE SUSPENSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL EXEGESE DOS ARTS. 86, INCISO I E 89, DO CÓDIGO PENAL E ART. 145, DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS ADEMAIS, INADMISSÍVEL A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DA PENA DE MULTA INDEPENDENTEMENTE DO PAGAMENTO TEMA 931 DO COL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA DECISÃO REFORMADA AGRAVO PROVIDO. 

No presente writ, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo alega, em síntese, que: a) "Quanto à pena privativa de liberdade, a FA anexada demonstra que foi atingido o término do cumprimento da pena aos 19/06/2022, sem revogação ou sustação do benefício" (e-STJ fl. 3); b) "A prática de crime pelos beneficiários do livramento não importa em prorrogação automática do período de prova." (e-STJ fl. 5); c) "O artigo 89 CP mencionado na decisão deve ser interpretado em consonância com o artigo 145 da LEP, o que significa que terá aplicação SE e SOMENTE SE houver declaração de suspensão do curso do livramento, conforme estabelece a LEP. 

Não havendo suspensão até o término do período de prova, incide o artigo 90 do Código Penal" (e-STJ fl. 5); e d) a pena de multa também deve ser extinta, ante o estado de hipossuficiência comprovado do sentenciado. Requer, inclusive liminarmente, a concessão da ordem para declarar extinta a pena privativa de liberdade, pelo seu integral cumprimento, tendo em vista o cumprimento do período de prova do livramento condicional sem suspensão ou revogação. Liminar indeferida (e-STJ fls. 319-320). Informações prestadas (e-STJ fls. 328-340 e 341-361). 

Parecer do Ministério Público Federal pela concessão da ordem (e-STJ fls. 366-371).

 É o relatório. Decido. 

No caso dos autos o Tribunal de origem deu provimento ao agravo em execução interposto pelo Ministério Público, consignando, para tanto, que (e-STJ fls. 64/65):

 Dos referidos dispositivos legais, extrai-se que a prática de crime durante a vigência do livramento condicional é hipótese legal de prorrogação do período de prova. Enquanto não passar em julgado a sentença relativa à apreciação do fato cometido durante a vigência do período de prova, o juiz competente para apreciar os incidentes do livramento condicional não poderá reconhecer extinta a pena, pois, nos termos da lei, a prática de nova infração penal dolosa é causa que enseja a revogação do benefício em comento. [...] Como, na espécie, ocorreu a prorrogação automática do benefício em comento a partir de 02 de setembro de 2020, data em que cometido o primeiro dos crimes dolosos pelo sentenciado, o recorrido não tem direito subjetivo ao reconhecimento da extinção da pena privativa de liberdade, pois havia a possibilidade do benefício ser revogado e o condenado ser obrigado a cumprir o resto do tempo da prisão, sem computar o período em que esteve solto, caso se confirmasse a prática de nova infração disciplinar. Conclui-se que, “se durante a vigência do livramento condicional o liberado é acusado da prática de novo delito, ocorre a prorrogação automática do prazo, até que se verifique o trânsito em julgado da nova ação penal. A extinção da punibilidade não pode, neste caso, ser declarada na pendência da ação penal, sob pena de violação ao artigo 89 do Código Penal, ainda que o conhecimento acerca da prática do crime durante o período de prova do livramento condicional tenha ocorrido após o término da pena” (voto-vista da Exma. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, quando do julgamento do HC 25.727/RJ, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 08/05/2007, D Je 29/09/2008). Assim, constatada a prática de novos crimes dolosos no curso de período de prova de livramento condicional, resta obstada a declaração da extinção da punibilidade do recorrente, como consectário lógico do disposto nos arts. 86, inciso I, e 89, ambos do Código Penal, e art. 145, da Lei n° 7.210, de 11 de julho de 1.984. Por outro lado, de rigor a cassação da decisão vergastada em relação à pena de multa. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 3150/DF, firmou o entendimento de que a pena de multa imposta em condenação criminal mantém a sua natureza de sanção penal, que lhe é inerente por força do art. 5.º, inciso XLVI, alínea c, da Constituição da República, destacando a legitimação prioritária do Ministério Público para a sua execução perante a Vara das Execuções Penais. Assim, ainda que considerada como dívida de valor, a pena de multa não perdeu seu caráter de sanção penal, razão pela qual não se pode declarar extinta a punibilidade antes de seu adimplemento. Outrossim, não se desconhece o teor atualizado do Tema 931 de Recursos Repetitivos do Colendo Superior Tribunal de Justiça, o qual orienta que “O inadimplemento da pena de multa, após cumprida a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos, não obsta a extinção da punibilidade, ante a alegada hipossuficiência do condenado, salvo se diversamente entender o juiz competente, em decisão suficientemente motivada, que indique concretamente a possibilidade de pagamento da sanção pecuniária”. Desta forma, para que se declare extinta a pena de multa sem o seu adimplemento, de rigor que o sentenciado comprove não possuir meios de saldar seu débito com o Estado, podendo ele, em caso de dificuldades financeiras, pleitear, inclusive, o parcelamento da multa. No caso dos autos, o agravado não comprovou a impossibilidade econômica absoluta de efetuar o pagamento da multa. 

