STJ Abr25 - Por Ilegal de Arma - Desclassificação do Art. 16 para o Art. 12 da Lei nº 10.826/2003 :"superveniência dos Decretos n. 9.785/2019 e n. 9.847/2019, regulamentados pela Portaria n. 1.222/2019 do Exército Brasileiro"

  Publicado por Carlos Guilherme Pagiola

DECISÃO Trata-se de agravo interposto por XXXXXXX contra decisão que inadmitiu o recurso especial manejado em face de acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE TOCANTINS.

Consoante se extrai dos autos, o eg. Tribunal a quo negou provimento ao recurso de apelação interposto pelo réu, mantendo a condenação pelos crimes de posse irregular de munições de uso restrito e posse irregular de armas e munições de uso permitido, previstos nos artigos 12 e 16, caput, ambos da Lei 10.826/2003, sob o fundamento de que as teses defensivas não foram apresentadas em sede de apelação, caracterizando inovação recursal (fls. 564-582).

Os embargos de declaração então opostos foram rejeitados, sob a alegação de inexistência de omissão no julgado e inovação de tese jurídica (fls. 661-674).

No recurso especial, interposto com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, o insurgente alegou violação aos artigos 2º, parágrafo único, do Código Penal; 158 e 619 do Código de Processo Penal; e aos artigos 9º da Convenção Americana de Direitos Humanos e 15.1 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, pleiteando a reforma do acórdão para desclassificar a conduta para o delito do art. 12 da Lei nº 10.826/2003, em razão de mudanças regulamentares que alteraram o conteúdo dos tipos penais (fls. 683-721).

Apresentadas as contrarrazões, o Ministério Público do Estado do Tocantins sustentou a negativa de seguimento ao recurso especial, por ausência de prequestionamento e necessidade de revolvimento probatório (fls. 788-792).

Sobreveio juízo negativo de admissibilidade fundado na incidência da Súmula 7 do STJ, pois a análise das questões suscitadas implicaria reexame do contexto fático-probatório dos autos (fls. 803-806).

Nas razões do agravo, postula-se o processamento do recurso especial, haja vista o cumprimento dos requisitos necessários à sua admissão e a não incidência da Súmula mencionada (fls. 850-887).

O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo não provimento do agravo (fls. 950-953).

É o relatório. DECIDO.

O agravo enfrenta de forma apropriada a decisão de inadmissibilidade do recurso especial, razão pela qual passo a analisar o recurso especial. De antemão, o recurso especial não pode ser conhecido quanto à divergência jurisprudencial (art. 105, III, “c”, da CRFB), pois não foram atendidos os requisitos necessários para a comprovação do alegado dissídio. Com efeito, não houve a transcrição do voto paradigma, nem o cotejo analítico entre o acórdão recorrido e o divergente, demonstrando, de forma clara, a identidade das situações fáticas e a interpretação distinta atribuída por Tribunal ao mesmo dispositivo de legislação infraconstitucional, devidamente particularizado.

A ausência no atendimento dessa exigência formal impede o conhecimento do recurso, nos termos dos arts. 1.029, § 1.º, do Código de Processo Civil e 255, § 1º, do Regimento Interno. Nesse sentido:

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR. LESÃO CORPORAL CULPOSA. ALEGAÇÃO DE AFRONTA A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE DE ANÁLISE NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. PRETENSA AFRONTA À SÚMULA N.º 6/STJ. DESCABIMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ACÓRDÃO PARADIGMA PROFERIDO EM HABEAS CORPUS. DESCABIMENTO. DEMAIS JULGADOS TIDOS POR PARADIGMA. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICOPROBATÓRIO.INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. [...] 4. No tocante aos demais julgados tidos por paradigma, o alegado dissídio pretoriano não foi demonstrado nos moldes dos arts. 1.029, § 1.º, do Código de Processo Civil e 255, § 1.º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, pois não houve o devido cotejo analítico entre os julgados apontados como divergentes. [...] 6. Agravo regimental desprovido." (AgRg no AREsp 1414307/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 24/05/2019).

No que diz respeito à nova categorização da munição passando a configurar artefato de uso permitido, essa tese não foi objeto de apelação e a oposição de embargos para debater a matéria não é suficiente para atender ao requisito do prequestionamento, acarretando a incidência dos óbices contidos nas Súmulas n. 282 e 356 do STF, respectivamente:

"É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada"; "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento"

É o caso, portanto, de não conhecer o recurso especial. Todavia, vislumbro hipótese de concessão da ordem de habeas corpus de ofício, nos termos do art. 647-A, caput e parágrafo único, do Código de Processo Penal.

Isso porque, verificando-se que o paciente foi condenado pela posse irregular de munição de uso restrito, em razão de terem sido encontrados, no dia 13/10/2016, cartuchos de calibre .40W e 357 MAG, mister se faz a desclassificação da conduta, ante a superveniência dos Decretos n. 9.785/2019 e n. 9.847/2019, regulamentados pela Portaria n. 1.222/2019 do Exército Brasileiro.

Com efeito, por força dos Decretos 9.785/2019 e 9.847/2019, as munições apreendidas passaram a ser consideradas como de uso permitido após alteração normativa.

Nesse passo "a norma penal posterior deve incidir de forma imediata a fatos anteriores, mesmo que decididos por sentença transitada em julgado, quando favorecer de qualquer modo o agente, em harmonia com o princípio constitucional da retroatividade da lei penal mais benigna inserto no artigo 5º, inciso XL, da CF/88 e artigo 2º, parágrafo único, do CP" (HC n. 602.237/SP, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/11/2020). No mesmo sentido, EDcl no AgRg no AREsp n. 1.439.001/DF, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 17/12/2019; e EDcl no AgRg no AREsp n. 1.504.993/SP, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 25/08/2020, DJe 09/09/2020.

Necessária, assim, a readequação da reprimenda, fazendo incidir unicamente a pena definitiva fixada para o crime de posse de arma de fogo de uso permitido, pois os armamentos foram apreendidos no mesmo contexto fático, com o reconhecimento de crime único.

Ante o exposto, conheço do agravo para não conhecer do recurso especial, nos termos do art. 253, parágrafo único, inciso II, "a", do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, concedo a ordem de habeas corpus de ofício para desclassificar a conduta do paciente do art. 16 para aquela prevista no art. 12 da Lei n. 10.826/2003, redimensionando a sua pena definitiva para 01 ano e 15 dias de detenção e 12 dias-multa . Publique-se. Intimem-se.

Relator

MESSOD AZULAY NETO

(STJ - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1848837 - TO (2021/0070640-9) RELATOR : MINISTRO MESSOD AZULAY NETO, Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025)

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