STJ Fev25 - Busca e Apreensão Nulas - MPF não instruiu a Inicial com documento e TJDF acessou de Ofício outros Autos para Autorizar a Operação - Corrupção - Lavagem - Orcrim - Devolução de Todos Aparelhos Eletrônicos e Ilegalidade das Mensagens Extraídas - Operação Maré Alta
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de PAXXXXXXXX contra julgado do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS (apelação criminal n. 724812-90.2023.8.07.0001).
Consta dos autos que (fl. 24): [...] os fatos são investigados pela 2ª Promotoria de Defesa da Saúde – 2ª PROSUS, no Procedimento de Investigação Criminal nº 08190.038671/21-72 (retombado e aditado no NeoGab como PIC nº 08192.014812/2023-39), instaurado em dezembro de 2021, a partir de representação do Deputado Distrital Leandro Grass, que relatava possíveis irregularidades na locação do Edifício PO 700, para abrigar a nova sede da Secretaria de Saúde do Distrito Federal – SES. O PIC citado visa apurar a prática, em tese, de crimes previstos no artigo 89, caput e parágrafo único (dispensa indevida de licitação), e no artigo 90 (fraude ao caráter competitivo da licitação), ambos da Lei nº 8.666/1993; artigos 317 e 333 do Código Penal (corrupção passiva e corrupção ativa); e artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa).
Daí o presente habeas corpus, no qual a defesa afirma que o paciente sofre constrangimento ilegal, ante a determinação de uma nova busca e apreensão, infundada e infrutífera, nas suas palavras. Assere que a medida seria "desnecessária e ineficaz para os fins pretendidos, uma vez que o paciente havia sido buscado anteriormente, em 2021, no contexto da Operação Maré Alta, momento em que documentos, dispositivos eletrônicos e celulares do paciente que continham registros anteriores a 2021 foram apreendidos" (fl. 4, grifei).
Invoca que a decisão que indeferiu a busca já havia ressaltado "a) ineficácia para apurar fatos antigos (2020); e b) incompetência da 5ª Vara Criminal de Brasília para eventuais fatos posteriores, os quais deveriam ser submetidos a livre distribuição.
Afastar tal fundamentação significa legitimar verdadeira fishing expedition contra o paciente" (fl. 5, grifei). Sustenta, ainda, que o acórdão se utilizou de fundamentação per relationem de forma indevida, pois "se vale de desmedida e velada fundamentação [...] para autorizar a busca e apreensão contra o paciente e sua empresa, adotando as manifestações do MPDFT como razões de decidir, sem acrescentar as próprias razões, o que é vedado pelo STJ" (fl. 15).
Assim como que "o MPDFT deixou de instruir o pedido com cópia do processo administrativo n. 00060-00517222/2019-61, que tratou da locação de imóvel para abrigar a sede da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, ou seja, o fato que justificaria a nova busca e apreensão, o que impediria a correta compreensão do pedido de busca. Entretanto, em vez de julgar improcedente a apelação do MPDFT, a 3ª Turma Criminal, de ofício, acessou informações constantes de outro processo com o intuito de suprir a instrução deficitária da busca e apreensão pela acusação" (fl. 5, grifei).
Nesse contexto, aduz que "a medida cautelar de busca e apreensão, no presente caso, é ilegal por falta de contemporaneidade e adequação. Tanto é assim que a 3ª Turma Criminal do TJDFT foi incapaz de reformar esses fundamentos – que remanescem hígidos – lançados na decisão da 5ª Vara Criminal de Brasília para indeferir a medida cautelar de busca e apreensão" (fl. 11, grifei).
Por fim, destaca que "A urgência exigida para a concessão de liminar decorre do fato de que a autoridade policial representou pelo compartilhamento de provas nos autos da busca e apreensão n.º 0724812-90.2023.8.07.0001 para deflagrar medidas [...] e o MPDFT noticiou a existência de outras medidas cautelares em curso contra o paciente [...], bem como compartilhou os documentos buscados e apreendidos para subsidiar investigações em curso no TCDF" (fls. 18-19).
Requer, inclusive liminarmente, "a concessão de medida liminar urgente para suspender os efeitos do acórdão do TJDFT que determinou a busca e apreensão, com determinação para que o material apreendido fique acautelado na 5ª Vara Criminal de Brasília e que o curso das medidas cautelares requeridas contra o paciente fique suspenso, tudo até o julgamento do mérito deste writ.
No mérito, os impetrantes requerem a concessão da ordem de habeas corpus para declarar a nulidade da busca e apreensão decretada contra o paciente, seja porque o ato coator foi emanado em abuso de autoridade; seja em razão das violações à inércia da jurisdição e à ampla defesa, consideradas as provas emprestadas; seja porque a fundamentação do ato coator é, além de genérica, inidônea por ter se valido de desmedida e velada fundamentação per relationem; ou, então, porque não há qualquer eficácia, utilidade e contemporaneidade para se decretar, em 2023, busca e apreensão de elementos de informação sobre fatos supostamente ocorridos em 2020 quando, em 2021, o MPDFT já havia apreendido tudo o que foi novamente buscado no domicílio do paciente em 2023" (fl. 20, grifei).
Liminar deferida (fls. 1081-1084). Informações, às fls. 1091-1099 e 1100-1135. Petições das defesas (fls. 1138-1139, 1146-1153 e 1154-1162). O Ministério Público Federal oficiou pelo "não conhecimento do habeas corpus, cassando-se a liminar antes deferida" (fls. 1141-1144).
