STJ Maio25 - Calúnia - Absolvição - Notificação Extrajudicial Sem animus calu[m]niandi
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
DECISÃO
Trata-se de recurso ordinário interposto por JULIANO XXXXXXX contra o acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO que denegou a ordem em habeas corpus impetrado em favor dos recorrentes.
Consta dos autos que, em 3/10/2024, o Juízo de primeira instância recebeu a queixa-crime oferecida contra os recorrentes pela suposta prática do crime previsto no art. 138, c/c o art. 141, III, do CP.
A defesa alega que o recebimento da queixa-crime caracterizaria constrangimento ilegal, uma vez que faltaria legitimidade ativa à autora; que faltaria representação adequada à querelante; que a queixa-crime narraria fato atípico, pois o documento atribuído aos recorrentes não imputaria crime às pessoas nele referidas; e que faltaria justa causa para a deflagração da ação penal.
Por essas razões, pede, inclusive liminarmente, a concessão da ordem para que seja determinado o trancamento da ação penal.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento do recurso ordinário (fls. 391- 394).
É o relatório.
Na ação penal objeto deste habeas corpus, os recorrentes são acusados de calúnia por supostamente haverem imputado à querelante, XXXXXXXXm, crime que ela não teria cometido.
Segundo se infere da leitura da queixa-crime (fls. 22-28), os recorrentes, como sócios da FlXXXXXXXXXLtda. ("Flatout"), notificaram extrajudicialmente o cônjuge da querelante, JoXXXXXX, administrador financeiro da sociedade, a prestar contas da sua gestão, em razão de supostos pagamentos irregulares realizados em nome da pessoa jurídica.
Consta da referida notificação que os querelados questionaram a contratação da empresa XXXXXX., cuja sócia seria a ora querelante, SXXXXXm, e sua irmã, ressaltando que os valores pactuados exigiam prévia autorização dos demais sócios, o que não foi observado.
De acordo com a notificação extrajudicial (fls. 41-47), as irregularidades teriam consistido, ainda, em pagamentos ordenados por JXXXXXm à sociedade HaXXXXXXa. ("Ha Na Kim"), administrada por sua mulher, no valor total de R$ 205.945,70 (duzentos e cinco mil, novecentos e quarenta e cinco reais e setenta centavos), entre outubro de 2020 e dezembro de 2022.
Os pagamentos feitos pela Flatout à Han Na Kim, segundo os querelados, seriam uma forma oblíqua a que Joon Ho Kim teria recorrido para receber o seu pró-labore, de modo que a "operação é totalmente abusiva e inclusive pode acarretar graves responsabilidades fiscais para a FLATOUT, visto que o pró-labore, como regra, deve ser pago exclusivamente à pessoa física dos administradores, com retenção de imposto de renda na fonte, nos termos da legislação fiscal" (fl. 46).
A acusação de calúnia deduzida na queixa-crime afirma que, ao expedirem a referida notificação extrajudicial, os recorrentes sabiam "que eram mentirosas as suas afirmações, fazendo-os (sic) única e exclusivamente com o intuito de caluniar a Querelante", isto é, com "vontade livre e consciente de imputar crime à Su", sócia-administradora da Han Na Kim, beneficiada com as transferências de valores controvertidas.
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o trancamento de ação penal em habeas corpus é medida excepcional, permitida apenas, por exemplo, quando a acusação se fundamentar em fato manifestamente atípico, como realmente ocorre neste caso.
Da leitura detida da notificação acostada às fs. 41-47, observa-se que o objetivo primordial dos querelados era obter esclarecimentos acerca de condutas do então sócio-administrador, Sr. JXXXXX, relativamente à gestão financeira da empresa Flatout, uma vez que as referências à querelante como sócia da empresa com a qual houve a suposta contratação irregular se inserem em um contexto de questionamento de práticas administrativas e societárias, não se evidenciando, ainda que minimamente, a imputação de um fato concreto e específico definido como crime à querelante.
Isto é, a mera referência à sua condição de sócia de empresa contratada, em contexto de questionamento de gestão, não configura, por si só, o crime de calúnia, nos termos do art. 138 do Código Penal.
Ademais, conforme bem ressaltado pelo Ministério Público Federal em seu parecer, é relevante considerar a manifestação dos recorrentes em resposta ao pedido de explicações formulado pela querelante. Na ocasião, os querelados asseveraram que não houve intenção de ofender, denegrir, caluniar, injuriar ou difamar a pessoa física ou jurídica da querelante. Esclareceram que todas as interpelações foram dirigidas com o fim de registrar oficialmente e esclarecer situações de natureza cível e societária que poderiam impactar a saúde financeira da empresa.
Assim, é manifesto que, ao exigirem a prestação de contas do administrador da sociedade, os querelados não agiram com o "intento positivo e deliberado de lesar a honra alheia (dolo específico), o denominado 'animus calu[m]niandi, diffamandi vel injuriandi'", como exige a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça para o perfazimento dos tipos penais de crimes contra a honra (Jurisprudência em Teses, Edição n. 130).
Ante o exposto, nos termos do art. 34, XVIII, b, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, dou provimento ao recurso em habeas corpus para determinar o trancamento da ação penal. Comunique-se às instâncias inferiores. Publique-se. Intimem-se.
Relator
OG FERNANDES
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