STJ Fev25 - Júri - Nulidade da Sessão - Paciente com Mal de Parkinson - Juiz que tolheu seu interrogatório, sob o fundamento de que havia dificuldade de ouvi-lo. :"Cerceamento de Defesa - Determinação para Novo Júri"

  Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)

DECISÃO Trata-se de habeas corpus, substitutivo de revisão criminal, impetrado em favor de JXXXXXXX, contra o julgamento proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS— TJMG na Apelação Criminal n. 2025537-98.2013.8.13.0024 (numeração usada pelo Tribunal de origem: 1.0000.23.186153-5/001). 

Consta dos autos que o paciente foi condenado à pena de 16 (dezesseis) anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do delito capitulado no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal. 

Em suas razões, o impetrante sustenta a ocorrência de constrangimento ilegal, porquanto o paciente, portador do mal de Parkinson, teve sua autodefesa prejudicada, haja vista que, embora tenha demonstrado o desejo de se manifestar na sessão realizada perante o Tribunal do Júri, o Juiz que presidiu tolhera seu direito a fala, sob o fundamento de que havia dificuldade de ouvi-lo.

 Aduz que, diante da impossibilidade de realização do interrogatório, o referido magistrado deveria ter suspendido a sessão do Júri para obtenção de ajuda profissional para compreender a fala do paciente e, em não sendo possível de imediato, o caso seria de dissolução da sessão plenária. 

Alega, ainda, ocorrência de nulidade decorrente do indeferimento da diligência solicitada pela defesa na fase do art. 422 do Código de Processo Penal— CPP, qual seja, a reprodução de mídia de áudio que poderia corroborar as teses de legítima defesa e inexigibilidade de conduta diversa e influenciar a íntima convicção dos jurados.

 Requer, liminarmente e no mérito, seja declarada a nulidade da ação penal desde a sessão do Tribunal do Júri. O pedido liminar foi indeferido pela Presidência do Superior Tribunal de Justiça — STJ, em sede de plantão judiciário (e-STJ fls. 559/560). Informações prestadas pelas instâncias ordinárias (e-STJ fls. 559/560, 625/628). O Ministério Público Federal — MPF ofertou parecer pelo não conhecimento do habeas corpus (e-STJ fls. 625/628).

 É o relatório. Decido. 

Em respeito aos princípios da segurança jurídica e da lealdade processual, a jurisprudência do STJ tem se orientado no sentido de que o habeas corpus substitutivo de revisão criminal somente poderá ser manejado para correção de flagrantes ilegalidades, e desde que não tenha transcorrido longo lapso de tempo a partir do trânsito em julgado.  

A propósito, confiram-se os seguintes julgados (destacamos): 

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FALTA DE NOVOS ARGUMENTOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA. PRECLUSÃO. TRÂNSITO EM JULGADO ANTIGO. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO NÃO PROVIDO. I - É assente nesta Corte que o regimental deve trazer novos argumentos capazes de infirmar a decisão agravada, sob pena de manutenção do decisum pelos próprios fundamentos. II - "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ, em respeito à segurança jurídica e a lealdade processual, tem se orientado no sentido de que mesmo as nulidades denominadas absolutas, ou qualquer outra falha ocorrida no acórdão impugnado, também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal" (AgRg no HC n. 690.070/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 25/10/2021). III - O manejo do habeas corpus muito tempo após a edição do ato atacado demanda o reconhecimento da preclusão, em respeito à coisa julgada e ao princípio da segurança jurídica. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 851.309/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 15/12/2023.) PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. IMPRONÚNCIA. PEDIDO DE AFETAÇÃO À TERCEIRA SEÇÃO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 14 DO RISTJ. PLEITO DE AFETAÇÃO AO ÓRGÃO ESPECIAL DA CORTE DE ORIGEM OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 414 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TRÂNSITO EM JULGADO. MANEJO TARDIO DO WRIT. PRECLUSÃO. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. RECURSO NÃO PROVIDO. (...) 3. Este Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que o manejo do habeas corpus muito tempo após a edição do ato atacado demanda o reconhecimento da preclusão, não havendo se falar, portanto, em ilegalidade manifesta. Na hipótese em exame, a sentença atacada no Tribunal de origem por meio do mandamus originário transitou em julgado em 21 de agosto de 2017, sem que a defesa tenha interposto apelação, recurso apropriado, nos termos do art. 416 do CPP, vindo o recorrente, após passados 3 anos, alegar a ocorrência de constrangimento ilegal. (...) 6. Recurso em habeas corpus não provido. (RHC 97.329/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 14/9/2020.) 