É o relatório. DECIDO.
A Terceira Seção, no âmbito do HC n. 535.063/SP, de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/6/2020, e o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do AgRg no HC n. 180.365/PB, de relatoria da Ministra Rosa Weber, julgado em 27/3/2020, consolidaram a orientação de que não cabe habeas corpus substitutivo ao recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
Nesse sentido:
[...] A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus em substituição a recurso próprio ou a revisão criminal, situação que impede o conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que se verifica flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal. [...] (AgRg no HC n. 908.122/MT, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 27/8/2024, DJe de 2/9/2024.) [...] O habeas corpus não é conhecido quando impetrado em substituição a recurso próprio, salvo em caso de flagrante ilegalidade, conforme jurisprudência pacífica do STJ e do STF. [...] (AgRg no HC n. 935.569/SP, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em 3/9/2024, DJe de 10/9/2024.)
Em homenagem ao princípio da ampla defesa, contudo, necessário o exame da insurgência, a fim de se verificar eventual constrangimento ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.
A controvérsia consiste em se analisar a medida cautelar de busca e apreensão deferida (após provimento ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios no TJDFT), já no ano de 2023, nos autos da ação penal n. 724812-90.2023.8.07.0001, em trâmite na 5ª Vara Criminal de Brasília/DF.
No presente caso, da análise dos elementos informativos constantes dos autos, como até mesmo já, em parte, adiantado quando do deferimento da liminar, verifico uma flagrante ilegalidade a legitimar a atuação deste Sodalício, ainda que de ofício.
Primeiramente, a defesa invoca o fato de que o paciente já teria sido buscado anteriormente no contexto da "Operação Maré Alta" (2021), quando documentos e dispositivos eletrônicos em geral foram apreendidos, e que, na ocasião, a decisão de indeferimento já havia ressaltado tanto a "ineficácia para apurar fatos antigos (2020)" quanto a "incompetência da 5ª Vara Criminal de Brasília para eventuais fatos posteriores" (fl. 5, grifei).
Para ilustrar, trago a decisão de indeferimento inicial, pelo juízo, da busca e apreensão que acabou reformada e autorizada pelo TJDFT (fls. 1094-1095):
[...] Inicialmente, cumpre frisar que, em 17/05/2022, foi distribuído a esta 5ª Vara Criminal de Brasília o feito n. 0717524-28.2022.8.07.0001, no qual o Ministério Público representou pela quebra de sigilo bancário de Beatris Gauterio de Lima, Jaqueline Helena Vekic e Paulo Octavio Hotéis e Turismo LTDA, a fim de dar continuidade às investigações que correm no PIC 08190.038671/21-72, onde se apuram os crimes de corrupção ativa e passiva quando da locação do imóvel Edifício PO 700, para abrigar a nova sede da Secretaria de Saúde do Distrito Federal – SES/DF. Segundo consta da representação de ID 161901989, apuram-se crimes perpetrados, em tese, no âmbito da Secretaria de Saúde, tendo em vista que nos meses de novembro e dezembro de 2020, os investigados PAULO OCTÁVIO ALVES PEREIRA, BEATRIS GAUTERIO DE LIMA, JAQUELINE HELENA VEKIC e BRUNO TEMPESTA, em unidade de desígnios e repartição de tarefas, dispensaram licitação fora das hipóteses legais, frustraram e fraudaram o caráter competitivo do Processo Administrativo n. 00060-00517222/2019-61, que trata do Edital de Chamamento Público n. 001/2020 – SES DF para a locação de imóvel para instalação da unidade de Administração Central da Secretaria de Saúde, [...]. Desse modo, os fatos pelos quais este Juízo é prevento teriam ocorrido há mais de dois anos, sendo certo que a medida de busca e apreensão ora pleiteada constitui instrumento cujo deferimento pressupõe contemporaneidade da prática da infração penal investigada, ou ao menos elementos concretos e robustos indicativos de que a medida será frutífera para angariar provas e/ou indícios dos delitos ocorridos em 2020. Na espécie, os fatos investigados são antigos e não foram apontados pela autoridade representante elementos suficientes que demonstrem que a medida requerida será exitosa para colher provas dos fatos em investigação. Entendo que o apontamento, pelo representante, de que dois dos investigados teriam mantido conversas suspeitas nos anos de 2020 e 2021 não se mostra suficiente para demonstrar concretamente que busca e apreensão autorizada neste momento, em junho de 2023, promoveria a coleta de provas de fatos ocorridos há alguns anos. Rememore-se que este feito foi distribuído por dependência a esta unidade judiciária em razão da prevenção decorrente dos autos n. 0717524-28.2022.8.07.0001. Importa frisar que neste último feito os fatos investigados datam de 2020, sendo certo que fatos outros, mais recentes ou não, caso haja indícios de prática delituosa, devem ser investigados em procedimentos próprios, sujeitos à livre distribuição entre as Varas Criminais de Brasília. Raciocínio contrário implicaria inaceitável ofensa ao princípio do Juiz natural. Em relação ao tema, não se