STJ Fev25 - Dosimetria Irregular - Lei de Drogas - Minorante do Tráfico Privilegiado em 2/3 Aplicada :"Pequena quantidade de Entorpecentes (100g) não significa Habitualidade"
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em favor de KAIO VXXXXXXXA em que se aponta como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Consta dos autos que o paciente foi condenado à pena de 5 anos de reclusão no regime inicial semiaberto e ao pagamento de 500 dias-multa, como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.
A impetrante sustenta que o paciente faz jus à causa especial de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, na fração de 2/3, haja vista a ausência de indícios que demonstrem sua dedicação a atividades criminosas ou participação em organização criminosa, além de ser primário e de possuir bons antecedentes.
Nesse sentido, argumenta (fl. 9):
[...] ser preso com certa quantidade de substância (101,5g (cento e um gramas e cinco decigramas de Cannabis Sativa L. -maconha -) entorpecente não faz do Paciente um Traficante Contumaz, Habitual, fato que só se comprovaria se houvesse alguma investigação anterior que comprovasse que o mesmo se dedicava à atividade do Tráfico de Drogas, ou que integrasse alguma Organização Criminosa, de modo que não se desincumbiu o Parquet de comprovar qualquer desses atos.
Acrescenta que, com a incidência da minorante, será possível mitigar o regime carcerário e substituir a sanção corporal por restritivas de direitos. Requer, liminarmente e no mérito, a incidência da causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/2006, em sua fração máxima (2/3), bem como a fixação de regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
O pedido liminar foi indeferido às fls. 97-98. As informações foram prestadas às fls. 101-120 e 125-131.
O Ministério Público Federal, às fls. 136-140, manifestou-se pela concessão da ordem.
É o relatório.
Inicialmente, a despeito do não cabimento deste writ, utilizado como substituto de recurso próprio, procedo à análise do feito, a fim de verificar a ocorrência de eventual constrangimento ilegal.
A Corte de origem, ao examinar o pleito atinente à causa especial de diminuição prevista no art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/2006, assim se manifestou (fls. 21-23):
Não se pode olvidar que pelas circunstâncias da prisão em flagrante, bem como pela forma como estavam as drogas encontradas acondicionadas distribuídas e, principalmente, pelas informações seguras obtidas pelos policias militares, restou mais do que provado de que o acusado, ora apelante, não apenas incrementava o odioso comércio ilícito de drogas, fonte de todos os males em uma sociedade, na cidade de Barra do Piraí, como também se dedicava a esse tipo de atividade, embora alegue ser usuário (fato que não restou comprovado), vez que restou mais do que provado que visava à revenda com o intuito de lucro. No caso, o acusado, ora apelante, consciente e voluntariamente, colaborava para o incremento e a disseminação do tráfico de entorpecentes, quando foi preso, na Rua Compositor Herivelton Martins, no Bairro - Morro do Gama, em Barra do Piraí, tal como se pode observar pelos depoimentos prestados pelos policiais militares, já que transportava, trazia consigo, primeiro enrolado na camisa, jogando-a posteriormente no chão, para fins de tráfico as drogas encontradas, sendo arrecadadas pelos policiais militares, momento que afirmou: “Perdi”. [...] Portanto, há provas robustas da atuação do acusado, ora apelante, no delito de tráfico de drogas, no momento em que foi preso pelos policiais militares, não devendo, por conseguinte, ser aplicado o §4º, do art. 33, da Lei nº 11.343/2006, embora aparentemente estivesse “trabalhando licitamente”. Observa-se que em seu interrogatório o acusado não teve o condão de contrariar os depoimentos dos policiais militares que efetuaram sua prisão, no que diz respeito ao crime de tráfico de drogas, contando uma história divorciada da realidade, ao afirmar “(...); que foi para Barra do Piraí morar com o seu pai, sendo certo que é usuário de drogas; que o seu pai deu um dinheiro; que a droga era para uso. (...)”.