O trânsito em julgado da última via recursal (Recurso Extraordinário Com Agravo n. 1319869) ocorreu em 04/09/2024 (e-STJ fl. 609), ao passo que a impetração se deu em 14/01/2025, não tendo decorrido tempo excessivo entre estes dois marcos temporais. 

Ademais, não se aplica a jurisprudência do STJ mencionada na manifestação ministerial, segundo a qual "Não deve ser conhecido o writ que se volta contra acórdão já transitado em julgado, manejado como substitutivo de revisão criminal, em hipótese na qual não houve inauguração da competência desta Corte. Precedentes da Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça" (AgRg no HC n. 751.156/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022). 

Embora, de fato, não conste essa documentação nestes autos, mediante consulta processual no portal de Justiça brasileira (www.jus.br), apura-se que a defesa interpôs o Agravo em Recurso Especial n. 2692041, não conhecido pela Presidência do STJ em decisão datada de 31/07/2024 e preclusa em 12/08/2024.

 Daí porque evoluo para análise do relato do impetrante de ocorrência de nulidades durante o julgamento pelo Tribunal do Júri que culminou na condenação do paciente pelo crime de homicídio. 

As nulidades foram suscitadas pela defesa do paciente na sessão plenária, tendo ficado registrado no respectivo termo o seguinte embate argumentativo:

 "[...] Pela ordem, a Defesa do acusado requereu a palavra para se manifestar "MM. Juiz, a Defesa traz respeitosamente omissões que trouxeram grave prejuízo ao acusado, momento oportuno a preparação para o júri, a defesa requereu que fosse exibido os áudios referente as ligações feitas para a policia militar cuja transcrições estão na fl. 203, ausência de autodefesa, pois o acusado gravemente enfermo com mal de parkinson não conseguiu fazer a sua defesa pessoal tendo o juiz determinado o prosseguimento do feito sem tal capacidade do acusado entende a Defesa que naquele momento ante a impossibilidade do acusado de fazer sua defesa pessoal deveria ter ocorrido a dissolução do júri e a designação de novo julgamento para que o acusado assistido por profissional da Area de fonoaudiologia ou afim pudesse exercer o seu direito de defesa, ora se ao estrangeiro que não fala a lingua nacional deve ser designado tradutor, da mesma forma ao mudo deve também o acusado ser garantido tal direito sob pena de violação ao devido processo legal estampado na Constituição da República como principio e ao Pacto de São José de Costa Rica ao qual o Brasil é signatário consigna a Defesa oportunamente nesta ata para que o Colendo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais eventualmente os Tribunais Superiores possam analisar tal questão". Pelo MM. Juiz foi proferida a seguinte decisão: "Vistos, etc. Com relação a mídia pretendida, não tendo sido esta localizada para uso em plenário, tal fato não representou qualquer prejuízo a Defesa uma vez q - sua transcrição oficial e completa foi utilizada pelo sr. Defensor que inclusive projetou (Fls. 203 e seguintes do processo fisico), no sistema audiovisual disponível em plenário, fazendo inclusive leitura dos diálogos ali transcritos. Quanto ao interrogatório do réu é de se pontuar que não [sic] nos autos qualquer pedido contemporâneo de exame de sanidade mental ou de incapacidade dialética do acusado, bem como no inicio do interrogatório tentou o sr. advogado interrompê-lo aconselhando o réu a se manter em silêncio fazendo com que o fato a seguir ocorrido não se constituísse em prejuízo a Defesa. Ademais, não havendo nenhuma solicitação de exame, e não tendo este juiz expertises necessária para interpretar a condição psicofisica do acusado, não sabe este juiz se a maneira como o réu se expressou foi resultado de uma eventual incapacidade de se expressar ou uma mera simulação para impressionar os presentes tendo então o juizo diante da inércia defensiva até aquele momento determinado o prosseguimento do julgamento por não haver motivação legal para deixar de fazê-lo. Ademais, sugerir aqui a presença de um intérprete para aquele que não consegue se expressar é pretensão inexplicável ao ver deste juizo, pois que não se sabe da existência de alguém que possa extrair de quem não se expressa de forma alguma aquilo que ela pretende informar, ou seja, se a deficiência é linguistica é possível uma interpretação por experts, mas não da forma como se apresentou em plenário. Pela ordem a Defesa apresentou recurso de apelação, nos termos do art. 593, III, e suas alíneas, do CPP. Pelo MM. Juiz Presidente foi proferido o seguinte despacho: "Vistas. etc... R cebo o recurso, porquanto próprio e tempestivo, determinando a abertura de vista à Defesa para o oferecimento das razões, e em seguida, ao MP, para contrarrazões. Após, conclusos." Após os agradecimentos, pelo MM. Juiz Preside foi dada por errada a Sessão, As 15:10h da quarta-feira, 14 de junho de 2023 [...]" 

