STJ Mar25 - Revogação de Prisão Preventiva - Homicídio Qualificado - Ferimento ao Art. 315 do CPP :"Réu Teve a Prisão Preventiva Revogada, ficou 2 anos em liberdade, prisão dada na pronúncia, ausência de novos elementos, extemporaneidade

  Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)

DECISÃO

IGOR DXXXXXXalega ser vítima de coação ilegal em decorrência de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia no Habeas Corpus n. 8052962-09.2024.8.05.0000. Consta dos autos que o paciente foi pronunciado pela prática do delito previsto no art. 121, § 2º, II, III e IV, todos do Código Penal.

A defesa sustenta, em síntese, o não preenchimento dos requisitos para a manutenção da medida extrema do art. 312 do CPP e ausência de contemporaneidade dos fatos que embasaram a decretação da prisão preventiva, razão pela qual pleiteia a revogação da custódia provisória do paciente, ainda que com a imposição de cautelares diversas. Indeferida a liminar, o Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (fls. 149-154).

Decido.

A prisão preventiva é compatível com a presunção de não culpabilidade do acusado desde que não assuma natureza de antecipação da pena e não decorra, automaticamente, do caráter abstrato do crime ou do ato processual praticado (art. 313, § 2º, CPP).

Além disso, a decisão judicial deve apoiar-se em motivos e fundamentos concretos, relativos a fatos novos ou contemporâneos, dos quais se possa extrair o perigo que a liberdade plena do investigado ou réu representa para os meios ou os fins do processo penal (arts. 312 e 315 do CPP).

O Juízo singular, ao decretar a prisão preventiva do paciente, assim fundamentou a decisão (fls. 98-99):