pode admitir que eventuais aditamentos, no âmbito do Ministério Público ou da Polícia, levados a efeito em procedimentos administrativos investigatórios, para abarcar fatos outros além daqueles que originaram o procedimento, afetariam de qualquer modo as leis processuais que regem competência jurisdicional. Por conseguinte, INDEFIRO os pedidos formulados pelo Ministério Público na representação de ID 161901989. (grifei) Já o acordão de apelação criminal n. 0724812-90.2023.8.07.0001, aqui apontado como ato coator, consignou que (fls. 25-35): [...] o Ministério Público, em sede recursal, requereu deferimento de busca e apreensão em face de investigado que não havia sido mencionado no pedido inicial, qual seja, Unha de Princesa Serviços de Estética e Esmalteria LTDA, empresa da qual BEATRIS GAUTÉRIO é sócia (fl. 268). Se não houve pedido em relação à referida parte perante o Juízo a quo, não se admite o conhecimento da matéria nesta via, sob pena de supressão de instância.[...] Assim, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso do Ministério Público, apenas em relação aos investigados BEATRIS GAUTÉRIO DE LIMA, JAQUELINE HELENA VEKIC, PAULO OCTÁVIO ALVES PEREIRA, BRUNO TEMPESTA, PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA e PAULO OCTÁVIO INVESTIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA. [...] considerando que o presente feito não foi instruído com o processo administrativo nº 00060-00517222/2019-61 – que tratou da locação do Edifício PO 700 para abrigar a nova sede da Secretaria de Saúde do Distrito Federal –, farei uso das informações constantes na apelação criminal nº 0717524-28.2022.8.07.0001, de minha Relatoria, que trata do mesmo caso, onde foi requerida quebra de sigilo bancário [...] a medida foi postulada com o objetivo de subsidiar Procedimento de Investigação Criminal instaurado e aditado pelo Ministério Público, visando apurar supostas irregularidades na formalização de contrato de locação de imóvel da nova sede da Secretaria de Saúde – SES, com dispensa de licitação, entabulado com a empresa PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA, e que configurariam, em tese, os crimes [...]. A investigação teve início após denúncias de que BEATRIS GAUTÉRIO, que ocupou diversos cargos na SES na época dos fatos e proferiu despachos e encaminhamentos no processo administrativo que culminou com a contratação (processo SEI 00060-00517222/2019-61), possuía relações pessoais com JAQUELINE VEKIC, representante legal da empresa PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA na época dos fatos e responsável pelo contrato, que seriam em tese evidenciadas por notícias divulgadas pela imprensa da época (https://globoplay. globo. com/v/9072266/) e pela fotografia de fl. 717, retirada das redes sociais, que registra a presença de JAQUELINE na inauguração da ESMALTERIA UNHA DE PRINCESA, empresa da qual BEATRIS é sócia. Pelo que consta dos autos, o processo administrativo que tratou da contratação (Processo SEI 00060-00517222/2019-61) se originou do Memorando SEI-GDF nº 456/2019, de 18/12/2019, no qual o então Subsecretário de Administração Geral da SES, Eduardo Seara Machado Pojo do Rego, colaciona fotografias do prédio que abrigava a Secretaria e questionava a Diretoria Executiva do Fundo de Saúde do Distrito Federal sobre a existência de orçamento para reformá-lo, com a contratação de aluguel temporário de espaço até a conclusão da obra. Com base no despacho do Diretor de Análise e Execução Orçamentária do Fundo de Saúde, BEATRIS GAUTÉRIO, então Diretora Executiva Substituta do Fundo de Saúde, informou a disponibilidade para as duas demandas. Em seguida, Eduardo Seara destacou que as fotografias que instruíram a manifestação inicial demonstravam que as condições do prédio poderiam “reincidir em acidentes acometendo a integridade física de servidores” (sic), encaminhou o processo administrativo para a Subsecretaria de Infraestrutura em Saúde (SINFRA), a qual, pelo servidor Isaque Costa de Albuquerque, pontuou a existência de contrato de manutenção predial vigente e solicitou, em 6/1/2020, que fosse oficiado ao executor do contrato, Leandro Drummond, para manifestação. Conforme bem destacado pelo Ministério Público, não consta qualquer manifestação do executor do contrato. Porém, mesmo assim, no dia 15/1/2020, Isaque emitiu novo despacho, desta vez comunicando que “diante da situação apresentada [...], envolvendo uma análise com o corpo técnico de engenharia desta SINFRA evidenciou-se a necessidade de reforma completa do edifício”. Foi destacado que o trabalho envolveria reforma total do telhado, sistema hidráulico, elétrico, esgoto e ambientes internos. Que o orçamento estimado para a manutenção predial corretiva seria insuficiente para realizar a obra e caso a integralidade do recurso fosse utilizada, não haveria valores para posterior manutenção corretiva demandada no curso do contrato. Nesses termos, solicitou manifestação sobre qual seria a solução mais adequada e que geraria menor impacto na funcionalidade dos setores. Assim, em 20/3/2020, Eduardo Seara, na condição de Secretário Adjunto de Gestão de Saúde, solicitou à