STJ Abr25 - Peculato - Absolvição por Atipicidade - TJES tem Condenação de 11 Anos Anulada - Servidor Público "Fantasma"
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
MAIK XXXXXXXX alega sofrer coação ilegal diante de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo na Apelação Criminal n. 0007768-14.2010.8.08.0006.
O paciente foi condenado, pelo crime de peculato, a 11 anos e 8 meses de reclusão, em regime fechado, mais 348 dias-multa. O Tribunal de origem deu parcial provimento à apelação defensiva, a fim de alterar a pena definitiva do réu para 8 anos e 4 meses de reclusão e 248 diasmulta, mantido o regime fechado. (e-STJ Fl.1567)
Neste habeas corpus, a defesa pede a absolvição do denunciado, em virtude da atipicidade de sua conduta, popularmente conhecida como "funcionário fantasma". Subsidiariamente, requer a redução da pena-base do acusado. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus (fls. 1.563-1.565).
Decido.
O Tribunal de origem assim resolveu a controvérsia (fl. 35, grifei):
Acerca dos fatos relativos ao Recorrente Maik, assim como os demais agentes investigados neste processo, ele não soube explicar quais atividades exerciam. Perguntado, disse não saber quais atividades deveria desempenhar, que comparecia à Câmara uma ou duas vezes por semana e que Paulo Sérgio costumava fazer reuniões com sua assessoria, mas que ele não participava desses encontros. Que às vezes o então vereador comunicava algum compromisso em cima da hora e não dava para o Recorrente comparecer. Assim como os demais agentes envolvidos nesse processo e que foram nomeados como assessores de Paulo Sérgio, Maik não sabia quais eram as funções que devia exercer nem tampouco foi capaz de justificar sua atuação e presença no gabinete. Novamente, não é preciso que haja demonstração cabal da transferência da verba para Paulo Sérgio; basta que reste comprovado - como restou - o fato de os servidores receberem salários pagos pelo Legislativo local para não atuarem regularmente. Ademais, não é de se acreditar que fossem feitas movimentações bancárias regulares para desvio das verbas. Afinal, toda movimentação bancária é rastreável e não se pode crer que um esquema desses passe pelas vias tradicionais.
Como se observa, o paciente foi condenado pelo crime de peculato por receber remuneração, em virtude de seu cargo público, sem a devida contraprestação à administração pública, situação conhecida popularmente como "funcionário fantasma". Todavia, o entendimento esposado pelo Tribunal estadual contraria a jurisprudência desta Corte Superior, de que:
[...] é atípico o ato do servidor que se apropria da remuneração que já lhe pertencia, em razão do (e-STJ Fl.1568) cargo por ele ocupado, mas que não tenha executado, como contraprestação, os servidos inerentes ao cargo público que exerce. Isso porque, apesar da inassiduidade do servidor ou mesmo o abandono de suas funções terem repercussões disciplinares ou no âmbito da improbidade administrativa, tal conduta não se ajusta ao delito de peculato, pois seus vencimentos efetivamente lhe pertenciam (AgRg no AREsp n. 2.398.453/RN, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/9/2023, DJe de 8/9/2023, grifei)
Nesse sentido: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. SUPOSTOS CRIMES DE PECULATO, ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E FALSIDADE IDEOLÓGICA. IMPUTAÇÃO DE CONDIÇÃO CONHECIDA COMO "FUNCIONÁRIO FANTASMA". MERA CONDUTA DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. ATIPICIDADE PENAL. TRANCAMENTO PARCIAL DA AÇÃO PENAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA DA EMBARGANTE POR PECULATO. ART. 397, III, DO CPP. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EFEITOS MODIF ICATIVOS. I - Admitem-se os embargos declaratórios quando houver no decisum ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. Podem também ser admitidos para a correção de eventual erro material, consoante o hoje previsto no Código de Processo Civil, sendo possível também, apenas excepcionalmente, a alteração ou modificação do julgado embargado, nos efeitos infringentes. II - No que tange ao crime de peculato, esta Corte Superior sedimentou que é penalmente atípica a conduta praticada pelo funcionário público que se apropria da remuneração inerente ao cargo, sem a devida contraprestação funcional à Administração, mesmo caracterizando o que se convencionou chamar de "funcionário fantasma". Precedentes. III - No caso concreto, de fato, não há falar em ocorrência de suposto ilícito penal pela embargante. Nesse contexto, é de rigor determinar o trancamento parcial da ação penal, sendo a hipótese de absolvição sumária pela atipicidade da conduta imputada. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para sanar a omissão e dar parcial provimento ao recurso de agravo regimental no recurso ordinário anterior, determinando-se o imediato trancamento parcial da ação penal n. 0039760- 50.2020.8.19.0001 (5ª Vara Criminal da Comarca da Capital do (e-STJ Fl.1569) Documento eletrônico juntado ao processo em 20/04/2025 às 19:10:01 pelo usuário: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS Documento eletrônico VDA46876880 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ROGERIO SCHIETTI MACHADO CRUZ Assinado em: 20/04/2025 18:59:26 Código de Controle do Documento: bc328dfa-1eff-445e-9b37-ba204c202ec6 TJRJ), com a absolvição sumária da embargante em relação ao suposto crime de peculato pela patente atipicidade (art. 397, III, do CPP). (EDcl no AgRg no RHC n. 163.537/RJ, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 26/2/2024, DJe de 29/2/2024, destaquei) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE TRANCOU A AÇÃO PENAL. TESE MINISTERIAL DE PECULIARIDADE DO CASO EM COMENTO. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese, a denúncia narra que "a organização criminosa era estruturada e seus membros possuíam tarefas específicas: alguns aceitavam ocupar cargos sem nenhuma contraprestação laboral [...]; a outros cabia a missão de arregimentar potenciais "servidores fantasmas" [...]; outros cuidavam do recolhimento dos valores decorrentes dos vencimentos pagos aos "servidores fantasmas" [...]; e, por fim, os imprescindíveis detentores de cargos com autoridade para contratar servidores comissionados", esclarecendo que as agravadas, além de outras pessoas, foram contratadas [...], sendo que "nunca exerceram qualquer atividade laboral nos órgãos legislativos nos quais estavam nomead[as]", segundo monitoramentos realizados pela equipe de inteligência do Ministério Público. 2. Forçoso concluir que tais elementos atestam a plausibilidade da tese defensiva, visto que a afirmação de que as agravadas foram "coniventes com a empreitada criminosa desde suas nomeações" não altera a imputação por peculato em decorrência da sua condição de "funcionário fantasma", o que afronta o entendimento desta Corte Superior, visto que "o pagamento de salário não configura apropriação ou desvio de verba pública", "pois remuneração devida" (REsp n. 1.633.248/SE, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de 4/2/2019). 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RHC n. 164.742/GO, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 4/12/2023, DJe de 7/12/2023, destaquei) .
Ante o exposto, concedo a ordem, a fim de, com fundamento no art. 386, III, do CPP, observada a atipicidade de sua conduta, absolver o paciente da imputação relativa ao crime de peculato. Publique-se e intimem-se.
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