O Tribunal de Justiça, ao chancelar a decisão do magistrado de primeiro grau, avaliou que a defesa falhara ao não solicitar previamente perícia técnica, não podendo se exigir do magistrado conhecimento técnico para avaliar, no momento da sessão plenária, sobre a necessidade de intervenção profissional. Quanto aos áudios, cuja mídia fora extraviada, entendeu que a respectiva transcrição cumpriu a finalidade probatória. Vejamos os excertos do voto condutor (e-STJ fls. 287/289): 

"Alega a defesa que o acusado foi impedido de promover a sua autodefesa, já que, não obstante fosse evidente a situação incapacitante dele, não cuidou o d. Magistrado Presidente de designar profissional habilitado para promover a leitura do que fosse por ele dito ou dissolver o júri para tal designação. Razão não lhe assiste. A condição de saúde do recorrente já era sabida desde o início do processo, não tendo a defesa, em qualquer momento, manifestado a necessidade de acompanhamento de qualquer profissional. Ora, nem mesmo os documentos acostados ao feito revelam esta imprescindibilidade, devendo ressaltar, nos mesmos moldes sustentados pelo Parquet, que os relatórios juntados em anexo às razões recursais sequer possuem data para se esclarecer se são contemporâneos ou não. [...] Conforme fora por ele bem colocado, em se tratando de questão de saúde, a própria avaliação acerca da necessidade de um profissional a intervir no ato demanda expertise - que não pode ser exigida de um Magistrado -, não havendo que se falar na aplicação por analogia dos arts. 192 e 193 do CPP. Isto porque, tais dispositivos referem-se a questões que se verificam de plano por qualquer pessoa, quais sejam, mudez e/ou surdez e casos de réu estrangeiro que não fala a língua nacional. Já o caso dos autos, a toda evidência, demandaria, ao menos, a prévia existência de uma perícia técnica para se inferir que, de ofício, fosse exigido um profissional habilitado para fazer o réu ser compreendido, e o certo é que, não tendo sido requerido tal exame, caberia à defesa solicitar, antecipadamente e de forma fundamentada, a intervenção deste terceiro. Não bastasse, ressalta-se da decisão supra que, quando do interrogatório, o próprio defensor aconselhou que o réu se mantivesse em silêncio, revelando, assim, que a ausência das suas declarações sequer importaria em prejuízo da defesa, já que não se encaixava na estratégia defensiva. O segundo ponto trata da não exibição da mídia requerida pela defesa na fase do art. 422 do CPP. Mais uma vez sem razão. Isto porque, não obstante não tenha sido o CD localizado para tal fim, foram apresentadas pela própria defesa técnica as transcrições integrais dos áudios obtidos, com leitura pelo advogado, não se demonstrando assim o prejuízo causado ao réu por não ter sido as conversas gravadas ouvidas pelo Conselho de Sentença. É de se dizer, que de acordo com o art. 563 do CPP "nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa". "