SINFRA a elaboração de Projeto Básico para a locação de imóvel para atender às necessidades da Administração Central da Secretaria, para posterior abertura de chamamento público. Em 26/3/2020, salientando as precárias condições do edifício até então ocupado e insuficiência de recursos para a obra/reforma, solicitou orientação ao Secretário de Saúde Francisco Araújo Filho, que determinou o prosseguimento das medidas necessárias à locação de novo espaço. Após a juntada do Projeto Básico, a Gerência de Planejamento Orçamentário em Saúde informou que a locação de imóvel não estava contemplada no programa orçamentário daquele exercício, mas que poderia ser incluído no Plano Plurianual 2020-2023, desde que fosse suplementado, uma vez que a despesa não estava incluída no plano interno e o valor aprovado na LOA/2020 era insuficiente. O referido Projeto Básico foi elaborado com base na informação da Diretoria de Planejamento, Monitoramento e Avaliação de Trabalho que apontou quantitativo de 2.668 (dois mil, seiscentos e sessenta e oito) servidores lotados na SES, e descreveu como objeto: “imóvel para aluguel com área de 12 mil m² a 15 mil m² para atendimento das necessidades da Secretaria de Saúde SES”. Em 20/7/2020, Eduardo Seara proferiu despacho informando que para atendimento das necessidades da Administração Central, seria necessário um imóvel que comportasse 1.590 (um mil, quinhentos e noventa) servidores, mais o público a ser atendido. Foi elaborado novo Projeto Básico, que não mais indicou a metragem do imóvel buscado e passou a descrever o objeto como “imóvel para aluguel com área para acomodação de 1.590 servidores para atendimento das necessidades da Secretaria de Saúde – SES”. Em 11/8/2020, Eduardo Seara pontuou que o quantitativo de servidores levantado não considerou o teletrabalho e a carga horária reduzida de alguns deles, solicitando então novo levantamento, o qual informou que o imóvel deveria comportar 1.324 (um mil, trezentos e vinte e quatro) servidores. Adveio novo projeto básico, cujo objeto era “imóvel para aluguel com área para acomodação de 1.324 (...) servidores para atendimento da Secretaria de Saúde – SES”, sendo este o chamamento publicado. O referido chamamento omite a metragem da área necessária do imóvel a ser locado, referindo-se apenas à capacidade para a acomodação da quantidade de servidores ali indicada, em descompasso com o previsto no artigo 3º, inciso VII, do Decreto Distrital nº 33.788/2012: Art. 3º Os processos administrativos relativos à locação de imóveis por órgãos da Administração Direta e Indireta do Distrito Federal deverão ser instruídos com a apresentação de: [...] VII - metragem da área necessária às instalações pretendidas; [...] Referida omissão, que também foi pontuada na Nota Jurídica nº 1062/2020 da Assessoria Jurídico-Legislativa, instada a se manifestar somente após a publicação do aviso e a emissão do Parecer Técnico por parte da Banca Examinadora, além de contrariar a legislação que rege a matéria pode, inclusive, ter dificultado a apresentação de propostas por possíveis interessados. Em reforço, tem-se que após a publicação do aviso, Luci Rodrigues, representante do Venâncio Shopping, além de Ricardo Filho, questionam qual seria a metragem do espaço. A Secretaria, por sua vez, respondeu apenas a Luci Rodrigues, informando que “todas as informações necessárias constam do Edital e no anexo I do Edital, inclusive o Apêndice I e Apêndice II”. Após a publicação do aviso, BEATRIS GAUTÉRIO DE LIMA, que então ocupava o cargo de Secretária Adjunta de Gestão em Saúde, indicou os servidores que iriam compor a Banca Examinadora, a qual elaborou parecer técnico que concluiu que das seis propostas apresentadas, apenas duas foram consideradas aptas: Edifício Capital Financeiro e Edifício PO 700. Em seguida BEATRIS GAUTÉRIO emitiu despacho sugerindo que o Edifício PO 700 era mais vantajoso para a Administração Pública, sem demonstrar, de maneira fundamentada e transparente, os motivos de tal conclusão, limitando-se a considerá-la mais econômica (fl. 696), o que foi acatado pelo Secretário de Saúde na época, Osnei Okumoto, que determinou o prosseguimento do feito para efetiva contratação. Conforme salientado pelo Ministério Público, a proposta do edifício da a Capital Financeiro, era no valor anual de R$ 14.330.000,04 (quatorze milhões, trezentos e trinta mil reais e quatro centavos) por uma área de 24.500m², enquanto a PO 700 era de R$ 12.302.694,00 (doze milhões, trezentos e dois mil e seiscentos e noventa e quatro reais) por ano, para área de 14.109.74m². BEATRIS GAUTÉRIO solicitou à TERRACAP a emissão de laudo de avaliação do imóvel, sendo então apresentado o documento nº 832/2020, que apontou valor mensal de R$ 624.000,00 (seiscentos e vinte e quatro mil reais), ou seja, R$ 183.077,13 (cento e oitenta e três mil, setenta e sete reais e treze centavos) a menos do que o valor cobrado. A TERRACAP emitiu novo Laudo de Avaliação nº 890/2020, adotando a metodologia da avaliação intervalar, que apontou que “o intervalo de valores admissíveis em torno do valor arbitrado, referente ao valor de mercado para a locação anteriormente