STJ Abr25 - Execução Provisória da Pena - Prisão Revogada - Tipo Art. 273 CP - Venda Ilegal de Medicamentos :ADCs n. 43,44 e 54,
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto por VALSIDES FXXXXXXXX, com fundamento na alínea "a" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região no julgamento da Apelação Criminal n. 5002795-68.2017.4.04.7106/RS.
Consta dos autos que o recorrente foi condenado pela prática do crime previsto no art. 273, §1º-B, inciso I, do Código Penal (importação de medicamentos sem registro no órgão competente) à pena inicial de 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 191 (cento e noventa e um) dias-multa. A apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal foi provida, para afastar a minorante da tentativa e redimensionar a pena para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 39 (trinta e nove) dias-multa, determinando, ainda, a execução provisória da pena (e-STJ fls. 1439/1440). Eis a ementa do julgado:
PENAL. IMPORTAÇÃO DE MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO COMPETENTE. ENQUADRAMENTO LEGAL. ART. 273, § 1º-B, I, DO CP. GRANDE QUANTIDADE. APLICAÇÃO DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06 MANTIDA FACE AUSÊNCIA DE RECURSO DA ACUSAÇÃO. CRIME CONSUMADO. MINORANTE DA TENTATIVA AFASTADA. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E MULTA ADEQUADAS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. 1. Conforme assentado na arguição de inconstitucionalidade 5001968- 40.2014.404.0000, na importação de grande quantidade de medicamentos, deve ser aplicado o art. 273 na sua íntegra; em se tratando de média quantidade, aplicável o preceito secundário do art. 33 da Lei 11.343/06 ao crime previsto no art. 273 e parágrafos; e, na importação ilícita de pequena quantidade de medicamentos, não há potencial violação ao bem jurídico tutelado pelo art. 273 do Código Penal, devendo ser desclassificada a conduta, conforme a data da sua prática, para o art. 334, caput, primeira figura, do Código Penal, na anterior redação, ou para o art. 334-A, com a atual redação. 2. Constatada a grande quantidade de medicamentos de origem estrangeira e sem registro no órgão competente importados pelo réu, mantém-se a condenação pelo crime do artigo art. 273, §1º-B, I do Código Penal com a aplicação do preceito secundário do art. 33, caput, da Lei nº. 11.343/2006, face à ausência de recurso do Ministério Público. 3. Constatado que o réu adentrou no território nacional com os medicamentos de origem estrangeira e de venda proibida no Brasil e, portanto, consumado o delito, deve ser afastada a minorante da tentativa. 4. Pena privativa de liberdade e multa aumentadas. 5. Execução provisória da pena autorizada, conforme entendimento firmado pelo STF (HC 126.292). Súmula 122 TRF4.
No recurso especial (e-STJ fls. 1448/1469), com fundamento no art. 105, III, " a", do art. 105 da CF, o recorrente alega violação aos artigos 14, II e 273, § 1º-B, inciso I, do Código Penal, uma vez que o delito teria ocorrido na forma tentada, e não consumada, pois teria sido flagrado durante a fiscalização aduaneira, sem que tivesse conseguido internalizar as mercadorias.
Argumenta, ainda, que a decisão do Tribunal teria violado o art. 147 da Lei de Execução Penal e art. 283 do Código de Processo Penal, tendo em vista a impossibilidade de execução provisória da pena em face do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, das Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 43, 44 e 54, que firmaram o entendimento de que a execução das penas deve ocorrer somente após o trânsito em julgado da condenação. O recurso especial foi admitido na origem (e-STJ fl. 1489).
O Ministério Público Federal, em seu parecer, manifestou-se não conhecimento do recurso especial, ressaltando ser cabível a suspensão da execução provisória da pena (e-STJ fls. 1504/1513).
É o relatório. Decido.
A controvérsia principal veiculada no presente recurso especial centra-se na definição do momento consumativo do crime de importação de medicamentos sem registro no órgão competente (art. 273, § 1º-B, inciso I, do Código Penal), para fins de verificação da ocorrência, ou não, da forma tentada e da consequente aplicação da causa de diminuição prevista no art. 14, II, do Código Penal.
Secundariamente, discutese a possibilidade de execução provisória da pena antes do trânsito em julgado da condenação criminal. Quanto ao primeiro ponto, o recorrente afirma que o delito pelo qual foi condenado - importação de medicamentos sem registro no órgão competente (art. 273, § 1º-B, inciso I, do Código Penal) - foi praticado na forma tentada, uma vez que ele foi flagrado ainda na zona primária de fiscalização alfandegária, não tendo logrado internalizar as mercadorias em território nacional.
O Tribunal de origem, por sua vez, entendeu estar caracterizada a consumação delitiva, fundamentando sua conclusão nas particularidades do caso concreto. Segundo o acórdão recorrido, a fiscalização na qual o recorrente foi flagrado ocorreu em um posto da Polícia Rodoviária Federal localizado na rodovia de saída da cidade de Santana do Livramento/RS, e não em zona primária alfandegária.
