STJ Abr25 - ANPP Retroativa - Processo em tramitação - Suspensão da Condenação e Remessa ao MP para Propor : "Tema n. 1.098, em23/10/2024 do STJ"

   Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)

DECISÃO 

Aproveito o bem lançado relatório do representante do Ministério Público Federal (e-STJ fls. 454/456): 

Trata-se de Recurso Especial (fls. 394/ 404) interposto por XXXXXXX DA SILVA, por meio da Defensoria Pública da União, com fundamento no artigo 105, III, alínea “a”, da Constituição Federal, objetivando a reforma do Acórdão proferido pela Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, quando do julgamento da Apelação Criminal n.º 1.0479.16.015196-1/002. Consta dos autos que o Recorrente foi condenado à pena de 02 (dois) anos de detenção, em regime aberto, e 10 dias-multa, pela prática do crime previsto no art. 186, da Lei nº 9.472/97 (atividade clandestina de telecomunicações), por ter desenvolvido, clandestinamente, atividade de telecomunicação sem autorização de Órgão competente (fls. 251/ 253). Contra tal Sentença, a Defesa interpôs Recurso de Apelação perante o Tribunal a quo. A Turma Julgadora, por unanimidade, deu parcial provimento ao Apelo defensivo apenas para reconhecer a incidência da atenuante da confissão espontânea, sem reflexo na pena, nos termos da ementa a seguir transcrita (fls. 319/ 320): APELAÇÃO CRIMINAL ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÃO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO COMPETENTE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCABÍVEL. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 183 DA LEI N° 9.472197. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS MANTIDA. APELO DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O Juízo da 2' Vara Federal de Osasco/SP condenou o acusado pela prática do delito previsto no artigo 183 da Lei n° 9.472/97, por desenvolver atividade clandestina de telecomunicação, ao menos até o dia 23 de novembro de 2016. Documento eletrônico VDA46706296 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 07/04/2025 19:07:03 Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025. Código de Controle do Documento: b4f81301-ff12-4770-a880-a5b926299db3 2. O crime previsto no artigo 183 da Lei n° 9.472/97 possui natureza formal, de perigo abstrato, que tutela a segurança e higidez das telecomunicações no Brasil, bem como o controle e fiscalização estatal sobre tais atividades, bastando, pois, a prática da conduta para que se configure em concreto a conduta típica em questão. Não se há de falar, pois, em necessidade de lesão significativa aos serviços de telecomunicação nacional para que se tome típica a conduta (o que, de resto, tomaria crime apenas condutas clandestinas de imenso impacto, em absoluto desacordo seja com a dicção do tipo, seja com a finalidade e o bem jurídico tutelado pelo enunciado normativo). Este é também o fundamento que afasta a aplicação do princípio da insignificância ao caso dos autos, conforme entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça. 3. O tipo penal em lume está em consonância com o artigo 5°, inciso XXXIX, da Constituição Federal, que preconiza o princípio da reserva legal em matéria penal, o que afasta a alegação de sua inconstitucionalidade. 4. A materialidade e a autoria delitiva, bem como a presença do elemento subjetivo na conduta perpetrada pelo réu, restaram comprovadas pelos elementos colacionados aos autos, em especial pela confissão do acusado. 5. Reconhecida a incidência da atenuante prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal, visto que a confissão do réu foi utilizada para a formação do convencimento da julgadora, nos moldes da Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça. 5.1. O reconhecimento da atenuante da confissão espontânea não gera efeitos no caso em apreço, visto que, à luz da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena intermediária abaixo do mínimo legal. 6. Mantida a pena definitiva no mínimo legal. 7. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo, em favor de entidade assistencial a ser designada pelo Juízo da Execução. 8. Recurso da defesa a que se dá parcial provimento. Irresignado com o Acórdão, o Réu opôs o primeiro Recurso de Embargos de Declaração para suprir omissão do julgado, requerendo nulidade do julgamento da Apelação Criminal, por ausência de intimação pessoal da Defensoria Pública. O Recurso de Embargos restou conhecido e desprovido (fls. 346/ 358). Inconformado ainda com o posicionamento do Tribunal de origem, o Recorrente opôs um segundo Recurso de Embargos de Declaração para, novamente, suprir omissão do julgado, requerendo nulidade do Acórdão que julgou a Apelação Criminal, por ausência de intimação pessoal da Defensoria Pública, agora, aduzindo cerceamento de defesa. O Recurso de Embargos restou conhecido e desprovido (fls. 382/ 386). Contra as referidas Decisões foi interposto o presente Recurso Especial com fundamento no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, alegando negativa de vigência aos art. 28-A, 370, §4º, e ao artigo 564, inciso III, alínea “o”, todos do Código de Processo Penal; ao artigo 44, inciso I, da Lei Complementar n° 80/94 e ao artigo 5°, §5º, da Lei n° 1.060/50; ao artigo 183 da Lei n° 9.472/97, c/c o artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal. Ao final, requer seja admitido e provido o Recurso Especial, reformando-se o Acórdão combatido para remeter os autos “ao membro do Parquet competente para a propositura do acordo de não persecução penal (ou, se necessário, a remessa do processo ao órgão superior de revisão)”; para reconhecer a nulidade do julgamento da Apelação Criminal e demais atos subsequentes, para procedência de novo julgamento; e, por fim, para aplicação do Princípio da Insignificância, com a consequente absolvição do Recorrente. Contrarrazões apresentadas às fls. 415/ 436

