STJ Fev25 - Dosimetria Irregular - Homicídio Qualificado - (i) Vetorial da Consequência do Crime Afastado :"com base na idade da vítima, jovem de 26 anos - está além do conceito de vítima de tenra idade, isto é, pessoa menor de 18 anos"; (ii) Aplicação da Atenuante da Confissão - Pena Reduzida de 20 para 13 anos.
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
DECISÃO Tendo em vista as orientações e valores destacados no Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples, o qual está pautado em instrumentos internacionais de direitos humanos e de acesso à Justiça, adoto o relatório de e-STJ fls. 65-66:
Trata-se de habeas corpus substitutivo, sem pedido de liminar, impetrado em favor de CXXXXXXXXXXX(PRESO), contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco no julgamento da Apelação nº 0001638-93.2021.8.17.2100. O paciente foi condenado à pena de 20 anos e 7 meses de reclusão, em regime fechado, pela prática dos delitos previstos no art. 121, §2º, I, do CP, uma vez que, no dia 11/28/2009, por volta das 21h, na cidade Abreu e Lima/PE, em concurso de agentes, por motivo torpe, com recurso que dificultou a defesa, e mediante disparos de arma de fogo, matou Laércio Rafael Coelho de Santana.
A Defesa apelou. Na sessão realizada em 10/12/2024, o TJPE deu parcial provimento ao recurso para redimensionar a pena definitiva do recorrente para 15 anos e 10 meses de reclusão, em acórdão assim ementado:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. CONDENAÇÃO DO RECORRENTE COMO INCURSO NO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 121, § 2º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. DOSIMETRIA DA PENA. PEDIDO DE REDUÇÃO. PENA-BASE MANTIDA. EXCLUSÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. PENA DEFINITIVA REDIMENSIONADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO PARA REDIMENSIONAR A PENA DEFINITIVA DO RECORRENTE EM 15 (QUINZE) ANOS E 10 (DEZ) MESES DE RECLUSÃO, MANTIDA A SENTENÇA QUANTO AO MAIS. DECISÃO UNÂNIME. I – Dosimetria da pena do recorrente reanalisada na presente via recursal e redimensionada. II – Apelo parcialmente provido para redimensionar a pena definitiva do recorrente em 15 (quinze) anos e 10 (dez) meses de reclusão, mantida a sentença quanto ao mais. Decisão unânime. A Defesa impetrou o presente habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, em que alega constrangimento ilegal, em razão da alegada exasperação indevida da pena, especificamente, em relação ao vetor consequências do crime, uma vez que a vítima não mais possui tenra idade. Requer a concessão da ordem a fim de “readequar a dosimetria da pena, excluindo a negativação do vetor consequências do crime. Os autos foram distribuídos à Ministra Relatora, que os remeteu à Procuradoria-Geral da República para manifestação. É o relatório.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus, mas pela concessão da ordem de ofício para afastar a valoração negativa das circunstâncias do crime. (e-STJ fls. 65-68).
É o relatório. Decido.
A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus em substituição a recurso próprio ou a revisão criminal, situação que impede o conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que se verifica flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal.
Veja-se: "O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício" (AgRg no HC n. 895.777/PR, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/4/2024, DJe de 8/4/2024). "De acordo com a jurisprudência do STJ, não é cabível o uso de habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, notadamente quando não há indicação de incidência de alguma das hipóteses previstas no art. 621 do CPP. Precedentes" (AgRg no HC n. 864.465/SC, Relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 18/3/2024, DJe de 20/3/2024).
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no mesmo sentido: "Do ponto de vista processual, o caso é de habeas corpus substitutivo de agravo regimental (cabível na origem). Nessas condições, tendo em vista a jurisprudência da Primeira Turma desta Corte, entendo que o processo deve ser extinto sem resolução de mérito, por inadequação da via eleita (HC 115.659, Rel. Min. Luiz Fux) (...) A orientação jurisprudencial deste Tribunal é no sentido de que o “habeas corpus não se revela instrumento idôneo para impugnar decreto condenatório transitado em julgado” (HC 118.292-AgR, Rel. Min. Luiz Fux). 4. O caso atrai o entendimento desta Corte no sentido de que não cabe habeas corpus para reexaminar os pressupostos de admissibilidade de recurso interposto perante outros Tribunais (HC 146.113-AgR, Rel. Min. Luiz Fux; e HC 110.420, Rel. Min. Luiz Fux). (...) (HC 225896 AgR, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 15/5/2023, DJe de 17/5/2023).
O entendimento é de elevada importância, devendo ser utilizado para preservar a real utilidade e eficácia da ação constitucional, qual seja, a proteção da liberdade da pessoa, quando ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantindo a necessária celeridade no seu julgamento. Inviável, portanto, o conhecimento do writ em análise, porquanto manejado como substitutivo de revisão criminal.
Contudo, cabe conceder a ordem de ofício diante da existência de ilegalidade do ato impugnado.