indicado, com base no item A.10 da NBR 14.653-2:2011, varia entre o mínimo de R$ 558.777,72 (quinhentos e cinquenta e oito mil setecentos e setenta e sete reais e setenta e dois centavos) e o máximo de R$ 755.993,38 (setecentos e cinquenta e cinco mil novecentos e noventa e três reais e trinta e oito centavos)” (fl. 709). Novamente instada a se manifestar, a empresa PAULO OCTÁVIO HOTÉIS E TURISMO readequou a proposta ao valor correspondente ao máximo apurado pela TERRACAP. No dia seguinte (13/11/2021) foi realizada reunião da qual participaram BEATRIS GAUTÉRIO (Secretária-Adjunta do Gabinete da SES), BRUNO TEMPESTA (Secretário-Adjunto de Gestão em Saúde da SES), Cleber Sipoli (Chefe de Gabinete da SES), Raphael Sampaio (Assessor Jurídico-Legislativo da SES) e os representantes da empresa PAULO OCTÁVIO HOTEIS E TURISMO, JAQUELINE VEKIC e Luiz Fernando Almeida de Domenico. Da leitura da respectiva ata (fl. 713), afere-se que após o Assessor Jurídico ponderar sobre a necessidade de se observar o Decreto nº 33.788/2012 e a margem entre o menor e o maior valor apontado pela TERRACAP, JAQUELINE VEKIC informou que poderia aceitar o pagamento de R$ 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil reais) ao mês, citando três laudos de empresas que avaliaram no mesmo valor o espaço a ser alugado. Mencionou que a empresa PAULO OCTÁVIO HOTEIS E TURISMO possui três outros contratos com órgãos públicos naquela edificação e que todos estão em valor superior ao proposto para a SES. Raphael sugeriu que a empresa acostasse documentos com o valor final, com a discordância do valor sugerido pela TERRACAP e com argumentos que justificassem a inviabilização da locação pelo valor proposto, respaldando que “é preciso um respaldo técnico da empresa para a SES-DF se manifestar. E ainda contendo as vantagens econômicas da locação”. BEATRIS GAUTÉRIO, em defesa da escolha da empresa PAULO OCTÁVIO, “citou os serviços oferecidos pelo locador: recepção, brigada de incêndio, vigilância, segurança, limpeza, manutenção e monitoramento das áreas comuns, fornecimento de água e tratamento de esgoto, e ainda o mobiliário”. Ao final ficou acordado a empresa PAULO OCTÁVIO enviaria documentação contendo o valor final da proposta e a justificativa para o cálculo apresentado. Após o preenchimento da Tabela de Previsão de Custos pelos setores competentes, BRUNO TEMPESTA encaminhou o feito para a realização das instruções finais com vistas à celebração do contrato. Ressaltou que “há que se observar que dentro desse preço a Secretaria de Saúde terá a vantajosidade de não se ter custos com os serviços de Brigadistas de Incêndio, Vigilância e Segurança nas vias de acesso do prédio (garagem e pedestres), manutenção predial e monitoramento, já que esses serviços estão ofertados na proposta da empresa”. Em 2/12/2020 foi celebrado o contrato n° 042374/2020 no valor de R$ 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil reais) mensais, pelo período de 36 (trinta e seis) meses, perfazendo total de R$ 27.000.000,00 (vinte e sete milhões de reais). Ocorre que o Corpo Técnico do Tribunal de Contas do Distrito Federal apontou que embora o valor contratado esteja adequado aos limites estabelecidos no segundo laudo da TERRACAP, é superior ao de contratações firmadas com outros agentes públicos, pactuadas na mesma época, tendo por objeto instalações no mesmo edifício. Segundo apurado na ocasião, o valor contratado pela SES-DF seria 64% (sessenta e quatro por cento) superior ao pactuado com o IGES-DF em novembro de 2019 e 35% (trinta e cinco por cento) superior ao proposto na mesma época ao SERPRO, para locação de instalações do mesmo prédio, em julho de 2020. Tal informação contradiz o que JAQUELINE VEKIC, representante da empresa, mencionou na reunião ocorrida em 13/11/2020. Relevante destacar, ainda, que no curso das investigações o d. Juízo da 1ª Vara Criminal de Brasília determinou o compartilhamento de conversas de WhatsApp entre PAULO OCTÁVIO ALVES PEREIRA e BRUNO TEMPESTA, que na época da contratação ocupava cargo comissionado de Secretário Adjunto de Gestão em Saúde na SES, obtidas em cumprimento a outra operação, as quais denotam, ao menos em tese, que “BRUNO TEMPESTA agia sob orientação e buscando os interesses do particular PAULO OCTÁVIO, em completa inversão dos princípios basilares que regem a Administração Pública” (fl. 127). Conforme consta do Relatório nº 14/2023 – DI/GAECO/MPDFT (fls. 121/172), no dia 7/12/2020, BRUNO TEMPESTA encaminha a PAULO OCTÁVIO uma peça do Processo SEI nº 00060-00517222/2019-61, de acesso restrito (fl. 127). Em seguida escreve: “Boa tarde Dr. O documento no processo que falei para o senhor. Nele está todo arrazoado, onde faço a escolha pelo PO 700. Estou às ordens”. Em seguida BRUNO TEMPESTA encaminha um emoji que representa um sinal de continência (fl. 129). No dia 8/12/2020 PAULO OCTÁVIO encaminhou fotos de supostas estações de trabalho que seriam ocupadas pela SES/DF no PO 700 e BRUNO TEMPESTA confirmou o recebimento e informou que havia internet no prédio (fl. 130). Em 11/12/2020, BRUNO TEMPESTA encaminhou a PAULO OCTÁVIO documentos relativos à Representação nº 