Manifestou-se o Parquet Federal, então, pelo desprovimento do recurso (eSTJ fls. 454/464). É o relatório. Decido. Preenchidos os requisitos de admissibilidade, passo à análise do mérito do recurso especial. O Tribunal de origem, ao analisar os embargos de declaração defensivos, entendeu que (e-STJ fls. 351/354):

A norma que regula o ANPP traz, em seu bojo, carga de conteúdo processual e material, o que permite sua incidência não só aos casos em que ainda não houve ajuizamento da ação penal, como também aos processos em andamento, já que se revela mais benéfica ao réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal). Em decorrência, é possível fazer incidir o ANPP aos processos que já estavam em curso quando da entrada em vigor da Lei 13.964/19, mesmo que em fase recursal. Assim entendo pois, com a devida vênia de quem sustenta que tal só é possível até o momento anterior ao da prolação da sentença, tenho que por estar estampado em norma mais benéfica ao réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal), o ANPP pode ser entabulado e trazido aos autos em qualquer etapa processual antes do trânsito em julgado. Aliás, há orientação nesse sentido do órgão incumbido da coordenação, da integração e da revisão do exercício funcional dos membros do Ministério Público Federal na área criminal. [...] Destaco que trato aqui apenas dos processos cujo início se deu antes do advento da novel legislação, sendo distinta a análise para aqueles iniciados posteriormente, hipótese em que, evidentemente, as tratativas do referido acordo devem ocorrer obrigatoriamente antes do oferecimento da denúncia, pois a finalidade do instituto é justamente evitar o processo penal. DO MOMENTO A SE FAZER INCIDIR O ANPP Documento eletrônico VDA46706296 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 07/04/2025 19:07:03 Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025. Código de Controle do Documento: b4f81301-ff12-4770-a880-a5b926299db3 O art. 28-A do CPP estabelece que "não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime (...)" O acordo de não persecução penal é medida consensual de solução abreviada da lide penal, sujeita a requisitos e critérios previamente estabelecidos em lei. Inspira-se no chamado patteggiamento do direito italiano, criado com a reforma de processual italiana, nos termos dos arts. 444 e seguintes do Código de Processo Penal Italiano, como "aplicazione dela pena su richiesta delle parti ". Neste sentido: " tal instituto tem como vantagens essenciais a dispensa de toda a fase debatimental e a economia de todo o segundo grau de jurisdição, uma vez que " ( ATHAYDE BUONO, Carlos Eduardo e a sentença de primeiro grau é inapelável BENTIVOGLIO, Antônio Tomás. A Reforma Processual Penal Italiana - Reflexos no Brasil. RT, SP, pág.85). Por outro lado, partilho do entendimento de que o oferecimento de ANPP não é direito público subjetivo do investigado. Ao revés, tal instituto constitui poder-dever do titular da ação penal, a quem cabe analisar a possibilidade de sua aplicação. Neste sentido, já decidiu o STJ no AgRg no RHC 74.464/PR, que tratava da suspensão condicional do processo, compreendendo-a não como um direito subjetivo do acusado, mas sim um poder-dever do Ministério Público, a quem compete, com exclusividade, analisar a possibilidade de aplicação do referido instituto, desde que o faça de forma fundamentada. Esse mesmo raciocínio pode ser aplicado para o instituto do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), já que ambos têm o mesmo caráter de instrumento da Justiça Penal consensual. O Ministério Público não é obrigado a ofertar o acordo, pois a ele compete avaliar a aptidão e suficiência do mesmo para reprovação e prevenção do crime, observado que, na hipótese de não oferecimento, o órgão fundamente a razão pela qual está deixando de fazê-lo. Contudo, para os processos em curso quando da entrada em vigor da Lei que criou o ANPP, o momento processual da provocação é aquele imediatamente após a vigência, ou seja, na primeira oportunidade a parte poderia ter vindo a Juízo, peticionado e informado que tinha interesse em entabular o ANPP com o Ministério Público Federal. Repito, ainda me reportando a processos iniciados antes da entrada em vigor da nova regra, se o processo está em primeiro grau, o réu não pode aguardar a sentença para depois pleitear o acordo. Se está em grau recursal, não pode aguardar a manifestação do Tribunal para só então vir a Juízo manifestar seu interesse pelo ANPP. Admitir que o acusado ou a acusada aguardem o julgamento e, apenas na hipótese de um resultado que não lhes seja favorável, pleiteiem o ANPP, significa distorcer completamente o objetivo da legislação em baila, que tem como meta evitar a persecução penal, até porque, dado o seu caráter negocial, o ANPP deve observar os princípios da autonomia, da lealdade, da eficiência, do consenso, da boa-fé e da paridade de armas. Documento eletrônico VDA46706296 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 07/04/2025 19:07:03 Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025. Código de Controle do Documento: b4f81301-ff12-4770-a880-a5b926299db3 E não tendo o Ministério Público Federal ou a defesa do acusado comparecido aos autos para informar o interesse quanto ao ANPP, não cabia qualquer manifestação desta Corte quanto ao tema, dado esse caráter negocial do ANPP, que pressupõe a atuação da defesa e da acusação (ao Poder Judiciário cabe a verificação das condições e sua viabilidade e, se o caso, a homologação judicial). E nem se alegue que não foi oportunizado o ANPP à defesa. Intimada do julgamento, quedou-se inerte, preferindo aguardar o desfecho do julgado, para, só então, ciente de um resultado contrário às suas pretensões, se manifestar pela via dos declaratórios.

