STJ Mar25 - Detração - Período de Recolhimento Domiciliar Noturno - Tema 1.155 do STJ
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em favor de EXXXXXXX em que se aponta como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
Consta dos autos que o Juízo das execuções indeferiu pedido de detração do período em que o sentenciado foi beneficiado com liberdade provisória cumulada com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, o que foi mantido pelo Tribunal de origem.
A impetrante sustenta que seria possível detrair o período em que o paciente cumpriu liberdade provisória, com imposição de medidas cautelares, aduzindo que o recolhimento noturno não seria diferente do regime semiaberto. Requer, liminarmente, a suspensão dos efeitos do acórdão impugnado.
No mérito, pugna pela concessão da ordem para que seja reconhecido o direito à detração, nos termos do Tema n. 1.155 do STJ. Indeferida a liminar e prestadas informações, o Ministério Público Federal se manifestou pelo não conhecimento do writ.
É o relatório.
O Superior Tribunal de Justiça entende que é inadmissível a utilização do habeas corpus como sucedâneo de recurso próprio, previsto na legislação, impondo-se o não conhecimento da impetração. Sobre a questão, confiram-se os seguintes julgados desta Corte Superior (grifei):
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. ABSOLVIÇÃO IMPETRAÇÃO DE HABEAS CORPUS NA FLUÊNCIA DO PRAZO PARA A INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS NA ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. 1. "O writ foi manejado antes do dies ad quem para a interposição da via de impugnação própria na causa principal, o recurso especial. Dessa forma, a impetração consubstancia inadequada substituição do recurso cabível ao Superior Tribunal de Justiça, não se podendo excluir a possibilidade de a matéria ser julgada por esta Corte na via de impugnação própria, a ser eventualmente interposta na causa principal" (AgRg no HC n. 895.954/DF, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo - Desembargador Convocado do TJSP, Sexta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 20/8/2024.) 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 939.599/SE, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 28/10/2024 – grifo próprio.) DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO HABEAS CORPUS COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo regimental interposto por Pablo da Silva contra decisão monocrática que não conheceu de habeas corpus, com base no entendimento de que o habeas corpus foi utilizado em substituição a revisão criminal. O agravante foi condenado a 1 ano de reclusão, com substituição da pena por restritiva de direitos, pela prática de furto (art. 155, caput, CP). A defesa pleiteou a conversão da pena restritiva de direitos em multa, alegando discriminação com base na condição financeira do paciente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é cabível o conhecimento do habeas corpus utilizado em substituição à revisão criminal; e (ii) estabelecer se a escolha da pena restritiva de direitos, em vez de multa, configura discriminação por condição financeira. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O habeas corpus não é admitido como substituto de revisão criminal, conforme a jurisprudência consolidada do STJ e do STF, ressalvados casos de flagrante ilegalidade. 4. Não houve demonstração de ilegalidade evidente na escolha da pena restritiva de direitos, sendo esta compatível com a natureza do crime e as condições pessoais do condenado. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: 1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substituto de revisão criminal, salvo em casos de flagrante ilegalidade. 2. A escolha de pena restritiva de direitos, em substituição à privativa de liberdade, não configura discriminação por condição financeira, desde que adequadamente fundamentada. Dispositivos relevantes citados: Código Penal, art. 155; STJ, AgRg no HC 861.867/SC; STF, HC 921.445/MS. (AgRg no HC n. 943.522/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 22/10/2024, DJe de 4/11/2024.)
Portanto, não se pode conhecer da impetração. Por outro lado, observada a possibilidade de concessão da ordem de ofício, prevista no art. 647-A do Código de Processo Penal, anoto que a controvérsia refere-se à consideração do período em que o sentenciado esteve sob medidas cautelares diversas da prisão para detração penal.
A Corte estadual manteve o indeferimento do pedido de detração nos seguintes termos (fls. 11-13):
Trata-se de pedido de detração da pena pelo período em que o sentenciado cumpriu recolhimento domiciliar noturno como medida cautelar. Como é cediço, o C. Superior Tribunal de Justiça, no Tema 1155, estabeleceu que esse período deve ser detraído da pena privativa de liberdade, em respeito aos princípios da proporcionalidade e do non bis in idem. Contudo, o MM. Juízo a quo considera decisões do E. Supremo Tribunal Federal (ARE 1.387.036 e RHC 190429 AgR) que indicam que a detração só é cabível quando há equivalência entre a medida cautelar e a pena final. O art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal dispõe que a detração será feita em relação ao tempo de prisão ou de internação. Ou seja, não há previsão legal para detração de período de cumprimento de medida cautelar alternativa à prisão, o que impossibilita o atendimento do pleito da combativa defesa. De se ressaltar que não se olvida da tese constante do Tema Repetitivo nº 1.155 do STJ, segundo o qual a detração é aplicável quando a medida cautelar imposta diz respeito ao recolhimento domiciliar noturno e em dias de folga. No entanto, no caso concreto, depreende-se que ao sentenciado foram impostas medidas cautelares alternativas à prisão, dentre elas o recolhimento domiciliar noturno. Todavia, a pena final fixada ao sentenciado foi privativa de liberdade em regime semiaberto Portanto, a pena aplicada é em regime semiaberto, não havendo tal equivalência. Assim, a consequência é que o tempo de recolhimento noturno não será descontado da pena do sentenciado. Em face do exposto, diante da inexistência de previsão legal e não enquadramento do caso nos limites constantes do Tema Repetitivo nº 1.155 do c. STJ, de rigor a manutenção da r. decisão recorrida.