A prisão preventiva, de natureza indubitavelmente cautelar, em razão de descumprimento de medida cautelar diversa da prisão, é medida excepcional, podendo ser decretada pelo magistrado em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, desde que haja real necessidade, a qual é aferida pela presença dos pressupostos previstos nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. No caso em exame, foram observados tais requisitos para a concessão da medida cautelar diversa da prisão, como também que o denunciado foi devidamente advertido quanto à possibilidade de revogação do benefício ora concedido, com a imposição de medida mais gravosa ou decretação da prisão preventiva, nos termos do art. 282, §4º do CPP, o qual prediz que: Art. 282 [...] §4º. No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). Diante da análise dos autos, conclui-se que as cautelares outrora fixadas não foram suficientes para impedir a continuidade delitiva por parte do denunciado, uma vez que as descumpriu sendo, inclusive, preso em outro Estado, conforme notícias divulgadas pela mídia. Além disso, o fato de o réu, apenas dois anos após a audiência em que o juiz revogou sua prisão, ter sido denunciado pelo crime de homicídio, demonstra a ineficácia de medidas cautelares diversas da prisão. A prisão preventiva deve ser decretada para garantir a ordem pública, haja vista o risco concreto de reiteração delitiva, pois o réu responde a outra ação penal, constando, ainda, em seu desfavor, outros pedidos de prisão preventiva. Em uma breve pesquisa no PJE, pode-se constatar que o réu responde a outra ação penal, qual seja o processo nº 8000636-35.2024.8.05.0271, pela prática dos crimes tipificados no caput do artigo 121, §2º, Inciso II c/c artigo 14, inciso II (tentativa de homicídio por motivo torpe); artigo 250, §1º, inciso II, alínea “a” (incêndio em casa habitada); e no artigo 157, §2º, inciso II e § 2º-A, inciso I (roubo em concurso de pessoas e com emprego de arma de fogo), todos do Código Penal, bem como no artigo 1º, §1º, da Lei 12.850/2013 (associação criminosa). Dessa forma, demonstrada extrema necessidade de decretação da prisão preventiva, especialmente para garantia da ordem pública, assegurando a segurança da vítima e evitando-se o cometimento de novos crimes, bem como para garantia da aplicação da lei penal. Por fim, o descumprimento foi comunicado recentemente, atendendo ao requisito da contemporaneidade, previsto no art. 312, §2º, do CPP. Ante o exposto, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA de IGOR DOS SANTOS SOUSA, qualificado nos autos, com fulcro nos artigos 282, §4º, 312, §1º e §2º, e 313, III, todos do CPP, com o escopo de assegurar a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal, consoante fundamentos alhures delineados. Por ocasião da pronúncia, a cautela mais extrema foi mantida, nos seguintes termos (fls. 37-38, grifei): Por fim, entendo como cabível a manutenção da prisão preventiva, conforme razões que se passa a expor. De proêmio, o delito imputado ao Denunciado possui pena privativa de liberdade superior há 04 anos, o que atrai a incidência do art. 313, inciso I do CP. Nessa senda, entendo presente o “fumus comissi delicti”, o qual se subdivide em prova da materialidade do crime e indícios de autoria, estes demonstrados nesta sentença de pronúncia. Em relação ao “periculum libertatis”, ou seja, ao perigo gerado pelo estado de liberdade do Denunciado, entendo que o mesmo se apresenta de forma bastante latente, sob o argumento de que, supostamente, o Denunciado integra facção criminosa ligada ao Comando Vermelho, exercendo, inclusive, funções de liderança, ressaltando, sua recente prisão, no dia 17/05/2024, no estado do Rio de Janeiro, ocasião na qual esteve foragido. Deste modo, importantíssima a necessidade de se resguardar a ordem pública, ante o altíssimo risco de reiteração delitiva, destacando-se o fato de o Denunciado responder a outras ações penais, todas relacionadas ao crime homicídio qualificado, este, crime hediondo, a exemplo dos autos nº 0000947- 90.2009.8.05.0271 e nº 8000636-35.2024.8.05.0271, e a necessidade de se resguardar a aplicação da Lei penal, sob o argumento de que o Denunciado possui mandados de prisão em aberto nos presentes autos (ID 445133898) e nos autos nº 8000636-35.2024.8.05.0271. Inviável, também, a decretação de medidas cautelares diversas da prisão (art. 319 do CPP), sob o argumento de que o Denunciado possui mandado de prisão em aberto nestes autos justamente porque descumpriu medidas cautelares anteriores (ID 444938970), o que demonstra seu claro desrespeito e descompromisso com a justiça. Portanto, recomende-se o Denunciado à prisão em que se encontre. O Tribunal de origem denegou a ordem nos seguintes termos (fls.44-46, destaquei): Inicialmente, registre-se que a prisão preventiva do ora Paciente foi apreciada no julgamento do Recurso em Sentido Estrito de nº 0700120-18.2021.8.05.0271, em que a Segunda Turma da Segunda Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça lhe negou o direito de responder ao processo em liberdade, consignando, por unanimidade de votos, que “É de se manter o decreto de custódia cautelar ratificado na decisão de STJ-Petição Eletrônica recebida em 22/10/2024 07:35:09 (e-STJ Fl.44) Petição Eletrônica protocolada e pronúncia, quando resta demonstrada a necessidade da adoção da medida extrema para garantir a ordem pública e assegurar a aplicação da lei penal, diante do risco concreto de reiteração delitiva e do descumprimento das medidas cautelares alternativas”. (id. 69821405 do RSE 0700120-18.2021.8.05.0271, julgado em 19/09/2024). A par disso, cumpre consignar que, em que pese a alegação de desnecessidade da prisão e inexistência de periculum libertatis, a autoridade impetrada, no id. 69216897, registrou que há informes de que o Paciente integra facção criminosa ligada ao Comando Vermelho, exercendo funções de liderança, e que ele estava com o mandado de prisão em aberto, somente tendo sido preso em 17/05/2024, enquanto estava foragido em outro estado da Federação. A Magistrada de 1º grau pontuou, ainda, o fato de o Paciente responder a outras ações penais, relacionadas ao crime de homicídio qualificado, e o descumprimento das medidas cautelares alternativas, circunstâncias que reforçam o risco no seu estado de liberdade. Nesse cenário, é evidente a necessidade da manutenção da prisão preventiva do Paciente, não havendo que se falar em ausência dos requisitos necessários para tanto, uma vez que o decreto constritivo se afigura imprescindível para resguardar o meio social e a aplicação da lei penal, e se embasou nas circunstâncias do caso concreto. Não há que se falar, outrossim, em afronta ao princípio da contemporaneidade da prisão, uma vez que o Paciente estava foragido e a Corte Superior possui entendimento firme de que “a fuga constitui o fundamento do juízo de cautelaridade, em juízo prospectivo, razão pela qual a alegação de ausência de contemporaneidade não tem o condão de revogar a segregação provisória”. (AgRg no RHC 133.180/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 24/8/2021). Por fim, demonstrada, no caso concreto a pertinência da medida extrema, a inaplicabilidade de medidas cautelares distintas da prisão em favor do Paciente constitui simples consectário lógico da patente necessidade do seu recolhimento ao cárcere, afastando também as alegações de afronta aos princípios do devido processo legal e dignidade da pessoa humana. Desse modo, havendo elementos suficientes que fundamentam o decreto constritor e não havendo circunstância que demonstre a desnecessidade da custódia, impõe-se a manutenção da medida extrema em desfavor do Paciente.