O presente recurso comporta provimento. Isso, porque o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Habeas Corpus n. 185.913, em 18/9/2024, concluiu pela possibilidade de aplicação do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), para as ações penais em andamento na data da vigência da Lei n. 13.964/2019, até o trânsito em julgado da condenação. Eis a ementa do julgado:

Ementa: Direito Penal e Processual Penal. Habeas corpus. ANPP - Acordo de Não Persecução Penal (art. 28-A do CPP, inserido pela Lei 13964/2019). Aplicação da lei no tempo e natureza da norma. Norma processual de conteúdo material. Natureza Híbrida. Retroatividade e possibilidade de aplicação aos casos penais em curso quando da entrada em vigor da Lei 13964/2019 (23.1.2020). Concessão da ordem. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado em face de acórdão da quinta turma do Superior Tribunal de Justiça em que se discute a possibilidade de aplicação retroativa do art. 28-A do Código de Processo Penal (CPP) a fatos ocorridos antes da sua entrada em vigência. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se o Acordo de Não-Persecução Penal (ANPP) previsto no art. 28-A do CPP, introduzido pela Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime), pode ser aplicado a fatos anteriores à sua entrada em vigência (23.1.2020) III. Razões de decidir 3. O ANPP, introduzido pelo Pacote Anticrime, é negócio jurídico processual que depende de manifestação positiva do legitimado ativo (Ministério Público), vinculada aos requisitos previstos no art. 28-A do CPP, de modo que a recusa deve ser motivada e fundamentada, autorizando o controle pelo órgão jurisdicional quanto às razões adotadas. 4. O art. 28-A do CPP, que prevê a possibilidade de celebração do ANPP, é norma de natureza híbrida (material-processual), diante da consequente extinção da punibilidade, razão pela qual deve ser reconhecida a sua incidência imediata em todos os casos sem trânsito em julgado da sentença condenatória. 5. O acusado/investigado não tem o direito subjetivo ao ANPP, mas sim o direito subjetivo ao eventual oferecimento ou a devida motivação e fundamentação quanto à negativa. A recusa ao Acordo de Não Persecução Penal deve ser motivada concretamente, com a indicação tangível dos requisitos objetivos e subjetivos ausentes (ônus argumentativo do legitimado ativo da ação penal), especialmente as circunstâncias que tornam insuficientes à reprovação e prevenção do crime. 6. É indevida a exigência de prévia confissão durante a Etapa de Investigação Criminal. Documento eletrônico VDA46706296 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 07/04/2025 19:07:03 Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025. Código de Controle do Documento: b4f81301-ff12-4770-a880-a5b926299db3 Dado o caráter negocial do ANPP, a confissão é ?circunstancial?, relacionada à manifestação da autonomia privada para fins negociais, em que os cenários, os custos e benefícios são analisados, vedado, no caso de revogação do acordo, o reaproveitamento da ?confissão circunstancial? (ad hoc) como prova desfavorável durante a Etapa do Procedimento Judicial. 