STJ Fev25 - Júri - Pronúncia Nula Por Excesso de Linguagem
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola
DECISÃO Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, impetrado em benefício de PRISCILXXXXXX contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, prolatado no julgamento da Apelação n. 1500964- 93.2019.8.26.0052.
Extrai-se dos autos que, desclassificando a figura delitiva, o Juiz da Vara do Júri condenou a paciente pela prática do crime de lesão corporal grave (art. 129, § 2º, I, do Código Penal).
O Tribunal a quo deu provimento ao recurso da acusação, determinando a submissão da acusada a novo julgamento pelo Tribunal do Júri, pela suposta prática do crime de homicídio qualificado na forma tentada (art. 121, § 2º, inciso III e IV, c/c o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal).
No presente writ, a defesa sustenta, em síntese, que "os fundamentos empregados no v. acórdão ora impugnado exorbitaram da necessária linguagem serena e equilibrada exigida em casos como tais" (fl. 6).
Requer a concessão da ordem para cassar "a r. decisão de 2º grau, com determinação para que outra seja proferida, em absoluta consonância com o disposto no art. 413, § 1º, do CPP" (fl. 11).
O Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão da ordem, em parecer que recebeu o seguinte sumário:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SUCEDÂNEO DE RECURSO PRÓPRIO. INADMISSIBILIDADE. TRIBUNAL DO JÚRI. ACÓRDÃO ANULATÓRIO DO PRIMEIRO JULGAMENTO. DECISÃO DOS JURADOS MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. EVIDENTE EXCESSO DE LINGUAGEM DO ACÓRDÃO IMPUGNADO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. PRECEDENTES. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT, CONCEDENDO-SE A ORDEM, DE OFÍCIO, PARA ANULAR O ACÓRDÃO DO TJ/SP, DETERMINANDO-SE QUE OUTRO SEJA PROFERIDO SEM O EXCESSO DE LINGUAGEM." (fl. 33)
É o relatório. Decido.
Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF e do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável a análise do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.
Relativamente ao apontado excesso de linguagem da decisão de pronúncia do ora paciente, verifico haver, outrossim, constrangimento ilegal passível de correção de ofício.
Quanto ao tema, preliminarmente ressalto que, em que pese a alteração trazida pela Lei n. 11.689/2008 tenha restringido a leitura de peças em Plenário, vedando às partes fazerem qualquer referência à decisão de pronúncia ou às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação como argumento de autoridade (art. 478, I, do CPP), prevê o art. 472, parágrafo único, do mesmo Estatuto Processual Penal que os jurados, após a formação do Conselho de Sentença e prestado o juramento, receberão cópias de referidas peças.
Ademais, o art. 480, § 3º, do CPP, dispõe que os jurados terão acesso aos autos, o que evidencia, assim, prognóstico seguro de que os jurados podem ter conhecimento da decisão de pronúncia eivada de vício, possibilitando risco de influência no ânimo e na imparcialidade do Conselho de Sentença.
Como se sabe, o Código de Processo Penal dispõe sobre a fundamentação da sentença de pronúncia em seu art. 413, § 1º, com a seguinte redação:
"Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. § 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena".
Nesse esteio, o juiz, ao pronunciar o acusado, deverá demonstrar a existência de prova acerca da materialidade do delito, bem como indícios de autoria, de modo sucinto, apresentando mero juízo de admissibilidade, sem incorrer em excesso de linguagem, sob pena de invadir a competência do Conselho de Sentença. Como bem anotado pelo Excelentíssimo Ministro FELIX FISHCER, "a tarefa do julgador, ao motivar as decisões relacionadas ao Tribunal do Júri, revela-se trabalhosa, uma vez que deve buscar o equilíbrio, a fim de evitar o excesso de linguagem, sem se descurar da necessidade de fundamentação adequada, conforme preceitua o art. 93, IX, da Constituição Federal; sem olvidar, ainda, da necessária fundamentação quando se tratar de determinação da remessa do feito para julgamento pelo Conselho de Sentença" (HC n. 579.411, DJe de 1°/6/2020).