Depreende-se dos autos que, em 19/10/2021 (fl. 77), o Juízo singular revogou a prisão preventiva e impôs ao acusado medidas cautelares menos gravosas. O paciente permaneceu em liberdade por mais de dois anos, até que, em 17/5/2024, foi decretada novamente a sua prisão, sob o argumento de que descumpriu as medidas cautelares anteriormente impostas, notadamente por ter sido preso em outro Estado e denunciado no processo n. 8000636-35.2024.8.05.0271, pela prática de outro crime de homicídio (fls. 52-53).

Na decisão de pronúncia, proferida em 4/6/2024, a custódia cautelar foi mantida pelos mesmos fundamentos. No entanto, em 23/7/2024, o réu foi impronunciado na ação penal que serviu como fundamento para a decretação da prisão preventiva (fls. 115-125).

Ademais, a defesa demonstrou que houve prévia comunicação ao Juízo de primeiro grau quanto à mudança de domicílio do acusado para o Estado do Rio de Janeiro (fls. 80/84), onde o este foi preso posteriormente.

Assim, não obstante a acentuada gravidade das consequências do fato, correta a defesa ao apontar a desnecessidade da cautela preventiva, especialmente diante da falta de contemporaneidade, da impronúncia no processo que justificou a prisão e da ausência de descumprimento das medidas cautelares.

À vista do exposto, concedo a ordem de habeas corpus, para substituir a prisão preventiva do paciente pelas seguintes medidas cautelares, sem prejuízo de imposição de outras providências que o prudente arbítrio do Juiz natural da causa entender cabíveis e adequadas: a) comparecimento periódico em juízo, sempre que for intimado para os atos do processo e no prazo e nas condições a serem fixados pelo Juiz, a fim de informar seu endereço e justificar suas atividades; b) proibição de ausentar-se da comarca sem autorização judicial. Alerte-se o acusado de que a violação das medidas impostas poderá acarretar o restabelecimento da prisão provisória, a qual também poderá ser novamente aplicada se sobrevier situação que configure a exigência da cautelar mais gravosa. Comunique-se, com urgência, o inteiro teor desta decisão às instâncias ordinárias para as providências cabíveis. Publique-se e intimem-se.

Relator

ROGERIO SCHIETTI CRUZ

(STJ - HABEAS CORPUS Nº 955153 - BA (2024/0400437-2) RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Publicação no DJEN/CNJ de 12/03/2025)

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