STJ Fev25 - Importunação Sexual (art.215-A CP) - Cabimento de Acordo de Não Persecução Penal ANPP
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
DECISÃO Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, impetrado em benefício de F V F contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO proferido no HC n. 2331479-98.2023.8.26.0000.
O paciente foi denunciado pela suposta prática do crime previsto no art. 215-A do Código Penal (importunação sexual), nos seguintes termos:
"Segundo apurado, a vítima e o denunciado eram técnicos em enfermagem na UPA Jaçanã todavia, durante o período em que ali trabalhavam, rotineiramente o denunciado costumava manter condutas que à vítima causavam uma série de desconfortos, seja ao lhe abraçar, acariciar suas costas e rostos. Ou até mesmo, sempre que a vítima estava em um recinto estreito, o denunciado passava por trás dela e sob a desculpa do pequeno espaço, acabar por nela se roçar. Ocorre que, na circunstancias de tempo e local supramencionado, desta feita, aproveitando-se do momento em que a ofendida estava no refeitório pegando um medicamento, o denunciado surgiu, apalpou sua nádega, quase tocando em seu órgão genital. Foi então que a vítima compareceu na delegacia de polícia e resolveu narrar os fatos, tomando então conhecimento de que não era a única vítima a ser abordada pelo denunciado no ambiente de trabalho." (fl. 25)
A defesa do paciente impetrou o writ na origem, ao argumento de que o Ministério Público não apresentou justificativas aptas a afastar a possibilidade de suspensão condicional do processo prevista no art. 89 da Lei n. 9.099/95.
A ordem foi denegada sob o fundamento de se tratar de "crime praticado contra mulher, por motivo de gênero" (fl. 50), nos termos do acórdão assim ementado:
"HABEAS CORPUS - constrangimento ilegal - não atendimento de ordem de habeas corpus concedida por esta Douta Câmara, qual seja, a apreciação de pedido de suspensão condicional do processo inocorrência decisão que acolhendo o parecer do Parquet, entendeu pela não concessão do benefício, por tratar-se de crime praticado contra mulher, por motivo de gênero. ORDEM DENEGADA." (fl. 47)
O impetrante sustenta que o paciente preenche todos os requisitos necessários para a aplicação da suspensão condicional do processo, visto que é primário e não possui maus antecedentes, bem como o delito que lhe é imputado possui pena mínima de um ano.
Aduz, ainda, que a fundamentação apresentada pela acusação para afastar o Acordo de Não Persecução Penal - ANPP não deve ser considerada para fins de aplicação do benefício, por se tratar de institutos diferentes. Requer, assim, a suspensão condicional da ação penal.
A liminar foi indeferida, por decisão de fls. 57/58. As informações foram prestadas às fls. 63/75. O Ministério Público Federal emitiu parecer que recebeu o seguinte sumário:
"CONSTITUCIONAL. EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CONHECIMENTO. CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL PRATICADO CONTRA MULHER. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. 1 - Incabível a impetração de 'habeas corpus' em substituição ao recurso legalmente previsto, ressalvadas as hipóteses de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado, razão pela qual o não conhecimento da impetração é medida que se impõe; 2 - 'A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido da inaplicabilidade da Lei n. 9.099/1995 às condutas delituosas praticadas em âmbito doméstico ou familiar, inclusive as contravenções, em obediência ao disposto no art. 41 da Lei n. 11.340/2006, que dita: ‘Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.' (AgRg no REsp: 1795888 DF 2019/0037950-6, Relator: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/12/2019); PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT E, NO MÉRITO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM." (fl. 79)
É o relatório. Decido.
Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial é razoável verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.
Como visto, o paciente foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 215-A do Código Penal, o qual possui a seguinte dicção: "Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave."
Por sua vez, o art. 41 da Lei n. 11.340/2006 - Lei Maria da Penha - preconiza: "Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995."
Como visto, a Corte de origem reconheceu a impossibilidade da suspensão do processo, em virtude de "tratar-se de crime praticado contra mulher, por motivo de gênero".
Contudo, verifica-se que a Lei Maria da Penha veda esse benefício "aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher" e não pelo motivo que foi feito na origem.
Com efeito, o suposto crime imputado ao paciente não se enquadra na exceção prevista no dispositivo citado da Lei Maria da Penha, pois ele não foi praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher, acrescenta-se ainda que sequer existe a presença de violência nesse tipo penal, até porque quando ocorre esse fato a capitulação muda para estupro.
Consoante se verifica da denúncia, o fato típico teria sido perpetrado no ambiente de trabalho do autor e da vítima, não se cuidando, portanto, de crime ocorrido no ambiente doméstico e familiar, sendo que o fato de "tratar-se de crime praticado contra mulher, por motivo de gênero" não justifica a aplicação da vedação do art. 41 da Lei n. 11.340/2006.
Ante o exposto, com fulcro no art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do presente habeas corpus. Todavia, concedo a ordem, de ofício, para superar esse óbice e determinar que o Ministério Público aprecie a presença dos outros requisitos para propor a suspensão do processo. Publique-se. Intimem-se.
Relator
JOEL ILAN PACIORNIK
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