 Sobre a nulidade decorrente do cerceamento do direito de autodefesa, a premissa básica para enfrentamento da controvérsia reside na compreensão do interrogatório como "o momento ótimo do acusado, o seu 'dia na Corte' (day in Court), a única oportunidade, ao longo de todo o processo, em que ele tem voz ativa e livre para, se assim o desejar, dar sua versão dos fatos, rebater os argumentos, as narrativas e as provas do órgão acusador, apresentar álibis, indicar provas, justificar atitudes, dizer, enfim, tudo o que lhe pareça importante para a sua defesa, além, é claro, de responder às perguntas que quiser responder, de modo livre, desimpedido e voluntário" (REsp n. 1.825.622/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 20/10/2020, DJe de 28/10/2020; destaques acrescidos.

Portanto, não é pertinente o argumento, exposto pelas duas instâncias originárias, de que advogado havia orientado o paciente a somente responder às perguntas da defesa e/ou a permanecer em silêncio, até mesmo porque não foi eventual recusa do paciente em responder às perguntas do juiz que ensejou a interrupção do interrogatório, mas sim a dificuldade de comunicação atrelada à oralidade do paciente. 

Sobre a ausência de prévio requerimento da defesa para que fosse realizado exame de incapacidade mental, acata-se o argumento do impetrante de que a situação não era de déficit cognitivo que ensejasse incapacidade mental do paciente; O magistrado presidente do Júri e o Tribunal de Justiça também se fiaram no fato de que defesa não informara previamente sobre incapacidade dialética do paciente. 

Ocorre que a dificuldade de fala não se manifesta necessariamente de maneira regular e constante num paciente acometido pelo mal de Parkinson. É de conhecimento comum que pacientes portadores de doenças neurodegenerativas têm momentos bons e ruins ao longo do tempo, por vezes com oscilações dentro de um mesmo dia, sendo especialmente suscetíveis às situações de estresse. 

Portanto, o fato de o paciente não ter conseguido se expressar de forma compreensível no momento do interrogatório não é revelador de eventual manobra protelatória ou de descuido da defesa. 

O juiz expressou, outrossim, dúvidas se o paciente estava realmente incapacitado de se comunicar ou se tinha simulado essa dificuldade, ao que o Tribunal de origem ratificou que não competia ao magistrado ter esse conhecimento, em virtude da ausência de prova técnica sobre o estado de saúde do acusado. 

Contudo, observa-se que juiz não questionou a informação do advogado de que o réu era portador de mal de Parkinson, o que leva a inferir que já estivesse ciente. Ainda que até mesmo o diagnóstico do réu fosse inédito para o juiz, tal seria facilmente esclarecido no Plenário, pois há relatórios médicos nos autos que remontam ao ano de 2011 (e-STJ fls. 111/124). 

Portanto, no contexto em que havia fundadas dúvidas sobre a dificuldade de o réu se fazer entender pelos jurados — fosse uma dificuldade momentânea, fosse permanente e irreversível — caberia ao magistrado expandir, e não restringir, os consectários do direito de presença. Assim, competia-lhe — sempre mediante orientação profissional — envidar tentativa de que a fala do paciente se tornasse compreensível, ou se certificar da eventual impossibilidade, ainda que tais diligências ensejassem necessidade de dissolver o Júri. 

Nessa linha:

 AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE. INSTRUÇÃO DEFICIENTE. PEDIDO DE PARTICIPAÇÃO NA AUDIÊNCIA POR VIDEOCONFERÊNCIA. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA. RÉU FORAGIDO. PREJUÍZO NÃO CONSTATADO. PRINCÍPIO NEMO AUDITUR PROPRIAM TURPITUDINEN ALLEGANS. AGRAVO NÃO PROVIDO. [...] 2. O direito de presença é um dos desdobramentos do princípio da plenitude da defesa, na sua vertente da autodefesa, pois permite a participação ativa do réu, dando-lhe a possibilidade de presenciar e participar da instrução criminal e auxiliar seu advogado, se for o caso, na condução e direcionamento dos questionamentos e diligências. Entretanto, não se trata de um direito absoluto, sendo legítima a restrição, quando houver fundado motivo. 3. Neste caso, o pedido de oitiva por videoconferência formulado pela defesa, a pretexto de garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa, visa, em verdade, participação do réu foragido na audiência de instrução. 4. Assim, a pretexto de garantir o exercício das garantias constitucionais, busca-se a chancela do Poder Judiciário para permitir que o réu permaneça foragido e, mesmo assim, participe da audiência. Cumpre destacar que a participação presencial do acusado na audiência não está proibida, de maneira que não há prejuízo ao exercício das garantias do contraditório e da ampla defesa. 5. Além disso, não é lícito à parte argumentar em favor do reconhecimento de um vício para obter benefício contrário ao ordenamento jurídico, que, neste caso, é o de continuar se furtando ao cumprimento da prisão preventiva, sob penda de violação ao princípio de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza (nemo auditur propriam turpitudinem allegans). 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 761.853/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022.)