Com base nessa premissa fática, o TRF da 4ª Região concluiu que o recorrente já havia adentrado no território nacional com os medicamentos, ultrapassando a zona primária de fiscalização, o que caracterizaria a consumação do delito. A fundamentação do acórdão recorrido, no ponto, foi expressa nos seguintes termos:
"Todavia, há particularidades no caso concreto que não se pode perder de vista. Consta do auto de prisão em flagrante (Evento 1 INIC1 p. 3 da ação penal) que, em fiscalização de rotina no posto da Polícia Rodoviária Federal da BR 158, na cidade de Livramento/RS foi determinado que o ônibus da Viação Ouro e Prata, que trafegava no sentido Livramento-Porto Alegre encostasse para fins de conferência de bagagens e, ao se proceder à verificação das bolsas e malas, chamou a atenção o fato de se encontrar quatro volumes de um mesmo passageiro, no caso, o réu. Portanto, considerando que a aduana está localizada no centro da cidade de Livramento e que o ônibus foi parado pelos policiais na rodovia de saída da cidade, não se pode dizer que estava em zona primária. Desse modo, o réu adentrou no território nacional com os medicamentos de origem estrangeira e de venda proibida no Brasil." (e-STJ fl. 1421/1422)
A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça caminha no sentido de que a consumação de crimes que tenham como núcleo do tipo o verbo “importar”, em locais sujeitos à fiscalização da zona alfandegária, somente se dará após a liberação da mercadoria pelas autoridades competentes ou após a transposição da zona fiscal. A propósito:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRABANDO (ART. 334-A DO CP). MOMENTO CONSUMATIVO. FISCALIZAÇÃO PELA ZONA ALFANDEGÁRIA. TENTATIVA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao decidir a controvérsia, consignou que, tendo sido o acusado flagrado no Terminal Aduaneiro da BR290, proximidades da Ponte Internacional, em Uruguaiana/RS, zona primária de fiscalização, deve ser reconhecida a modalidade tentada do delito (art. 14, inciso II, do Código Penal), uma vez que a consumação restou frustrada em razão da atuação dos agentes da fiscalização aduaneira. 2. Tal entendimento encontra-se no mesmo sentido da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça de que a consumação de crime, em locais sujeitos à fiscalização da zona alfandegária, somente se dará após a liberação da mercadoria pelas autoridades competentes ou a transposição da aludida zona fiscal. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 1.910.887/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/10/2021, DJe de 25/10/2021.)
Portanto, caracteriza-se a tentativa quando ocorrem situações onde a fiscalização aduaneira impede a ultrapassagem das mercadorias para além da zona primária alfandegária. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região partiu da premissa de que a aduana estaria localizada no centro da cidade de Santana do Livramento/RS, enquanto o recorrente teria sido flagrado em um posto da Polícia Rodoviária Federal localizado na rodovia de saída da cidade.
Com efeito, o Tribunal de origem assentou, mediante apreciação das circunstâncias fáticas do caso concreto, que a abordagem ao recorrente não ocorreu na zona primária alfandegária, mas sim em um posto da Polícia Rodoviária Federal localizado na rodovia de saída da cidade de Santana do Livramento/RS, tendo concluído que o agente já havia adentrado no território nacional com os medicamentos, ultrapassando a zona primária de fiscalização, o que configuraria a consumação do delito.
Para modificar tal conclusão e reconhecer a forma tentada do crime, como pretende o recorrente, seria imprescindível a reapreciação do contexto fático-probatório delineado nos autos, especialmente quanto à localização exata do posto de fiscalização onde ocorreu a abordagem e sua natureza (se alfandegária ou meramente policial), bem como se o recorrente já havia ou não ultrapassado a zona primária de fiscalização quando foi flagrado, análise essa que encontra óbice intransponível na mencionada Súmula n. 7/STJ.
Não obstante, em relação ao segundo ponto suscitado pelo recorrente, referente à execução provisória da pena, assiste-lhe razão.
O Tribunal a quo determinou o imediato cumprimento da sanção após o esgotamento da jurisdição ordinária, com fundamento no entendimento então vigente do Supremo Tribunal Federal (HC 126.292) e na Súmula n. 122 do TRF4. Ocorre que a Corte Suprema, no julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 43, 44 e 54, ocorrido em 7/11/2019, modificou seu entendimento anterior e assentou a constitucionalidade do art. 283 do Código de Processo Penal, na redação dada pela Lei n. 12.403/2011. A interpretação constitucional firmada pelo Pretório Excelso estabeleceu que, ressalvadas as hipóteses em que estão presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva ou temporária, é constitucional a regra do Código de Processo Penal que prevê o esgotamento de todas as possibilidades de recurso para que então seja iniciado o cumprimento definitivo da pena.
A nova orientação jurisprudencial da Suprema Corte impõe, portanto, a revisão da determinação de execução provisória da pena realizada pelo Tribunal a quo, visto que, no caso em tela, não tendo ocorrido ainda o trânsito em julgado da condenação e fundamentando-se a custódia exclusivamente na determinação de execução provisória da pena outrora permitida, configura-se constrangimento ilegal a ser sanado. Esse entendimento foi inclusive reconhecido pelo Ministério Público Federal, que em seu parecer manifestou-se expressamente pela suspensão da execução provisória da pena até o trânsito em julgado da condenação.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso especial para afastar a determinação de execução da pena antes do trânsito em julgado para ambas as partes. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 07 de abril de 2025. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Relator
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