Sobre a matéria em discussão, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp n. 1.977.135/SC, sob o rito dos recursos repetitivos, Tema n. 1.155 do STJ, fixou a seguinte tese:
1) O período de recolhimento obrigatório noturno e nos dias de folga, por comprometer o status libertatis do acusado, deve ser reconhecido como período a ser detraído da pena privativa de liberdade e da medida de segurança, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e do non bis in idem. 2) O monitoramento eletrônico associado, atribuição do Estado, não é condição indeclinável para a detração dos períodos de submissão a essas medidas cautelares, não se justificando distinção de tratamento ao investigado ao qual não é determinado e disponibilizado o aparelhamento. 3) As horas de recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga devem ser convertidas em dias para contagem da detração da pena. Se no cômputo total remanescer período menor que vinte e quatro horas, essa fração de dia deverá ser desprezada.
Nesse contexto, o acórdão impugnado contraria a orientação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ao manter a decisão que indeferiu o pedido de detração do período em que o paciente, em liberdade provisória, cumpriu a medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno. A propósito:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. RECOLHIMENTO DOMICILIAR NOTURNO E AOS FINAIS DE SEMANA. DETRAÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O período de cumprimento da medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno, inclusive aos fins de semana e feriados, com ou sem monitoramento eletrônico, por representar limitação efetiva ao direito de locomoção, deve ser computado para fins de detração penal. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 789.905/SC, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 21/5/2024, DJe de 28/5/2024.) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. FUNDAMENTOS DA DECISÃO QUE INADMITIU O RECURSO NÃO COMBATIDOS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. DETRAÇÃO. PERÍODO DE RECOLHIMENTO DOMICILIAR NOTURNO. CONCESSÃO DE OFÍCIO. 1. Não há ofensa ao princípio da colegialidade diante da existência de previsão legal e regimental para que o relator julgue, monocraticamente, o agravo em recurso especial quando constatar as situações descritas no art. 932, III, do CPC, c/c o art. 253, parágrafo único, I, do RISTJ, hipótese ocorrida nos autos. 2. É ônus da parte agravante impugnar as causas específicas de inadmissão do recurso especial, sob pena de incidência da Súmula n. 182 do STJ. 3. Na espécie, o insurgente deixou de infirmar a aplicação das Súmulas 284 do STF e 83 do STJ, a impossibilidade de alegação de divergência com paradigmas oriundos de habeas corpus, mandado de segurança ou recurso ordinário e a deficiência de cotejo analítico. 4. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou a compreensão majoritária de que o período de cumprimento de medida cautelar de recolhimento domiciliar deve ser computado para fins de detração penal por representar limitação à liberdade de locomoção, uma vez que o rol do art. 42 do Código Penal é numerus apertus. 5. Agravo regimental não provido. Habeas corpus concedido de ofício para que se proceda à detração do período de cumprimento da medida cautelar de recolhimento noturno do recorrente. (AgRg no AREsp n. 2.026.411/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 24/5/2022.)
No mesmo sentido, a orientação do Supremo Tribunal Federal:
HABEAS CORPUS – POSSIBILIDADE DE DETRAÇÃO SOBRE O PERÍODO DE RECOLHIMENTO NOTURNO – TEMA 1.555 DO STJ – ORDEM CONCEDIDA. 1) A orientação jurisprudencial disposta no Tema 1.155, por decisão tomada em sede de Recurso Repetitivo no Colendo STJ, estabelece que “O período de recolhimento obrigatório noturno e nos dias de folga, por comprometer o status libertatis do acusado, deve ser reconhecido como período a ser detraído da pena privativa de liberdade e da medida de segurança, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e do non bis in idem”. 2) A orientação proveniente de incidentes de uniformização de jusrisprudência devem prevalecer sob julgados esparços, diante da força vinculante dos precedentes, notadamente Repercussão Geral e Recursos Repetitivos. 3) Ordem concedida. (ARE n. 1.531.634/ES, relator Ministro Luis Roberto Barroso, Presidência, julgado em 21/1/2025, DJe de 22/1/2025.)
Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do habeas corpus, contudo, concedo a ordem, de ofício, para determinar que o Juízo da execução penal, em nova decisão, proceda ao cômputo do período de vigência do cumprimento da medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno para detração, nos termos do Tema n. 1.155 do STJ. Comunique-se. Publique-se. Intimem-se.
Relator
OG FERNANDES
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