STJ Abr25 - Execução Penal - Suspensão de Falta Grave - Fuga e Retorno Espontâneo :"Justificou por Ter que Cuidar de Menor - Retornou da Saída Temporária 10 dias Após a Data de Retorno" - Determinação para o Juízo analisar as Justificativas

  Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, sem pedido de liminar, impetrado em benefício de VXXXXXS, impugnando acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em julgamento do Agravo em Execução n. 8002620- 87.2024.8.21.0019.

Consta dos autos que o Juiz das Execuções reconheceu falta disciplinar em desfavor do executado, consistente em fuga praticada no dia 22/8/2024, com recaptura em 6/9/2024, sob o fundamento, em resumo, de que as ponderações defensivas não eximem o apenado de responsabilização, notadamente porquanto, além de admitir a prática da falta, não demonstrou interesse em retomar o cumprimento da pena (e-STJ, fls. 17/18).

Contra a decisão, a defesa interpôs agravo em execução perante a Corte de origem, a qual negou provimento ao recurso (e-STJ, fls. 6/11). Nesta impetração, a defesa sustenta, que por fortes questões humanitárias, não deve ser reconhecida a falta grave: 1) sua antiga procuradora não o avisou que havia sido decretado regime fechado; 2) é responsável pelos cuidados de sua filha de 8 anos e de dois idosos que residem em sua casa; e 3) o paciente se apresentou de livre e espontânea vontade, após providenciar os cuidados necessários à sua filha e aos idosos dos quais é responsável.

Ressalta que estava exercendo profissão lícita com reciclagem de sucatas e não cometeu crimes enquanto evadido do sistema prisional. Diante disso, requer a absolvição do paciente ou a aplicação de falta menos gravosa.

É o relatório. Decido.

As disposições previstas nos arts. 64, III, e 202 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça não afastam do Relator a faculdade de decidir liminarmente, em sede de habeas corpus e de recurso em habeas corpus, a pretensão que se conforma com súmula ou a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores, ou a contraria (AgRg no HC n. 513.993/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/7/2019; AgRg no HC n. 475.293/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 27/11/2018, DJe 3/12/2018; AgRg no HC n. 499.838/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 11/4/2019, DJe 22 /4/2019; AgRg no HC n. 426.703/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 18/10/2018, DJe 23/10/2018; e AgRg no RHC n. 37.622/RN, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 6/6/2013, DJe 14/6 /2013).

Nesse diapasão, uma vez verificado que as matérias trazidas a debate por meio do habeas corpus constituem objeto de jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal, não há nenhum óbice a que o Relator conceda a ordem liminarmente, sobretudo ante a evidência de manifesto e grave constrangimento ilegal a que estava sendo submetido o paciente, pois a concessão liminar da ordem de habeas corpus apenas consagra a exigência de racionalização do processo decisório e de efetivação do próprio princípio constitucional da razoável duração do processo previsto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, o qual foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela EC n. 45/2004 com status de princípio fundamental (AgRg no HC n. 268.099/SP, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 2/5/2013, DJe 13/5/20 13).

Na verdade, a ciência posterior do Parquet, longe de suplantar sua prerrogativa institucional, homenageia o princípio da celeridade processual e inviabiliza a tramitação de ações cujo desfecho, em princípio, já é conhecido ( EDcl no AgRg no HC n. 324.401/SP, Relator Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, julgado em 2 /2/2016, DJe 23/2/2016).

Em suma, para conferir maior celeridade aos habeas corpus e garantir a efetividade das decisões judiciais que versam sobre o direito de locomoção, bem como por se tratar de medida necessária para assegurar a viabilidade dos trabalhos das Turmas que compõem a Terceira Seção, a jurisprudência desta Corte admite o julgamento monocrático do writ antes da ouvida do Parquet em casos de jurisprudência pacífica (AgRg no HC n. 514.048/RS, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 6/8/2019, DJe 13/8/2019).

No que concerne ao conhecimento da impetração, o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.

Esse entendimento objetivou preservar a utilidade e a eficácia do mandamus, que é o instrumento constitucional mais importante de proteção à liberdade individual do cidadão ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantindo a celeridade que o seu julgamento requer. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados, exemplificativos dessa nova orientação das Cortes Superiores do País: HC n. 320.818/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 21/5/2015, DJe 27/5/2015; e STF, HC n. 113.890 /SC, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, julg. em 3/12/2013, DJ 28/2/20 14.

Assim, de início, incabível o presente habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Todavia, em homenagem ao princípio da ampla defesa, passa-se ao exame da insurgência para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.

Falta disciplinar - fuga

O Tribunal manteve o reconhecimento da falta grave, sob o fundamento, em suma, de que as justificativas apresentadas pelo reeducando, na audiência perante o Juiz, não foram suficientes a esclarecer o seu não retorno ao cumprimento da pena, o exercício do serviço externo tem como base regras de conduta a serem seguidas e a conduta do apenado revela dificuldades de controlar seu ímpeto.

Respeitado o voto acima, esta Corte entende de modo diverso. Tanto o Juiz quanto o Tribunal relataram que o executado não retornou para o cumprimento da pena por livre e espontânea vontade, após a evasão do cárcere. Ocorre que, conforme mostra a consulta da ocorrência, após a fuga, ele apresentou-se na delegacia a fim de cumprir a sua prisão, não tendo ocorrido flagrante delito (STJ, fl. 12).

Por outro lado, somente retornou à prisão mais de 10 dias depois que sumiu. E não há comprovação da justificativa apresentada, de que é responsável pelos cuidados de sua filha de 8 anos e de dois idosos que residem em sua casa.

Desse modo, deve o Juiz, quem está mais perto dos fatos, reavaliar a infração disciplinar, considerando ao menos o retorno espontâneo do detento ao cárcere e verificando a veracidade da justificativa apresentada pelo apenado. Nesse sentido:

[...] V - Não se está a olvidar de precedentes desta 5.ª Turma, no sentido de que o retorno espontâneo do Apenado ao cárcere, sem outras consequências delituosas do ato disciplinar, não caracteriza a falta grave (REsp 1052342/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5.ª T, DJe 28/09/2009 e HC 87.281/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5.ª T, DJe 23/06/2008) [...]

Ante o exposto, não conheço do habeas corpus, mas concedo a ordem de ofício , apenas para determinar que o Juízo de origem reaprecie a falta disciplinar, considerando o fator positivo do retorno espontâneo ao cárcere e verificando a veracidade da justificativa apresentada pelo apenado. Comunique-se, com urgência. Intimem-se. Brasília, 01 de abril de 2025. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA Relator

(STJ - HABEAS CORPUS Nº 992727 - RS (2025/0111979-1) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA, Publicação no DJEN/CNJ de 03/04/2025)

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