Na doutrina pátria, colhe-se da judiciosa lição de Renato Brasileiro de Lima, acerca do tema, in verbis:
"6. Fundamentos da pronúncia e eloquência acusatória: sem embargo da necessidade de fundamentação da decisão judicial de pronúncia, sob pena de nulidade absoluta (CF, art. 93, IX), deve o juiz sumariante (ou Desembargadores, no julgamento de eventual recurso) ter extrema cautela para que não o faça nos mesmos moldes que uma sentença condenatória. Deve o magistrado se limitar a apontar a prova da existência do crime e os indícios suficientes de autoria ou participação, valendo-se de termos sóbrios e comedidos, para que não haja indevida influência no animus judicandi dos jurados, que podem ser facilmente influenciados por uma pronúncia dotada de excessos (ex: ' a covarde atitude do acusado reflete bem o seu caráter nefasto, comprovando a futilidade do delito'). Com efeito, se é foto notório que os jurados são facilmente influenciados a partir do momento em que percebem qual é a opinião do juiz presidente acerca do caso concreto, é de se concluir que fere o princípio da soberania dos veredictos a afirmação peremptória do magistrado que diz na pronúncia, a título de exemplo, que está plenamente convencido da autoria do delito. Em síntese, não se admite que o juiz sumariante queira converter a pronúncia, de mero juízo fundado de suspeita, em inadmissível juízo de certeza. Quando o juiz sumariante abusa da linguagem, proferindo a pronúncia sem moderação, caracteriza-se o que denomina de eloquência acusatória, causa de nulidade da referida decisão, que, uma vez declarada, acarreta o desentranhamento da pronúncia dos autos do processo e consequente necessidade de prolação de nova decisão" (LIMA, Renato Brasileiro de, Código de Processo Penal Comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.133/1.134).
No caso em apreço, o Tribunal a quo, ao determinar a submissão da paciente a novo julgamento pelo Tribunal do Júri, assim se manifestou, litteris:
"Com efeito, o veredicto do Conselho de Sentença que desclassificou a conduta imputada à apelada para o crime de lesão corporal revela-se manifestamente contrário à prova dos autos, a qual demonstrou, com robustez, o dolo de matar ('animus necandi'). A materialidade está patenteada no laudo de exame de corpo de delito (fls. 53/54), ao passo que a autoria encontra sustentação nos elementos informativos e na prova oral (fls. 1165/1169 mídia SAJ). Em plenário, a vítima, Lourenço Santos da Silva, confirmou os fatos descritos na inicial acusatória. Relatou que, no dia 08/05/2019, por volta das 21h00, a apelada (sua ex-nora) e mais nove indivíduos invadiram sua residência, afirmando que ele era 'Jack' (estuprador) e havia estuprado as filhas dela. O declarante foi amarrado e, logo, a apelada desferiu três golpes de faca em sua cabeça. A apelada e seus comparsas agrediram o declarante, dizendo que ele iria morrer. Ato contínuo, arrastaram o declarante pelo chão ('como se fosse um animal') e o levaram a um cativeiro. Nesse cativeiro, uma casa abandonada, o declarante continuou sendo agredido, desta vez com uma barra de ferro e um facão. De 30 em 30 minutos (aproximadamente), ao som de 'música pancadão', a apelada desferia de 03 a 05 facadas contra o declarante. O declarante teve um dedo e os ossos da face quebrados com a barra de ferro, enquanto seus algozes reiteravam que ele iria morrer. Se não bastasse, em dado momento, a apelada tentou decepar o pênis do declarante, mas este se defendeu como podia (com as pernas, com a cabeça e até mesmo com os braços, ainda amarrados), evitando o intento dela. Dali em diante, o declarante perdeu a consciência e não viu mais nada. Quando acordou, estava em um local deserto, próximo a uma estrada, e despencou no chão, amarrado por corda a uma árvore. Então, foi perfurado por mais três vezes, da barriga ao coração, momento em que escutou um deles dizendo: 'Corre, polícia, polícia!'