92/2020 formulada pelo Ministério Público de Contas junto ao TCDF, apontando irregularidades na locação (fls. 131/132). No dia 19/12/2020, após o TCDF solicitar explicações à SES/DF, PAULO OCTÁVIO enviou para BRUNO TEMPESTA o contato de Herman Ted, advogado de PAULO OCTÁVIO no processo em trâmite na Corte de Contas (fl. 134). Horas depois, BRUNO TEMPESTA envia documento de nome “Resposta ao TCDF – PRIMEIRA VERSÃO”, e a seguinte mensagem: Boa tarde Dr. Paulo Octávio! Finalizei a defesa, está na primeira versão, estou enviando ao senhor para passar ao Dr Herman. Se for o caso, pode passar o meu contato para ele, assim poderei esclarecer quaisquer pontos que possam pairar dúvidas, ou até mesmo alinharmos estratégias. (fl. 138 – grifo nosso). Constam também mensagens trocadas no dia 29/1/2021 que indicam que BRUNO TEMPESTA e PAULO OCTÁVIO se encontraram na sede da empresa deste, pois o primeiro informa que está a caminho e pergunta se deve entrar pela recepção do Manhatan. Após PAULO OCTÁVIO responder que seria ao lado, BRUNO diz “daqui a pouco estarei aí. Até já” e mais uma vez manda um emoji de continência (fl. 145). No dia 4/2/2021, BRUNO TEMPESTA encaminhou cópia de documentos assinados por ele, relativos ao contrato em questão e acrescentou “Missão dada, missão cumprida”, com o mesmo emoji batendo continência (fl. 151). No dia 1/3/2021, BRUNO TEMPESTA envia a seguinte mensagem a PAULO OCTÁVIO: Boa noite Presidente. Tudo bem com o senhor? Passando para lhe informar que o pagamento de dezembro foi executado. Agora estou correndo para pagar o mês de janeiro. Esse será mais rápido. (fl. 151 - grifo nosso). Em 3/3/2021, BRUNO TEMPESTA pergunta a PAULO OCTÁVIO como estaria a agenda dele entre 16h00 e 17h00 pois pretendia visitá-lo, não havendo resposta (fl. 154). No dia 7/4/2021, véspera da publicação da exoneração de BRUNO TEMPESTA, constam duas ligações perdidas para PAULO OCTÁVIO e a mensagem “Bom dia Presidente! Assim que puder me liga, tenho uma informação urgente para passar pro Senhor”. Verificam-se, ainda, duas mensagens, encaminhadas mais tarde e que foram apagadas por BRUNO TEMPESTA (fl. 158). Mesmo após a saída de BRUNO TEMPESTA da Secretaria, a troca de mensagens continuou. Em 12/4/2021, BRUNO envia o seguinte texto: Bom dia Presidente! Tudo bem?! Para manter o senhor informado. Conforme lhe falei, o Zé Humberto pediu para eu ir lá hoje. Não aconteceu nada demais. Ele queria saber como estou, dizer que achou desproporcional como foi feito, e que o governo e o governador tem uma boa imagem de mim. Sigo à disposição. (fl. 160). Após PAULO OCTÁVIO responder com um emoji de um polegar para cima, BRUNO TEMPESTA prossegue: “Ah! O Gov. Paco me viu no corredor, conversou comigo rapidinho, e pediu para eu ir amanhã no GAB dele”, enviando mais uma vez uma figura de continência (fl. 161). Em 17/11/2021, BRUNO TEMPESTA pede que PAULO OCTÁVIO o receba juntamente como o Comandante Geral e com o Subcomandante Geral do Corpo de Bombeiros, no que PAULO OCTÁVIO responde positivamente (fl. 169). No dia 6/12/2021, BRUNO TEMPESTA pediu “uma força” para que PAULO OCTÁVIO atuasse junto ao Governador na promoção de BRUNO por merecimento na carreira de oficial do Corpo de Bombeiros do DF (fl. 170). No dia 14/12, novamente pediu para PAULO OCTÁVIO para reforçar o pedido com o Governador, tendo PAULO OCTÁVIO respondido “já reforcei.” (fl. 171). Cumpre observar que segundo o Diário Oficial do Distrito Federal (nº 242, 28/12/2021, pág. 67), BRUNO TEMPESTA foi contemplado, naquele mês, com a promoção ao posto de Coronel do CBMDF (fl. 171). Nesse contexto, percebe-se que em relação a BEATRIS GAUTÉRIO, JAQUELINE VEKIC, BRUNO TEMPESTA e PAULO OCTÁVIO ALVES PEREIRA existem indícios razoáveis de participação em crimes licitatórios, corroborados pela constatação do TCDF quanto ao superfaturamento do contrato, pela relação pessoal previamente existente entre BEATRIS GAUTÉRIO e JAQUELINIE VEKIC e pelas conversas entre BRUNO TEMPESTA e PAULO OCTÁVIO. Ainda que a extensão da quebra do sigilo bancário em relação a BEATRIS GAUTÉRIO e JAQUELINE VEKIC tenha sido indeferida nos autos nº 0717524-28.2022.8.07.0001, tal apontamento não prejudica a conclusão de que, até mesmo diante da relação de proximidade apontada, faz-se necessário o aprofundamento das investigações com a medida pleiteada. Consigne-se que a medida cautelar de busca e apreensão se mostra indispensável diante da inexistência de outro meio para obtenção de mais elementos de convicção, podendo ser útil no cruzamento com informações obtidas com a quebra de sigilo bancário dos investigados, deferida nos autos nº 0717524-28.2022.8.07.0001. Com relação à empresa PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA, a relevância da medida se justifica pelo fato de o Contrato n° 042374/2020 – referente à locação investigada, ter sido concluído em 2/12/2020, entre a Secretaria de Saúde do Distrito Federal e a referida pessoa jurídica (fl. 312). No que concerne à PAULO OCTAVIO INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, contudo, tenho que não foram apresentados elementos suficientes que possam justificar o deferimento da medida