7. O Órgão Judicial exerce controle quanto ao objeto e termos do acordo, mediante a verificação do preenchimento dos pressupostos de existência, dos requisitos de validade e das condições da eficácia, podendo decotar ou negar, de modo motivado e fundamentado, a respectiva homologação (CPP, art. 28-A, §§ 7º, 8º e 14) 8. Nas hipóteses de aplicabilidade do ANPP (CPP, art. 28-A) a casos já em andamento no momento da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, a viabilidade do oferecimento do acordo deverá ser avaliada pelo órgão ministerial oficiante na instância e no estágio em que estiver o processo. Se eventualmente celebrado o ANPP, será competente para acompanhar o seu fiel cumprimento o juízo da execução penal e, em caso de descumprimento, devem ser aproveitados todos os atos processuais anteriormente praticados, retomando-se o curso processual no estágio em que o feito se encontrava no momento da propositura do ANPP. IV. Dispositivo e tese 9. Concedida a ordem de habeas corpus para determinar a suspensão do processo e de eventual execução da pena até a manifestação motivada do órgão acusatório sobre a viabilidade de proposta do ANPP, conforme os requisitos previstos na legislação, passível de controle na forma do § 14 do art. 28-A do CPP. Teses de julgamento: ?1. Compete ao membro do Ministério Público oficiante, motivadamente e no exercício do seu poder-dever, avaliar o preenchimento dos requisitos para negociação e celebração do ANPP, sem prejuízo do regular exercício dos controles jurisdicional e interno; 2. É cabível a celebração de Acordo de Não Persecução Penal em casos de processos em andamento quando da entrada em vigência da Lei nº 13.964, de 2019, mesmo se ausente confissão do réu até aquele momento, desde que o pedido tenha sido feito antes do trânsito em julgado; 3. Nos processos penais em andamento na data da proclamação do resultado deste julgamento, nos quais, em tese, seja cabível a negociação de ANPP, se este ainda não foi oferecido ou não houve motivação para o seu não oferecimento, o Ministério Público, agindo de ofício, a pedido da defesa ou mediante provocação do magistrado da causa, deverá, na primeira oportunidade em que falar nos autos, após a publicação da ata deste julgamento, manifestar-se motivadamente acerca do cabimento ou não do acordo; 4. Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir da proclamação do resultado deste julgamento, a proposição de ANPP pelo Ministério Público, ou a motivação para o seu não oferecimento, devem ser apresentadas antes do recebimento da denúncia, ressalvada a possibilidade de propositura, pelo órgão ministerial, no curso da ação penal, se for o caso. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XL e LVII; 98, I; Código Penal, art. 2º, caput e parágrafo único; Código de Processo Penal, art. 28-A, caput, incisos I a V e §§ 1º a 14. Jurisprudência relevante citada: HC 75.343 /SP; HC 127.483/PR; Inq 4.420 AgR/DF; Pet 7.065-AgRg/DF; ADI 1.719/DF; Inq 1.055 QO/AM; HC 74.305/SP; HC 191.464 AgR/SC. (HC 185913, Relator GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/9/2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 18/11/2024 PUBLIC 19/11/2024, grifei.)