. Os algozes fugiram e o declarante ficou sozinho por cerca de cinco minutos, até que um casal de idosos se aproximou e perguntou se poderia ligar para a polícia. Posteriormente, a polícia chegou e levou o declarante ao hospital, onde ele foi submetido a cirurgia. A apelada comandava os demais indivíduos. A ação criminosa se estendeu até as 04h00. O declarante ficou internado por 14 dias, passando pela UTI. Foram várias as sequelas dos ferimentos, inclusive na atividade respiratória. Após receber alta, o declarante chegou a presenciar indivíduos à sua procura em via pública. Diante disso, recebeu a ajuda de seu patrão, que lhe autorizou a residir na empresa por 03 meses. O declarante já mudou de residência, mas permanece com medo de morar na cidade de São Paulo. Ressalte-se que as declarações estarrecedoras da vítima se encontram em harmonia com os depoimentos judiciais prestados por seus familiares (Jonathan, Karina e Cleonice), que confirmaram o seu rapto na data dos fatos, e, principalmente, com o laudo de exame de corpo de delito (fls. 53/54), no qual se atestou que o ofendido sofreu lesões corporais de natureza grave. No laudo pericial supracitado, foi transcrito, no histórico, o teor do relatório médico atinente à internação da vítima: 'Paciente deu entrada no hospital [...] com espancamento e esfaqueamento, múltiplos ferimentos corto-contusos difusos, principalmente em tórax e abdômen. Apresentando pneumotórax aberto drenado no serviço, glasgow 14, dor intensa. Foi submetido à laparotomia exploradora em 09/05/2019, onde foi evidenciado perfuração gástrica em parede anterior em 2 locais, realizado rafias. Evoluiu clinicamente e hemodinamicamente estável, sem queixas, dreno retirado no dia 16/05/2019. CID 10 T 14 (Trauma de região não especificada do corpo)'. Na sequência, o perito apresentou sua descrição: 'Cicatriz cirúrgica mediana de laparotomia exploradora supra umbilical, múltiplas cicatrizes em hemitórax esquerdo e abdome superior, cicatriz de dreno de tórax à esquerda, múltiplas cicatrizes na mão direita e esquerda, 3 cicatrizes na face posterior do braço esquerdo, 3 cicatrizes na coxa esquerda, cicatriz na região nasal e região glabelar frontal do crânio'. Ora, o 'modus operandi' descrito pela vítima, característico do chamado 'Tribunal do Crime' (com a causação de ferimentos substanciais e gradativos, a fim de impor uma morte lenta e sofrida), e as reiteradas falas à vítima de que esta iria morrer evidenciam que a apelada e seus comparsas agiram com dolo direto de matar e só não consumaram a impiedosa execução sumária por circunstâncias alheias à sua vontade, quais sejam, uma suposta aproximação policial e o tempestivo socorro prestado ao ofendido. A propósito, mesmo que se entendesse pela ausência de dolo direto, é certo que houve dolo eventual, pois, diante da magnitude das lesões provocadas, ou tentadas (extirpação do órgão genital, e.g.), a vítima certamente viria a óbito se não fosse encontrada por populares, o que autoriza a conclusão de que os agentes, ao menos, aceitaram o resultado morte, com total indiferença. Como bem asseverou o 'Parquet' à fl. 1192, “o sujeito ativo que desfere vários golpes com instrumento de alta potencialidade lesiva (faca) em regiões vitais da vítima (cabeça, tórax e abdômen), seguida de tentativa de extração de órgão genital que invariavelmente acarretaria intensa hemorragia evidentemente atua com intenção de matar ou, no mínimo, assume o risco de produzir este resultado'. Revela-se irrelevante, em última análise, a veracidade ou não dos estupros que a apelada, inclusive em seu interrogatório, atribuiu à vítima. Afinal, ainda que os abjetos crimes sexuais tenham acontecido, isso, por óbvio, não confere à apelada o direito de fazer justiça com as próprias mãos." (fls. 25/27).