em face da empresa, exceto pela mera alegação de que o investigado PAULO OCTÁVIO é seu sócio. Por todo o exposto, DEFIRO o pedido formulado nos autos, para, nos termos do artigo 240, alínea “e”, do Código de Processo Penal, determinar a BUSCA E APREENSÃO para: 1. BEATRIS GAUTÉRIO DE LIMA, inscrita no CPF nº 821.202.500-49, no endereço residencial, localizado na Rua Copaíba, Lote 12, Bloco B, Apt. 1705, Residencial Imprensa III, Águas Claras, Brasília/DF, CEP 71931-720; 2. JAQUELINE HELENA VEKIC, inscrita no CPF nº 622.410.790-49, no endereço residencial, localizado na SQS 112, Bloco K, Apt. 504, Asa Sul, Brasília/DF, CEP 70375- 110; 3. PAULO OCTÁVIO ALVES PEREIRA, inscrito no CPF nº 023.621.631-72, no endereço residencial, localizado na SHIS QI 05, Chácara 59, Lago Sul, Brasília/DF; 4. BRUNO TEMPESTA, inscrito no CPF nº 665.153.781-49, no endereço residencial, localizado no Condomínio Park Residence, SQSW 101, Bloco H, Apt. 207, Sudoeste, Brasília/DF e 5. PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA, inscrita sob o CNPJ nº 26.418.749/0001-47, situada no Setor Hoteleiro Norte, Quadra 02, Bloco E, Brasília/DF, CEP 70310-500. [...] (grifei)
Sobre a indispensabilidade, adequação e contemporaneidade da referida medida, o Ministério Público Federal defendeu que (fls. 1143-1144):
[...] o Colegiado deixou expresso a indispensabilidade da medida de busca e apreensão diante da inexistência de outro meio para obtenção de elementos outros de convicção, possibilitando, inclusive, o cruzamento de informações obtidas com a quebra de sigilo bancário dos investigados, tendo-se em conta que o pagamento do aluguel do imóvel situado no Edifício PO 700 seguiu sendo efetuado até recentemente, pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal, à investigada PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA, pois o Contrato n. 042374/2020, assinado em 02.12.2020, tinha prazo de vigência de 36 (trinta e seis) meses, revelando, assim, a eficácia, utilidade e contemporaneidade da medida. (grifei)
Nesse passo, contudo, é importante rememorar a própria decisão do juízo a quo, que bem elucidou que o simples fato de que dois dos investigados teriam mantido diálogos entre 2020-2021 não seria suficiente para se determinar uma nova busca e apreensão no ano de 2023, ainda mais quando uma medida assim já havia sido determinada em face de pessoas e objetos idênticos no bojo de uma operação policial própria anterior:
"Maré Alta" (2021). In verbis (fl. 1095): Entendo que o apontamento, pelo representante, de que dois dos investigados teriam mantido conversas suspeitas nos anos de 2020 e 2021 não se mostra suficiente para demonstrar concretamente que busca e apreensão autorizada neste momento, em junho de 2023, promoveria a coleta de provas de fatos ocorridos há alguns anos. [...] Importa frisar que neste último feito os fatos investigados datam de 2020, sendo certo que fatos outros, mais recentes ou não, caso haja indícios de prática delituosa, devem ser investigados em procedimentos próprios, sujeitos à livre distribuição entre as Varas Criminais de Brasília. [...] Em relação ao tema, não se pode admitir que eventuais aditamentos, no âmbito do Ministério Público ou da Polícia, levados a efeito em procedimentos administrativos investigatórios, para abarcar fatos outros além daqueles que originaram o procedimento, afetariam de qualquer modo as leis processuais que regem competência jurisdicional. (grifei) A defesa sustenta igualmente que o acórdão "se vale[u] de [...] manifestações do MPDFT como razões de decidir, sem acrescentar as próprias razões" (fl. 15). O Ministério Público Federal explicitou que (fls. 1143-1144): [...] a utilização da técnica da fundamentação per relationem é lícita, desde que o julgador a ela some motivação própria. No caso, o Colegiado deixou expresso a indispensabilidade da medida de busca e apreensão diante da inexistência de outro meio para obtenção de elementos outros de convicção, possibilitando, inclusive, o cruzamento de informações obtidas com a quebra de sigilo bancário dos investigados, tendo-se em conta que o pagamento do aluguel do imóvel situado no Edifício PO 700 seguiu sendo efetuado até recentemente, pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal, à investigada PAULO OCTAVIO HOTÉIS E TURISMO LTDA, pois o Contrato n. 042374/2020, assinado em 02.12.2020, tinha prazo de vigência de 36 (trinta e seis) meses, revelando, assim, a eficácia, utilidade e contemporaneidade da medida. (grifei)
Como se observa, novamente, terminou-se por reafirmar a eficácia, utilidade e contemporaneidade das medidas, que foram ora deferidas em uma investigação nitidamente complementar, de supostos crimes de fraude ao caráter competitivo e dispensa indevida de licitação, corrupção passiva/ativa e organização criminosa apenas porque o contrato foi assinado em 2/12/2020, mas tinha prazo de vigência de 36 (trinta e seis) meses (fl. 1144), assim como pela possível existência de conversas amigáveis entre os investigados, muito embora, anos depois da licitação e após procedimentos idênticos antes terem sido levados a cabo quando da "Operação Maré Alta" (2021).
