STJ Mar25 - Prisão por Pensão Alimentícia - Redução do Tempo de Prisão para o Mínimo Legal - Débito acima de 100 mil reais - 90 dias de prisão sem fundamentação idônea
Publicado por Carlos Guilherme Pagiola (meu perfil)
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em favor de E. R. T. em que se aponta como autoridade coatora o Tribunal do Estado de Mato Grosso no HC n. 1026370-16.2023.8.11.0000, cujo acórdão foi assim ementado (fls. 180-181): HABEAS CORPUS – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS – DECRETO DE PRISÃO CIVIL – INADIMPLEMENTO – ILEGALIDADE – INEXISTÊNCIA – ORDEM DENEGADA. O Habeas Corpus não se presta para discutir matérias fáticas e probatórias, restringe-se à análise da legalidade da prisão ou da decisão que determina o pagamento da verba alimentícia. Desse modo, é inviável a apreciação de fatos e provas relacionados à capacidade econômica ou financeira, bem assim acerca da saúde do devedor dos alimentos pela via do habeas corpus. É cabível a prisão civil do executado se o alimentante se encontra inadimplente em ação de execução de alimentos. O devedor de alimentos, para livrar-se da prisão civil, deve pagar as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo (Súmula nº 309 do STJ e art. 323 do CPC), sendo que apenas o pagamento integral das referidas parcelas pode ilidir a prisão civil.
O impetrante alega que a prisão civil foi decretada pelo prazo de 90 dias, sem a devida fundamentação e sem consideração da situação financeira do paciente, que, embora reconheça a existência do débito, que ultrapassa R$ 106.000,00, não tem condições de saldá-lo, dadas as condições atuais. A liminar foi deferida às fls. 194-197, somente para reduzir o prazo de encarceramento ao mínimo previsto em lei, até subsequente deliberação. Informações da autoridade coatora às fls. 207-211.
O Ministério Público Federal manifestou-se pela parcial concessão da ordem para fixação do prazo de prisão no mínimo legal (fls. 214-219).
É o relatório. Decido.
Não se desconhece que o inadimplemento de verba alimentar é motivo apto a embasar a ordem de prisão, desde que expedida em consonância com os ditames da Súmula n. 309 do STJ, situação evidenciada no presente feito.
Ademais, está claro nos autos que o paciente, embora intimado, não apresentou justificativa válida para o não pagamento (fls. 187-191). Portanto, quanto a esse aspecto, nenhum reparo a fazer no aresto impetrado. Todavia, conforme já antecipado pela decisão que deferiu a liminar e reiterado no parecer ministerial, infere-se que a fixação do prazo de prisão no máximo legal de 90 dias não está justificada, conforme exigido pela jurisprudência do STJ, o que caracteriza, no ponto, situação clara de constrangimento ilegal.
Nesse sentido: CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO DO DEVEDOR. DOSIMETRIA DO PRAZO DE PRISÃO CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO. NECESSIDADE. AUSÊNCIA. ILEGALIDADE. RECURSO PROVIDO. ORDEM CONCEDIDA PARA DEFINIR O PRAZO DE UM MÊS DE PRISÃO CIVIL (MÍNIMO LEGAL). 1. A Constituição Federal, art. 5°, LXVII, autoriza a prisão civil do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia. O Código de Processo Civil, por sua vez, em seu art. 528, §§ 3° e 4°, dispõe que o devedor alimentar só poderá ser preso em razão de dívida abrangente de até três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e das vencidas no curso do processo, pelo prazo de um a três meses, em regime fechado de cumprimento. 2. Conforme pacífico entendimento do STF, "para que a liberdade dos cidadãos seja legitimamente restringida, é necessário que o órgão judicial competente se pronuncie de modo expresso, fundamentado e [...] deve indicar elementos concretos aptos a justificar a constrição cautelar desse direito fundamenta l (CF, art. 5º, XV - HC 84.662/BA, Rel. Min. EROS GRAU, Primeira Turma, unânime, DJ de 22-10-2004). No mesmo sentido: RHC 163.464/GO, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. em 11/4/2023). 3. Prevalece o dever de fundamentação analítica e adequada de toda decisão determinante de prisão civil do devedor de alimentos, seja quanto ao preenchimento dos requisitos - requerimento do credor; existência de débito alimentar que compreenda até 3 prestações anteriores ao ajuizamento da execução; não pagamento do débito em 3 dias; ausência de justificação ou de impossibilidade de fazê-lo (CPC, art. 528) -, seja quanto à definição do tempo de constrição de liberdade entre o mínimo e o máximo (1 a 3 meses) estabelecidos pela legislação. 4. Trata-se de dever jurisdicional de cumprir a garantia constitucional de real motivação da decisão restritiva de direitos fundamentais, mais precisamente a dignidade da pessoa humana e o direito de liberdade, sob pena de violação à ampla defesa, ensejando a aferição do dever de imparcialidade do magistrado. 5. Assim, no momento da definição do prazo da prisão civil, deve haver um juízo de ponderação acerca dos efeitos éticos-sociais da reprimenda frente às garantias constitucionais, por meio de mecanismo argumentativo justificador quanto à proporcionalidade e à razoabilidade, conforme as circunstâncias fáticas e a respectiva base empírica, restringindo-se a possibilidade de exacerbação da reprimenda e inibindo-se soluções judiciais arbitrárias e opressivas. 6. Por conseguinte, deve o magistrado fixar de forma individualizada, proporcional e razoável, como toda medida de índole coercitiva, o tempo de restrição da liberdade, estabelecendo critérios objetivos de ponderação, enquanto não houver tal estipulação pelo legislador, evitando-se, assim, a escolha de prazo de restrição da liberdade ao mero talante do julgador. 7. Na hipótese, constata-se ter a decisão acerca da prisão civil do devedor se limitado a indicar o prazo máximo de três meses de confinamento, sem justificativa suficiente e adequada. Diante da ausência de fundamentação na fixação do prazo da prisão civil decretada, constata-se ilegalidade e concede-se a ordem de habeas corpus para reduzir o prazo da prisão para o mínimo legal de um mês. 8. Recurso de habeas corpus provido. Ordem concedida. (RHC n. 188.811/ GO, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/3/2024, DJe de 2/4/2024.)
Ante o exposto, confirmo a liminar e concedo a ordem somente para reduzir o prazo de encarceramento ao mínimo previsto em lei. Cientifique-se o Ministério Público Federal. Publique-se. Intimem-se.
Relator
JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
(STJ - HABEAS CORPUS Nº 888912 - MT (2024/0032590-5) RELATOR : MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação no DJEN/CNJ de 31/03/2025)
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