STJ Mar25 - Execução Penal - Unificação De Penas Anuladas - Juízo da Execução Unificou Pena de detenção com Reclusão e aplicou Regime Fechado - Nulidade - determinação para o cumprimento da pena sucessivo em regime semiaberto e aberto - ferimento aos arts. 69 e 76 do CP e 681 do CPP - Tráfico e Porte Ilegal de Arma
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em favor de LUCAS AXXXXXXXX em que se aponta como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
Na peça, a defesa informa que o paciente foi condenado ao cumprimento de duas penas, por ocasião da mesma sentença condenatória, sujeito a dois regimes prisionais distintos (fl. 6).
Alega que o Juiz da Vara de Execuções Penais decidiu por unificar as penas fixando-se o regime inicial fechado, decisão da qual se recorreu, tendo sido o agravo improvido pela 11ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (fls. 6-7).
Sustenta que a decisão judicial combatida é eivada de ilegalidade, ao reformar decisão penal condenatória, violando o princípio do juiz natural e suprimindo instância recursal já preclusa (fls. 7-8).
Afirma que a sistemática penal determina que inicialmente sejam executadas as penas mais graves e, depois, as mais leves, conforme os arts. 69 e 76 do Código Penal e 681 do Código de Processo Penal (fls. 9-10).
No mérito, a defesa requer a concessão da medida liminar pleiteada e, ao final, a ordem definitiva, para que o paciente cumpra a pena na forma estabelecida na sentença penal condenatória transitada em julgado (fl. 14).
O Ministério Público Federal, em parecer de fls. 86/91, opinou pelo não conhecimento do habeas corpus por se tratar de sucedâneo recursal, mas reconheceu constrangimento ilegal flagrante e pugnou pela concessão da ordem de ofício para afastar a unificação das penas e determinar o cumprimento sucessivo das reprimendas, na forma dos arts. 69 e 76 do Código Penal.
É o relatório.
O Superior Tribunal de Justiça entende que é inadmissível a utilização do habeas corpus como sucedâneo de recurso próprio, previsto na legislação, impondo-se o não conhecimento da impetração. S
obre a questão, confiram-se os seguintes julgados desta Corte Superior (grifei):
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. ABSOLVIÇÃO IMPETRAÇÃO DE HABEAS CORPUS NA FLUÊNCIA DO PRAZO PARA A INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS NA ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. 1. "O writ foi manejado antes do dies ad quem para a interposição da via de impugnação própria na causa principal, o recurso especial. Dessa forma, a impetração consubstancia inadequada substituição do recurso cabível ao Superior Tribunal de Justiça, não se podendo excluir a possibilidade de a matéria ser julgada por esta Corte na via de impugnação própria, a ser eventualmente interposta na causa principal" (AgRg no HC n. 895.954/DF, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo - Desembargador Convocado do TJSP, Sexta Turma, julgado em 12/8/2024, DJe de 20/8/2024.) 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 939.599/SE, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 28/10/2024 – grifo próprio.) DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO HABEAS CORPUS COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo regimental interposto por Pablo da Silva contra decisão monocrática que não conheceu de habeas corpus, com base no entendimento de que o habeas corpus foi utilizado em substituição a revisão criminal. O agravante foi condenado a 1 ano de reclusão, com substituição da pena por restritiva de direitos, pela prática de furto (art. 155, caput, CP). A defesa pleiteou a conversão da pena restritiva de direitos em multa, alegando discriminação com base na condição financeira do paciente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é cabível o conhecimento do habeas corpus utilizado em substituição à revisão criminal; e (ii) estabelecer se a escolha da pena restritiva de direitos, em vez de multa, configura discriminação por condição financeira. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O habeas corpus não é admitido como substituto de revisão criminal, conforme a jurisprudência consolidada do STJ e do STF, ressalvados casos de flagrante ilegalidade. 4. Não houve demonstração de ilegalidade evidente na escolha da pena restritiva de direitos, sendo esta compatível com a natureza do crime e as condições pessoais do condenado. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: 1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substituto de revisão criminal, salvo em casos de flagrante ilegalidade. 2. A escolha de pena restritiva de direitos, em substituição à privativa de liberdade, não configura discriminação por condição financeira, desde que adequadamente fundamentada. Dispositivos relevantes citados: Código Penal, art. 155; STJ, AgRg no HC 861.867/SC; STF, HC 921.445/MS. (AgRg no HC n. 943.522/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 22/10/2024, DJe de 4/11/2024.)