Na esteira da orientação jurisprudencial desta Corte, por se tratar de questão afeta a certa discricionariedade do magistrado, a dosimetria da pena é passível de revisão em habeas corpus apenas em hipóteses excepcionais, quando ficar evidenciada flagrante ilegalidade, constatada de plano, sem a necessidade de maior aprofundamento no acervo fático-probatório.
Na hipótese dos autos, as instâncias de origem valoraram negativamente as consequências do crime, com base na idade da vítima, jovem de 26 anos. Em que pese a possibilidade de a tenra idade da vítima justificar a elevação da pena-base do crime de homicídio, tenho que essa não é a hipótese dos autos, pois, além de a vítima ser maior - 26 anos - , a idade veio desacompanhada de outras particularidades que pudessem revelar a maior intensidade da lesão jurídica causada, além daquela inerente ao delito em comento.
Com o objetivo de esclarecer inteiramente a questão, colaciono o seguinte precedente da Terceira Seção:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO PERPETRADO CONTRA VÍTIMA DE TENRA IDADE (15 ANOS). VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. DIVERGÊNCIA ENTRE AS TURMAS CRIMINAIS DESTA CORTE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA. DECISÃO MANTIDA. 1. Há divergência entre a Quinta e a Sexta Turmas na questão veiculada no recurso especial, qual seja, se a tenra idade da vítima constituiu fundamento idôneo para agravar a pena-base, especificamente no que se refere ao crime de homicídio, mediante valoração negativa das consequências do crime. 2. Deve prevalecer a orientação da Quinta Turma, no sentido da idoneidade da fundamentação, pois a tenra idade da vítima (menor de 18 anos) é elemento concreto e transborda aqueles ínsitos ao crime de homicídio, sendo apto, pois, a justificar o agravamento da pena-base, mediante valoração negativa das consequências do crime, ressalvada, para evitar bis in idem, a hipótese em que aplicada a majorante prevista no art. 121, § 4º (parte final), do Código Penal. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1851435/PA, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 12/08/2020, DJe 21/09/2020, grifei.)
No mesmo sentido foi o parecer do MPF (e-STJ, fls. 67-68):
A individualização da pena, como atividade discricionária do julgador, está sujeita à revisão apenas nas hipóteses de flagrante ilegalidade ou teratologia, quando não observados os parâmetros legais estabelecidos ou o princípio da proporcionalidade, o que ocorre na espécie. Há ilegalidade na valoração negativa da circunstância do crime de homicídio perpetrado contra vítima de 26 (vinte e seis) anos, pois está além do conceito de vítima de tenra idade, isto é, pessoa menor de 18 anos. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO PERPETRADO CONTRA VÍTIMA DE TENRA IDADE (15 ANOS). VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. DIVERGÊNCIA ENTRE AS TURMAS CRIMINAIS DESTA CORTE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA. DECISÃO MANTIDA. 1. Há divergência entre a Quinta e a Sexta Turmas na questão veiculada no recurso especial, qual seja, se a tenra idade da vítima constituiu fundamento idôneo para agravar a pena-base, especificamente no que se refere ao crime de homicídio, mediante valoração negativa das consequências do crime. 2. Deve prevalecer a orientação da Quinta Turma, no sentido da idoneidade da fundamentação, pois a tenra idade da vítima (menor de 18 anos) é elemento concreto e transborda aqueles ínsitos ao crime de homicídio, sendo apto, pois, a justificar o agravamento da pena-base, mediante valoração negativa das consequências do crime, ressalvada, para evitar bis in idem, a hipótese em que aplicada a majorante prevista no art. 121, § 4º (parte final), do Código Penal. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no R Esp n. 1.851.435/PA, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 12/8/2020, D Je de 21/9/2020.) Manifesta ilegalidade, necessária excepcional concessão da ordem para afastar a valoração negativa das circunstâncias do crime.
Procedo, assim, à readequação da dosimetria, adotando os parâmetros adotados na origem. A pena-base foi fixada em 19 anos de reclusão, com base em 3 vetoriais desfavoráveis.
Excluindo-se a valoração negativa das consequências, estabeleço a pena-base em 16 anos e 6 meses de reclusão.
Na segunda fase da dosimetria, mantida a incidência da fração de 1/6 de redução diante do reconhecimento da atenuante da confissão, a pena intermediária deve ser estabelecida em 13 anos e 9 meses de reclusão.
Por fim, na terceira fase, ausentes causas de aumento e de diminuição, fixo a pena definitiva em 13 anos e 9 meses de reclusão.
O regime inicial de cumprimento de pena deve ser o fechado, na forma do art. 33, § 2º, a, do CP. Ante o exposto, não conheço do habeas corpus substitutivo, mas concedo a ordem de ofício para afastar a valoração negativa das consequências e fixar a pena do paciente em 13 anos e 9 meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime fechado. Comunique-se, com urgência, o teor desta decisão ao Tribunal de origem. Após, dê-se ciência ao Ministério Público Federal. Publique-se. Intime-se.
Relator
DANIELA TEIXEIRA
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