STJ Abr25 - Acesso Integral às Provas Obtido Após o Início da Instrução - Homicídio - Nulidade Absoluta do Processo até o Recebimento da Denúncia - Cerceamento de Defesa - SUM Vinculante 14

  Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)

DECISÃO Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus interposto por M. DE. J. S. contra acórdão da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Bahia, no HC n. 8026960- 36.2023.8.05.000, mantido no julgamento dos embargos de declaração e assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. ART. 121, §2º, I, IV, V E VII C/C ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. JUÍZO A QUO QUE PROMOVEU AS DILIGÊNCIAS NECESSÁRIAS, EM REITERADAS VEZES, PARA QUE FOSSE DADO O ACESSO IRRESTRITO DOS AUTOS INCIDENTAIS AO PATRONO. CURSO REGULAR DO PROCESSO. ORDEM DENEGADA. 1. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor do paciente M. J. S., apontando, como Autoridade coatora, a MM. JUÍZA DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARRA DO CHOÇA/BA. 2. Alegação de cerceamento de defesa, sob o argumento de que não lhe foi concedido o acesso à integralidade dos autos que têm por objeto o homicídio em apuração. Não configurado. 3. Não obstante as arguições apresentadas, notadamente de que houve cerceamento de defesa nos autos supraditos, pela falta de acesso amplo e irrestrito a todo o material coletado na fase investigativa, na espécie, não restou caracterizado o cerceamento de defesa alegado. 4. In casu, constata-se que, em decisão proferida (ID 371264301 dos autos de origem), a MM. Juíza, ao receber a denúncia ofertada e tendo, concomitantemente, Documento eletrônico VDA46629893 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): MARCELO NAVARRO RIBEIRO DANTAS Assinado em: 04/04/2025 15:48:47 Publicação no DJEN/CNJ de 08/04/2025. Código de Controle do Documento: df227601-470e-4d9f-855d-1d91823ee211 indeferido o requerimento ministerial, determinou a retirada do sigilo que estava a se sobrepor aos autos incidentais, concedendo, por fim, acesso irrestrito aos referidos autos. Para mais, em despacho proferido (ID 460414253 dos autos de origem), deferiu o pedido formulado pela defesa técnica, sucedendo, pois, em reiteração da providência, à retirada do sigilo de todos os processos elencados pelo Impetrante, como se verifica, inclusive, do quão certificado nos autos (ID 461156499, autos originários). 5. Com efeito, consoante certidão carreada (ID 466625370, autos originários), consta certificado que fora sanada a situação alegada pela defesa técnica, e que ao patrono do paciente já teria sido dado total acesso aos autos n.º 8000944-19.2022.8.05.0020. Em derradeira movimentação processual, sobressai o ato ordinatório praticado (ID 472014360, autos de origem), datado de 04/11/2014, em que se constata a intimação do Ministério Público e da Defesa, para a apresentação de alegações finais, prazo, inclusive, que ainda está em curso. 6. Uníssono ao opinativo emitido pela Procuradoria de Justiça (ID 47311881), forçoso reconhecer que o Juízo a quo promoveu as diligências necessárias para que os impetrantes tivessem acesso irrestrito à integralidade da documentação, no caso concreto. 7. HABEAS CORPUS CONHECIDO E, NO MÉRITO, DENEGADO. (e-STJ, fls. 1395-1397)

Em seu arrazoado, o recorrente aponta cerceamento de defesa, uma vez que, mesmo após a retirada do sigilo dos autos principais e o recebimento da denúncia, os apensos investigativos permaneceram inacessíveis, causando prejuízo para a apresentação da resposta à acusação e, agora, para a apresentação das alegações finais. Afirma que, contrariamente ao que ocorreu com a defesa, o Ministério Público teve acesso irrestrito a tais elementos. Aponta afronta direta à Súmula Vinculante n. 14.

Requer o acesso a todo o material coletado e documentado pela autoridade policial antes da apresentação das alegações finais, além da declaração de nulidade do feito desde a decisão de que recebeu a denúncia. Sem pedido liminar e sem contrarrazões, o Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso (e-STJ, fls. 1515-1519).

É o relatório. Decido.

Ao analisar as alegações constantes na impetração originária, o Tribunal de Justiça entendeu pela ausência de cerceamento de defesa. Conforme relatado, o ora recorrente alega que os apensos investigativos permaneceram inacessíveis, causando prejuízo para a apresentação da resposta à acusação e, posteriormente, para a apresentação das alegações finais

No julgamento do habeas corpus originário, o Tribunal a quo registrou que, após exame dos autos de n. 8000120-26.2023.8.05.0020, a defesa apresentou petição de chamamento do feito à ordem, pugnando pela suspensão do processo até fosse dado pleno acesso a todo o material probatório, assegurando-se tempo hábil para análise e eventual requerimento de diligências complementares, visando garantir o exercício pleno da defesa antes da suas alegações derradeiras.

Consta que o pleito foi atendido pela Juíza de Direito da Vara Criminal de Barra do Choça-BA, que determinou a retirada do sigilo, concedendo, por fim, acesso irrestrito da defesa aos referidos autos. Contra referido acórdão, a defesa opôs embargos de declaração, alegando que o acesso pleno aos documentos somente ocorreu em agosto de 2024, meses após o início da ação penal, comprometendo a regularidade do processo desde a decisão que recebeu a denúncia.

Compulsando os autos, observa-se que o acesso à defesa a todo o material probatório ocorreu somente naquele momento processual, isto é, antes da apresentação das alegações finais, tendo os referidos elementos de prova permanecido inacessíveis até então, mesmo tendo sido demonstrado que a defesa havia postulado o acesso a todo o material desde o início da ação penal (e-STJ, fls. 50 e 53), daí porque a defesa alega a existência de prejuízo na elaboração da resposta à acusação.

Não obstante isso, a Corte estadual entendeu pela ausência de prejuízo concreto ao réu, uma vez que a defesa havia sido habilitada nos autos antes do oferecimento da denúncia, tendo apresentado resposta à acusação e manifestações posteriores.

De fato, sabe-se a jurisprudência desta Corte de Justiça há muito se firmou no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, consagrado no art. 563 do CPP. In casu, no entanto, o prejuízo à defesa na presente hipótese é evidente, na medida em que, ao não lhe ter sido franqueado o exame, antes do início da instrução criminal dos dados colhidos na fase inquisitiva, mesmo tendo ela requerido o referido acesso, reduziu-lhe a capacidade defensiva de refutar a acusação e produzir contraprova, em evidente ofensa à paridade entre os sujeitos do processo.

Com efeito, a resposta à acusação apresentada não pode ser considerada adequada aos interesses do réu, se não foi dado acesso à íntegra dos documentos que subsidiaram a acusação e que poderiam influenciar, inclusive, no rol de testemunhas ou nas provas a serem requeridas ou, ainda, na apresentação de documentação que pudesse contribuir à defesa. Dentro desse contexto, é de rigor o reconhecimento da nulidade do feito desde a decisão de que recebeu a denúncia (e-STJ, fl. 46), oportunizando-se à defesa a apresentação da resposta à acusação à luz dos elementos de prova agora disponíveis.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso para declarar a nulidade da Ação Penal n. 8000120-26.2023.8.05.0020 desde a decisão que recebeu a denúncia. Publique-se. Intime-se. Brasília, 04 de abril de 2025. Ministro Ribeiro Dantas Relator

(STJ - RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 213204 - BA (2025/0095122-3) RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS, Publicação no DJEN/CNJ de 08/04/2025.)

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