Como visto, o Tribunal de origem afastou o redutor do art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/2006, entendendo que o paciente se dedicava a atividades criminosas, com base na quantidade de droga — 101,50 g de maconha — e nas circunstâncias do flagrante, destacando a forma como estavam acondicionadas e distribuídas as porções. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a quantidade e a natureza da droga podem ser utilizadas para afastar o redutor do art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/2006, desde associadas a outros elementos concretos, capazes de demonstrar a dedicação do réu à prática de atividades ilícitas ou a integração a organização criminosa.
Nesse sentido: RCD no HC n. 921.603/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 30/10/2024; AgRg no HC n. 831.853/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 23/9/2024, DJe de 26/9/2024; AgRg no HC n. 887.077/MS, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do Tjdft), Sexta Turma, julgado em 19/8/2024, DJe de 22/8/2024; e AgRg no HC n. 874.121/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 15/8/2024.
Contudo, na espécie, a quantidade de entorpecente apreendida, que não se revela exacerbada (101,50 g de maconha), e a sua forma de acondicionamento são insuficientes para comprovar a habitualidade criminosa, uma vez que apenas dizem respeito ao tipo penal descrito no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.
Assim, não apresentados elementos diversos que indiquem a habitualidade delitiva do paciente, deve ser concedida a ordem, de ofício, para reconhecer a incidência da causa especial de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, na fração de 2/3.
Confiram-se os seguintes precedentes: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. MINORANTE AFASTADA NA ORIGEM COM FUNDAMENTO APENAS NA QUANTIDADE DE DROGAS. ILEGALIDADE. RECONHECIMENTO DO BENEFÍCIO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. I. CASO EM EXAME [...] 4. Para a aplicação do redutor do tráfico privilegiado, é necessário que o réu preencha os requisitos de primariedade, bons antecedentes, não dedicação à atividade criminosa e ausência de vínculo com organização criminosa, conforme o § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006. 5. O afastamento da minorante pelas instâncias ordinárias baseou-se exclusivamente na quantidade de drogas apreendidas (241,8g de maconha e 35,3g de cocaína) e na forma de acondicionamento, o que não é suficiente para demonstrar a habitualidade criminosa. 6. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal estabelece que a quantidade de droga apreendida, isoladamente, não justifica o afastamento da causa de diminuição de pena, quando o réu é primário e possui bons antecedentes. 7. Reconhecida a minorante pleiteada, a pena é reduzida a 1 ano e 8 meses de reclusão, em regime aberto, e 166 dias-multa. Cabível o regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. IV. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA EM PARTE. (HC n. 927.272/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 12/11/2024, DJe de 19/11/2024.) DIREITO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. SÚMULA 182/STJ. TRÁFICO DE DROGAS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. [...] 8. A minorante do tráfico privilegiado deve ser aplicada na fração máxima de 2/3, considerando a primariedade do réu e a quantidade não expressiva de drogas. [...] Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.343/2006, art. 33, § 4º; Código Penal, art. 33, § 2º, "c", e § 3º; Código Penal, art. 44. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 830421/SP, Rel. Min. Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 11/12/2023, DJe 14/12/2023; STJ, AgRg no REsp 2.139.097/AL, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 16/9/2024, DJe 18/9/2024. (AgRg no AREsp n. 2.726.943/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 12/11/2024, DJe de 19/11/2024.)
Passo ao redimensionamento da pena. Sobre a pena intermediária estabelecida pela Corte de origem (5 anos de reclusão e 500 dias-multa), incide, na terceira fase, a minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, na fração de 2/3, ficando a reprimenda definitiva do paciente em 1 ano e 8 meses de reclusão e 167 dias-multa.
No tocante ao regime prisional, com o redimensionamento da reprimenda para 1 ano e 8 meses de reclusão e considerando que o paciente é primário e todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal lhe foram valoradas positivamente, estando a pena-base no mínimo legal, a fixação do regime inicial aberto é a medida que se impõe, nos termos do art. 33, § 2º, c, do Código Penal.
Por fim, preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade deve ser convertida em duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo Juízo de origem. Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do presente do habeas corpus, contudo concedo a ordem, de ofício, a fim de reduzir as penas do paciente para 1 ano e 8 meses de reclusão e 167 dias-multa, fixar o regime inicial aberto e deferir a substituição de sua pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, a serem definidas pelo Juízo de origem. Comunique-se. Publique-se. Intimem-se.
Relator
OG FERNANDES
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