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, com a finalidade de se adequar ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, julgou o Tema n. 1.098, em 23/10/2024, entendendo ser possível o oferecimento do ANPP, nos processos em andamento na data do julgamento do habeas corpus pelo Suprema Corte, até o trânsito em julgado da condenação. Eis a ementa do julgado:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. ART. 28-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NORMA DE CONTEÚDO HÍBRIDO (PROCESSUAL E PENAL). POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA A PROCESSOS EM CURSO NA DATA DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI 13.964/2019, DESDE QUE AINDA NÃO TRANSITADA EM JULGADO A CONDENAÇÃO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DESTA CORTE. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DESPROVIDO. 1. Recurso representativo de controvérsia, para atender ao disposto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e na Resolução STJ n. 8/2008. 2. Delimitação da controvérsia: "(im)possibilidade de acordo de não persecução penal posteriormente ao recebimento da denúncia". 3. TESE: 3.1 - O Acordo de Não Persecução Penal constitui um negócio jurídico processual penal instituído por norma que possui natureza processual, no que diz respeito à possibilidade de composição entre as partes com o fim de evitar a instauração da ação penal, e, de outro lado, natureza material em razão da previsão de extinção da punibilidade de quem cumpre os deveres estabelecidos no acordo (art. 28-A, § 13, do Código de Processo Penal - CPP). 3.2 - Diante da natureza híbrida da norma, a ela deve se aplicar o princípio da retroatividade da norma penal benéfica (art. 5º, XL, da CF), pelo que é cabível a celebração de Acordo de Não Persecução Penal em casos de processos em andamento quando da entrada em vigor da Lei n. 13.964 /2019, mesmo se ausente confissão do réu até aquele momento, desde que o pedido tenha sido feito antes do trânsito em julgado da condenação. 3.3 - Nos processos penais em andamento em 18/09/2024 (data do julgamento do HC n. 185.913/DF pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal), nos quais seria cabível em tese o ANPP, mas ele não chegou a ser oferecido pelo Ministério Público ou não houve justificativa idônea para o seu não oferecimento, o Ministério Público, agindo de ofício, a pedido da defesa ou mediante provocação do magistrado da causa, deverá, na primeira oportunidade em que falar nos autos, manifestar-se motivadamente acerca do cabimento ou não do acordo no caso concreto. Documento eletrônico VDA46706296 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 07/04/2025 19:07:03 Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025. Código de Controle do Documento: b4f81301-ff12-4770-a880-a5b926299db3 3.4 - Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir de 18/09/2024, será admissível a celebração de ANPP antes do recebimento da denúncia, ressalvada a possibilidade de propositura do acordo, no curso da ação penal, se for o caso. 4. CASO CONCRETO: Situação em que, ao examinar apelação criminal interposta por dois réus, ambos condenados, no primeiro grau de jurisdição, por infração aos arts. 171, § 3º, c/c art. 14, II, do Código Penal, art. 297 e 298 do Código Penal, o TRF da 4ª Região decidiu, em preliminar, determinar a remessa do feito ao juízo de origem para verificação de eventual possibilidade de oferecimento do acordo de não persecução penal, julgando prejudicado o recurso defensivo. Entendeu o TRF que o art. 28-A do CPP possui natureza híbrida e deveria retroagir para alcançar os processos em fase recursal. Constatou, também que os delitos imputados aos recorrentes não haviam sido cometidos com violência ou grave ameaça e que as penas mínimas em abstrato dos delitos imputados a ambos os réus, mesmo somadas, não ultrapassavam o limite de 4 (quatro) anos previsto no art. 28-A do CPP. Inconformado, o órgão do Ministério Público Federal que atua perante a 4ª Região interpôs recurso especial sustentando, em síntese, que a possibilidade de realização de acordo de não persecução penal trazida pela novel legislação deve-se restringir ao momento anterior ao recebimento da denúncia. 5. Recurso especial do Ministério Público Federal a que se nega provimento. (REsp n. 1.890.343/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 23/10/2024.)

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para determinar o envio dos autos ao Juízo de primeira instância, a fim de que o Ministério Público Federal oficiante se manifeste sobre a possibilidade de oferecimento do ANPP, nos termos da fundamentação retro. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 07 de abril de 2025. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Relator

(STJ -  RECURSO ESPECIAL Nº 1979936 - SP (2022/0013054-5) RELATOR : MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Publicação no DJEN/CNJ de 09/04/2025)

👉👉👉👉 Meu Whatsaap de Jurisprudências, Formulação de HC eREsp - https://chat.whatsapp.com/FlHlXjhZPVP30cY0elYa10

👉👉👉👉GRUPO 02 Whatsaap de Jurisprudências Favoráveis do STJ e STF para A Advocacia Criminal

👉👉👉👉 ME SIGA INSTAGRAM @carlosguilhermepagiola.adv

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ Jun24 - Consunção Aplicada entre Receptação e Adulteração de Sinal de Identificador de Veículos - Exclusão da Condenação da Receptação

STJ Fev25 - Execução Penal - Prisão Domiciliar para Mãe Com Filho Menor de 12 Anos se Aplica para Presas Definitivas

STJ Dez24 - Estupro - Absolvição - Condenação Baseada Exclusivamente na Palavra da Vítima :"Vítima Prestou Depoimentos com Contradições"