Vê-se que o Tribunal de origem, ao afirmar taxativamente a existência do dolo de matar, direto ou eventual, bem como ao utilizar proposições diretas acerca da comprovação do crime doloso contra a vida, proferiu, a meu sentir, um juízo de certeza quanto à autoria do delito, utilizando-se de linguagem capaz de influenciar a convicção dos jurados, em prejuízo do primado constitucional da plenitude de defesa.
Por oportuno, confira-se o seguinte excerto da peça opinativa: "Dessa forma, constata-se que houve indevida incursão do acórdão impugnado em matéria exclusiva do Tribunal do Júri, no âmbito de sua competência constitucional, ao proferir juízo de condenação passível de influenciar a soberania dos veredictos." (fl. 35).
A propósito, confiram-se os seguintes precedentes:
RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. SENTENÇA DE PRONÚNCIA EXCESSO DE LINGUAGEM. EXPRESSÕES PASSÍVEIS DE INFLUENCIAR O CONSELHO DE SENTENÇA. PRISÃO CAUTELAR. EXCESSO DE PRAZO. CONFIGURAÇÃO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO COM EFEITOS EXTENSIVOS. 1. Na sentença de pronúncia, o dever de fundamentação do magistrado deve ser cumprido dentro de limites estreitos, com linguagem comedida, sob pena de influenciar os jurados. As teses de defesa e elementos de prova devem ser sopesadas pelo Conselho de Sentença, por expressa previsão constitucional, sendo atribuídas, ao juiz presidente, apenas a direção e a condução de todo o procedimento, bem como a lavratura da sentença final. 2. A afirmação de que, sem qualquer dúvida, o veículo no qual estavam os réus deliberadamente ingressou a contramão para com a derrubada do motociclista com o fito de, com sua morte, fazer que os policiais parassem para socorrer a vítima e os deixassem fugir, traz forte valoração do mérito da causa, sendo, portanto, passível de influenciar o Conselho de Sentença. [...] 6. Recurso especial provido para anular a sentença de pronúncia para que outra seja proferida, determinando-se o seu desentranhamento dos autos, e, por consequência, relaxar a prisão cautelar da recorrente, com efeitos extensivos ao corréu DAVID SANTOS FERREIRA TAVARES, desconstituindo-se, em relação a ele, o trânsito em julgado. (REsp n. 1.723.140/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de 1º/9/2020.) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ACUSADO PRONUNCIADO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. IMPROVIMENTO. CONSIDERAÇÕES INCISIVAS DO TRIBUNAL A RESPEITO DO CRIME E DE SUA AUTORIA. EXCESSO DE LINGUAGEM CAPAZ DE INFLUENCIAR O CONSELHO DE SENTENÇA. EXISTÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e desta Corte Superior, a sentença de pronúncia deve se limitar a um Juízo de suspeita a respeito da acusação existente, evitando-se qualquer indicativo de certeza, considerações incisivas ou valorações sobre as teses da acusação ou da defesa que possam influenciar o ânimo do Conselho de Sentença. O mesmo entendimento deve ser aplicado ao acórdão que mantém a decisão de pronúncia. 2. Caso em que o Tribunal de origem emitiu juízo de certeza a respeito da acusação, ao afirmar que 'há inúmeras testemunhas', 'as provas dos autos revelam', 'diante do excesso da violência praticada', 'lesões incompatíveis com o atuar com ânimo de lesionar', expressões que, considerando o contexto em que foram empregadas, são capazes de influenciar o conselho de sentença. 3. Ordem concedida para anular o acórdão proferido no julgamento do Recurso em Sentido Estrito n. 0031384-47.1998.8.19.0001, devendo outro ser proferido, nos termos do art. 413, § 1º, do Código de Processo Penal (HC n. 576.289/RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe de 10/6/2020.) PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. HOMICÍDIO. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECISÃO DOS JURADOS CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. RECURSO PROVIDO. EXCESSO DE LINGUAGEM DO ACÓRDÃO IMPUGNADO. INVASÃO INDEVIDA DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA ANULAR O ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. 1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça não têm admitido o habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso ou a revisão criminal, salvo em situações excepcionais, quando manifesta a ilegalidade ou sendo teratológica a decisão apontada como coatora. 2. O acórdão que, dando provimento ao recurso ministerial de apelação, afirma categoricamente que a autoria do crime pelo Paciente está demonstrada pelo conjunto fático-probatório dos autos, adentra indevidamente na matéria de competência constitucional do Tribunal do Júri. 3. Evidente o excesso de linguagem do julgado que, remetendo-se aos depoimentos testemunhais, expressa, de forma inequívoca, juízo de condenação para repelir a decisão proferida pelos jurados, classificando-a veementemente como destoante das provas dos autos. 4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para anular o acórdão proferido pelo Tribunal a quo, em sede de recurso de apelação, determinando o seu desentranhamento dos autos e que outro seja proferido em observância aos preceitos legais e constitucionais. (HC n. 376.236/CE, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/6/2017, DJe de 14/6/2017.) Nessa mesma ordem de ideias, citam-se os seguintes julgados proferidos pela Colenda Corte Suprema: “HABEAS CORPUS” – PROCEDIMENTO PENAL DO JÚRI – DECISÃO DE PRONÚNCIA – SUPOSTO EXCESSO DE LINGUAGEM – INOCORRÊNCIA – PEDIDO INDEFERIDO. - A decisão de pronúncia deve ser sucinta, exatamente para evitar que a apreciação exaustiva do “thema decidendum” culmine por influenciar os próprios integrantes do Conselho de Sentença, que são os juízes naturais dos réus acusados e pronunciados por crimes dolosos contra a vida. Precedentes. Doutrina. O juízo de delibação subjacente à decisão de pronúncia impõe limitações jurídicas à atividade processual do órgão judiciário de que emana, pois este não poderá - sob pena de ofender o postulado da igualdade das partes e de usurpar a competência do Tribunal do Júri - analisar, com profundidade, o mérito da causa nem proceder à apreciação crítica e valorativa das provas colhidas ao longo da persecução penal. Inexistência de eloquência acusatória no conteúdo da decisão de pronúncia impugnada, que não antecipou qualquer juízo desfavorável ao paciente, apto a influir, de maneira indevida, sobre o ânimo dos jurados. (HC 113091, Relator(a): CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/11/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-231 DIVULG 22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013.) CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DOLOSO (CP, ART. 121). PRONÚNCIA. EXCESSO DE LINGUAGEM: AFIRMAÇÕES PEREMPTÓRIAS INDICANDO A AUTORIA. NULIDADE. VEDAÇÃO, DURANTE OS DEBATES, DE REFERÊNCIA À PRONÚNCIA (CP, ART. 478, I). GARANTIA DE ACESSO AOS AUTOS PELOS JURADOS E, OBVIAMENTE, AO CONTEÚDO DA PRONÚNCIA (CPP, ART. 480, § 3º). POSSIBILIDADE DE SEREM INFLUENCIADOS PELO EXCESSO VERBAL DO MAGISTRADO. VIOLAÇÃO À COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. 1. A decisão de pronúncia encerra mero juízo de admissibilidade da acusação, por isso que o magistrado deve limitar-se a apontar a materialidade e indicar comedidamente indícios suficientes de autoria (CPP, art. 413, § 1º). 