Portanto, da impetração não se pode conhecer. Contudo, em atenção ao disposto no art. 647-A do CPP, verifico que o julgado impugnado possui ilegalidade flagrante o que permite a concessão da ordem de ofício, conforme se depreende da fundamentação a ser exposta a seguir.
Na espécie, o paciente foi condenado, na mesma ação penal, por dois crimes distintos: tráfico de drogas, cuja pena imposta foi de 6 anos de reclusão a ser cumprida em regime fechado, e posse irregular de acessórios e munições de arma de fogo de uso permitido, cuja pena foi de 1 ano de detenção a ser cumprida em regime semiaberto, resultando na imposição de penas de natureza diversa.
Ademais, o juízo da execução unificou essas penas e fixou o cumprimento de ambas em regime fechado, agravando indevidamente a execução da pena de detenção.
Encontra-se pacificado nesta Corte o entendimento de que, quando se trata de penas de reclusão e detenção aplicadas no mesmo processo, em concurso material de crimes, não cabe sua unificação para fins de fixação de regime único, mas sim o cumprimento sucessivo das penas, nos termos dos arts. 69 e 76 do Código Penal.
Nesse sentido, a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça estabelece que não se aplica o art. 111 da Lei de Execuções Penais quando as penas foram impostas na mesma sentença condenatória, em concurso material, pois não se trata de execução de penas de processos distintos. Confiram-se:
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PENAS DE RECLUSÃO E DETENÇÃO. CONDENAÇÃO NO MESMO PROCESSO. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DAS PENAS. APLICAÇÃO DOS ARTS. 69 E 76 DO CÓDIGO PENAL. 1. Com efeito, em se tratando de unificação de penas - art. 111 da Lei n. 7.210/1984 -, devem ser consideradas cumulativamente tanto as reprimendas de reclusão quanto as de detenção para efeito de fixação do regime prisional, porquanto constituem penas de mesma espécie, ou seja, ambas são privativas de liberdade. 2. Na hipótese dos autos, contudo, como bem destacado pelo representante ministerial, "o reeducando foi condenado, no mesmo processo, pela prática dos delitos previstos no artigo 33 da Lei n.º 11.343/06 à pena de reclusão e no artigo 12 da Lei n.º 10.826/03, à pena de detenção, estando atualmente no regime fechado" (e-STJ fl. 72). 3. O presente recurso, assim, não se refere à unificação das penas para fins de execução penal, mas de fixação inicial de regime inicial de cumprimento das reprimendas, em concurso de infrações, situação em que são aplicáveis os arts. 69 e 76 do Código Penal. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg nos EDcl no REsp n. 2.103.344/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 5/9/2024.) PROCESSO PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPCENTES. PORTE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E MUNIÇÕES. PENAS DE RECLUSÃO E DETENÇÃO. FIXAÇÃO DE REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. SOMATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. REGIME CORRESPONDENTE A CADA UM DOS CRIMES. ARTS. 69 E 76 DO CÓDIGO PENAL - CP. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Verifica-se que o caso dos autos não se refere à unificação das penas para fins de execução penal, mas para definição do regime inicial de cumprimento da pena. Nesse contexto, deve ser aplicado o regime correspondente para cada um dos crimes, nos termos dos arts. 69 e 76 do Código Penal e, não, o art. Ill da Lei de Execução Penal - LEP, como fez o TJGO. 2. No caso, mantém-se o estabelecimento do regime inicial semiaberto para o crime cuja a pena é de reclusão e regime inicial aberto para o crime cuja a pena é de detenção. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no R Esp n. 1.935.456/GO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 24/5/2022, D Je de 26/5/2022.)
Ante o exposto, com fundamento no art. 210 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do habeas corpus. Contudo, de ofício, concedo a ordem de habeas corpus para afastar a unificação das penas de reclusão e detenção aplicadas ao paciente na mesma ação penal pelo Juízo de execução penal e determinar o cumprimento sucessivo das penas, com a execução da pena de reclusão em primeiro lugar, conforme disposto nos arts. 69 e 76 do Código Penal. Comunique-se, com urgência, às instâncias ordinárias. Cientifique-se o Ministério Público Federal. Publique-se. Intimem-se.
Relator
OG FERNANDES
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