 Com relação aos áudios das ligações telefônicas feitas pelo paciente para a polícia, não há reparos a serem feitos. O Tribunal de origem referiu que a mídia fora extraviada, mas que a própria defesa cuidou de transcrever os diálogos, os quais foram apresentados aos Jurados e, portanto, a prova foi produzida, não se presumindo qualquer perda de seu potencial de influência nos jurados. 

Nessa linha: 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS TENTADOS. TRIBUNAL DO JÚRI. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MÍDIA DIGITAL. VOLUME DO ÁUDIO. SESSÃO DE JULGAMENTO. ART. 231 DO CPP. TRANSCRIÇÃO DA MÍDIA PRODUZIDA ESPONTANEAMENTE PELA ACUSAÇÃO JUNTADA AOS AUTOS. POSSIBILIDADE. DOCUMENTO QUE NÃO POSSUI CARÁTER PROTELATÓRIO OU TUMULTUÁRIO. CELERIDADE E EFETIVIDADE AO PROCESSAMENTO DO FEITO. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO PELAS PARTES. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. [...] 2. Na hipótese, o documento apresentado pelo Ministério Público não possui natureza protelatória ou tumultuária; longe disso, os autos evidenciam situação peculiar, qual seja, a demonstração de que, apesar da baixa qualidade da gravação da sessão de julgamento, por conta do baixo volume do áudio, a mídia apresenta compreensão das declarações, tanto que o seu conteúdo foi objeto de degravação por empresa especializada, contratada às expensas do próprio representante do Ministério Público. 3. Busca-se, no processo penal, a verdade real, cabendo ao Juiz ir ao encontro de todos os elementos que possam retratar a realidade dos fatos, com adoção de meios ou providências que garantam a celeridade de sua tramitação e a razoável duração do processo, compreendendo-se as facilidades tecnológicas atualmente disponíveis, ainda que promovidas por uma das partes interessadas. 4. O princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte, podendo ser ela tanto a nulidade absoluta quanto a relativa. Precedentes. 5. Extrai-se dos autos que os réus e seus defensores não cogitaram a existência de vícios na sessão de julgamento do Tribunal do Júri, nem na ata de julgamento ou mesmo em seus recursos de apelação, sendo o caso de aplicação do princípio do pas de nullité sans grief. 6. Recurso especial provido para afastar a nulidade da sessão de julgamento do Tribunal do Júri, cabendo ao Tribunal a quo determinar a juntada aos autos da documentação apresentada pelo Ministério Público, abrindo-se vistas às partes, para fins do contraditório e da ampla defesa, prosseguindo na análise das manifestações e do recurso de apelação, como entender de direito. (REsp n. 1.719.933/MG, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 18/9/2018, DJe de 1/10/2018.) 

Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do Regimento Interno do STJ, não conheço do presente habeas corpus. Contudo, concedo a ordem de ofício para anular o julgamento pelo Tribunal de Júri e determinar que outro seja feito com o escopo de, mediante intervenção profissional, superar e/ou contornar, no que for possível, as limitações de fala do paciente durante seu interrogatório na sessão plenária.

Relator

JOEL ILAN PACIORNIK

(STJ -  HABEAS CORPUS Nº 974408 - MG (2025/0007302-5) RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK,  Publicação no DJEN/CNJ de 14/02/2025)

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