2. In casu, o paciente foi preso em flagrante em 1994, sob a acusação da prática de homicídio doloso, e solto em 27/11/09, sob o fundamento de que a prisão perdurava por tempo superior ao que determina a lei (CPP, art. 648), e restou pronunciado por crime de homicídio doloso, tendo o Juiz afirmado que “Ao exame dos autos tornam-se incontroversas a Autoria e a materialidade com referência ao réu Antônio André de Souza”, “o paciente matou uma pessoa” e “conheceu esta mulher somente a um mês, mais ou menos, e já matou uma pessoa por sua causa”. 3. O juízo de reprovabilidade da conduta, tal como lançado na decisão de pronúncia, é apto a influenciar os jurados e, consequentemente, constitui violação ao preceito constitucional que define a competência do tribunal do júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida (CF, art. 5º, inc. XXXVIII, d). Precedentes: HC 193.037/PR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, DJe de 31/05/11; HC 99.834/SC, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJe de 16/03/11. 4. O § 1º do artigo 413 Código de Processo Penal adstringe o juiz presidente do tribunal júri ao relato da confissão e dos depoimentos das testemunhas e à conclusão acerca da existência de indícios suficientes de autoria 5. O artigo 478, I, do CPP, mercê de vedar, durante os debates, referências à decisão de pronúncia e às posteriores que julgaram admissível a acusação, não impede, na forma do artigo 480, § 3º, do mesmo Código, que os jurados tenham acesso aos autos e, obviamente, ao conteúdo da pronúncia, caso solicitem ao juiz presidente, do que resulta a possibilidade de serem influenciados pelo excesso de linguagem que, in casu, ocorreu. 6. Recurso ordinário em habeas corpus ao qual se dá provimento para anular a decisão de pronúncia, a fim de que outra seja proferida. (RHC 109068, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 14/02/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-053 DIVULG 13-03-2012 PUBLIC 14-03-2012.) HABEAS CORPUS. PRONÚNCIA. EXCESSO DE LINGUAGEM. OCORRÊNCIA. PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO ANTES DA DEVOLUÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS, MAS DEPOIS DE ESCOADO O PRAZO FIXADO PARA O SEU CUMPRIMENTO. POSSIBILIDADE. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. É possível o afastamento da Súmula 691 desta Corte, se verificada a ocorrência de flagrante ilegalidade que possa repercutir na liberdade de locomoção do paciente. Tanto a antiga redação do art. 408, quanto o atual art. 413 (na redação dada pela Lei 11.689/2008), ambos do CPP, indicam que o juiz, ao tratar da autoria na pronúncia, deve limitar-se a expor que há indícios suficientes de que o réu é o autor ou partícipe do crime. Todavia, o texto da pronúncia afirma que o paciente foi o autor do crime que lhe foi imputado, o que, à evidência, pode influenciar os jurados contra o acusado. Em casos como esse, impõe-se anulação da sentença de pronúncia, por excesso de linguagem (HC 93.299, rel. min. Ricardo Lewandowski, DJe de 24.10.2008). Por outro lado, ficou esclarecido que o prosseguimento da instrução ocorreu após o término do prazo conferido para o cumprimento das cartas precatórias expedidas para a oitiva de testemunhas arroladas pela defesa, o que está de acordo com o disposto no art. 222, §§ 1º e 2ª, do Código de Processo Penal. Habeas corpus parcialmente concedido, para anular a sentença de pronúncia. (HC 99834, Relator: JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 15/02/2011, DJe-049 DIVULG 15-03-2011 PUBLIC 16-03-2011.)
Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do habeas corpus, mas concedo a ordem, de ofício, para anular o acórdão impugnado, determinando que outro seja proferido, nos exatos termos do art. 413, § 1º, do CPP. Publique-se. Intimem-se.
Relator
JOEL ILAN PACIORNIK
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