Tudo o que não se mostra possível. Acerca do assunto, este STJ entende que: [...] Consoante imposição do art. 93, IX, primeira parte, da Constituição da República de 1988, "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade", exigência que funciona como garantia da atuação imparcial e secundum legis (sentido lato) do órgão julgador. Presta-se a motivação das decisões jurisdicionais a servir de controle, da sociedade e das partes, sobre a atividade intelectual do julgador, para que verifiquem se este, ao decidir, considerou todos os argumentos e as provas produzidas pelas partes e se bem aplicou o direito ao caso concreto. [...] Na hipótese, não houve fundamentação idônea a justificar a medida de busca e apreensão, visto que o Juízo singular não demonstrou, concretamente, nem a presença de indícios de autoria, nem a existência de fundadas razões de que havia alguma prática criminosa no local, muito menos a necessidade da medida, evidenciando-se, assim, o caráter genérico da decisão. O Magistrado de primeira instância se limitou a consignar, em abstrato, que a representação da autoridade policial era considerada imprescindível, que havia fundadas razões da prática de tráfico de drogas nos endereços citados e que os moradores desses imóveis estavam envolvidos em crimes - a tornar a decisão aplicável a qualquer procedimento investigatório. Esses argumentos são insuficientes, portanto, para suprir os requisitos constitucionais e legais de fundamentação da cautela [...] (HC n. 864.532/PI, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 23/4/2024, DJe de 30/4/2024.)
Por fim, a defesa ainda alega que o MPDFT deixou de instruir o pedido em voga com a cópia do processo administrativo n.º 00060-00517222/2019-61 (locação de imóvel para abrigar a sede da Secretaria de Saúde do Distrito Federal), mas, "em vez de julgar improcedente a apelação, a 3ª Turma Criminal, de ofício, acessou informações constantes de outro processo [...]" (fl. 5).
Neste ponto, o Ministério Público Federal aqui manifestou (fl. 1143):
[...] não restou demonstrada a alegada violação à inércia de jurisdição, visto que, em homenagem aos princípios da economia e celeridade processuais, priorizando a proteção do bem jurídico tutelado e o perigo de ineficácia da medida, o Desembargador Relator das apelações 0724812-90.2023.8.07.0001 e 0717524- 28.2022.8.07.0001, as quais guardam identidade, fez uso de dados informativos comuns para a instrução do feito objeto deste habeas corpus, referentes ao processo administrativo nº 00060- 00517222/2019-61, não havendo que se falar em impulso oficial e compartilhamento de material probatório indevidos. (grifei)
Ocorre que a presente via, estreita e de cognição sumária, não permite averiguar a viabilidade da instrução realizada pelo Ministério Público em seu pedido inicial, até mesmo porque ora é referido pela origem como um mero aditamento de busca e apreensão anterior, ora, como um novo pleito distribuído por prevenção. Razão, inclusive, pela qual o pedido de declaração de incompetência da 5ª Vara Criminal de Brasília/DF, além de agora prejudicado, igualmente se torna inviável de aferimento em sede de impetração substitutiva de recurso próprio neste Tribunal Superior. Corroborando:
[...] Inadequação da estrita via do habeas corpus para revisão do aresto proferido pelo Tribunal estadual na exceção de incompetência lá arguida, porquanto a ilegalidade passível de justificar a impetração do writ deve ser manifesta, de constatação evidente, restringindo-se a questões de direito, que não demandem incursão no acervo probatório constante dos autos. Precedentes. [...] Para o eventual reconhecimento da competência [...] impõe-se ampla dilação probatória, o que ocorrerá caso recebida a denúncia e processada a ação penal, sendo prematuro inferir-se [...] (HC n. 290.120/SC, relatora Ministra Regina Helena Costa, Quinta Turma, julgado em 18/6/2014, DJe de 1/7/2014.) [...] Nesse panorama, a alteração do entendimento do Tribunal a quo, nos moldes propostos pela defesa, demandaria o revolvimento fático-probatório dos autos, o que é sabidamente incabível na via do habeas corpus [...] (AgRg no HC n. 958.656/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 18/12/2024, DJEN de 23/12/2024.)
Ante o exposto, não conheço do habeas corpus. Concedo a ordem, de ofício, para, confirmando a liminar antes deferida, declarar ilegal a medida de busca e apreensão autorizada pelo acórdão de apelação criminal n. 0724812-90.2023.8.07.0001/TJDFT, com a determinação de que todo o material apreendido e acautelado na 5ª Vara Criminal de Brasília/DF seja restituído aos seus proprietários, assim como que eventuais dados porventura extraídos sejam inutilizados e considerados ilegais para todos os fins. Intime-se a origem, com urgência, para o imediato cumprimento. Publique-se. Intimem-se.
Relator
MESSOD AZULAY NETO
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