Nessas circunstâncias, verifico a existência de constrangimento ilegal apto a ensejar a concessão da ordem, uma vez que o entendimento a que chegou o Tribunal de origem contraria a jurisprudência desta Corte segundo a qual, "consoante o disposto no art. 90 do Código Penal - CP, não é possível suspender, prorrogar ou revogar o livramento condicional após o escoamento do período de prova, mesmo que em razão da prática de novo delito naquele período, uma vez que, terminado o referido prazo, considera-se extinta a pena privativa de liberdade" (AgRg no HC 771.470/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 19/12/2022, DJe de 22/12/2022).

 Nesse sentido, confiram-se, ainda, os seguintes precedentes: 

AGRAVO INTERNO NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. NOVO DELITO COMETIDO DURANTE A SUA VIGÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA DE SUSPENSÃO NO PERÍODO DE PROVA. REVOGAÇÃO POSTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 617/STJ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Decorrido o período de prova do livramento condicional sem suspensão ou prorrogação do benefício, fica extinta a pena privativa de liberdade. 2. Na hipótese, previsto o cumprimento integral da pena pelo Agravado em 09/10/2017, o Juízo da Execução Penal suspendeu o livramento condicional no dia 23/10/2017, ou seja, posteriormente ao período de prova. Dessa forma, o entendimento das instâncias ordinárias contraria a orientação consolidada no enunciado da Súmula n.º 617/STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no HC 472.499/MG, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 05/02/2019, DJe de 26/02/2019). EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. SÚMULA N. 617/STJ. LIVRAMENTO CONDICIONAL. PRÁTICA DE NOVO CRIME DURANTE O PERÍODO DE PROVA. AUSÊNCIA DE SUSPENSÃO OU REVOGAÇÃO. EXTINÇÃO DA PENA QUE SE IMPÕE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Supremo Tribunal Federal, sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus substitutivo de recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício, em homenagem ao princípio da ampla defesa. II - Nos termos do entendimento sumulado por esta Corte de Justiça "A ausência de suspensão ou revogação do livramento condicional antes do término do período de prova enseja a extinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena." (Súmula 617, Terceira Seção, DJe de 1º/10/2018). III - Na dicção do art. 145 da LEP, ocorrendo a prática de infração penal durante o período de prova, cumpre ao Juízo da Execução Penal suspender o curso do livramento condicional. A revogação dependerá da decisão final da nova ação penal. IV - Decorrido o período de prova do livramento condicional sem que seja suspenso ou revogado, a pena deve ser extinta, nos termos do art. 90 do Código Penal. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a decisão do Juízo da Execução que julgou extinta a pena privativa de liberdade imposta ao paciente, objeto da execução n. 12 (autos n. 562/2007). (HC 468.418/SP, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 04/10/2018, DJe de 15/10/2018).

 No mesmo sentido, quanto à pena de multa, é também caso de concessão da ordem, a fim de aplicar corretamente o TEMA n. 931 do STJ, resgatando-se a decisão de 1º grau que reconheceu a hipossuficiência do sentenciado, nos seguintes termos: 

Nesta quadra, de rigor se considerar o condenado hipossuficiente, vez que foi defendido pela Defensoria Pública desde a ação de conhecimento, além disso, tal situação já foi reconhecida pelo juiz que proferiu a a r. sentença condenatória ao fixar a multa no valor mínimo legal. (e-STJ fls. 32-33) 

Ante o exposto, CONCEDO A ORDEM para declarar extinta a punibilidade relativa ao PEC 005541396.2010.8.26.0050 na data prevista para o encerramento do período de prova do livramento condicional, nos termos da decisão de 1º grau (e-STJ fls. 31-34). Comunique-se o Tribunal de origem e o Juízo da execução. Publique-se. Intimem-se.

Relator

DANIELA TEIXEIRA

(STJ -  HABEAS CORPUS Nº 971070 - SP (2024/0486671-6) RELATORA : MINISTRA DANIELA TEIXEIRA,  Publicação no DJEN/CNJ de 26/02/2025)

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